
Esta composição mostra a supernova do tipo Ia iPTF16geu, cuja luz foi desviada pelo efeito de lente gravitacional, vista através de diferentes telescópios. A imagem ao fundo mostra uma vista de campo largo do céu noturno e foi captada pelo Observatório Palomar. A inserção mais à esquerda mostra observações com o recenseamento SDSS (Sloan Digital Sky Survey). A inserção central foi obtida pelo Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA e mostra a galáxia “lente” SDSS J210415.89-062024.7. A inserção mais à direita foi também capturada com o Hubble e realça as quatro imagens da explosão de supernova, em redor da galáxia “lente”. Créditos: ESA/Hubble, NASA, SDSS, Observatório Palomar/Caltech
Um time de astrônomos utilizou de forma inédita o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA para analisar imagens múltiplas de uma supernova do tipo Ia através de uma lente gravitacional. As quatro imagens da estrela em explosão serão usadas para medir a expansão do Universo. Isto pode ser feito sem quaisquer pressupostos teóricos acerca do modelo cosmológico, fornecendo pistas adicionais sobre a velocidade pela qual o Universo está realmente em expansão.
Um time internacional, liderado por astrônomos da Universidade de Estocolmo, Suécia, descobriu uma distante supernova do tipo Ia, denominada iPTF16geu [1]. A luz do evento levou 4,3 bilhões de anos para chegar aqui na Terra [2]. Afortunadamente, a luz desta supernova em particular foi distorcida e ampliada pelo efeito de lente gravitacional e dividida em quatro imagens separadas no céu [3].
As quatro imagens aparecem em um círculo com um raio de ‘apenas’ cerca de 3.000 anos-luz em volta da galáxia que atura como “lente” no primeiro plano, uma das menores lentes gravitacionais extragalácticas descobertas até agora. A sua aparência se assemelha à famosa supernova de Refsdal, que os astrônomos detectaram em 2015 (veja em heic1525). A supernova de Refsdal, no entanto, era de uma outra classe de supernova, uma onde ocorreu um colapso de núcleo.

A supernova iPTF16geu explodiu há cerca de 4,3 bilhões de anos. Só foi possível detectá-la graças a uma galáxia situada no plano de frente que agiu como “lente” e distorceu e ampliou a luz da explosão, tornando-a 50 vezes mais brilhante para os observadores terrestres. A lente gravitacional também fez com que a supernova aparecesse em quatro locais distintos no céu, ao redor da galáxia situada no plano da frente. Crédito: ESA/NASA/Hubble
Em geral, as supernovas do tipo Ia apresentam praticamente o mesmo brilho intrínseco, portanto, ao medir o quão brilhantes elas aparecem, os astrônomos podem determinar a sua distância até nós. Dessa forma, essa classe de supernovas contempla as explosões usadas como “velas padrão” para medir o Cosmos. Há décadas as supernovas tipo Ia são utilizadas apurar distâncias no Universo e também foram usadas como evidências da expansão acelerada do Cosmos e inferir a existência da misteriosa ‘energia escura’. Agora, a supernova iPTF16geu permitiu aos cientistas explorar novos territórios, testando as teorias da deformação do ‘espaço-tempo’ nas menores escalas extragalácticas já observadas.
Ariel Goobar, professor do Centro Oskar Klein da Universidade de Estocolmo, autor líder do estudo, declarou:
A captura, pela primeira vez, de imagens múltiplas de uma supernova tipo Ia, uma ‘vela padrão’, fortemente ampliada por uma lente gravitacional é um grande avanço. Podemos medir a influência da gravidade sobre a luz focalizada com a maior precisão jamais alcançada e investigar escalas físicas que pareciam, até agora, fora do nosso alcance.
A importância crítica do objeto significou que o time realizou observações de acompanhamento da supernova menos de dois meses após a sua descoberta. Isso envolveu alguns dos principais telescópios do planeta, além do Hubble: o telescópio Keck em Mauna Kea, Havaí, além do VLT (Very Large Telescope) do ESO no Chile. Usando os dados coletados, o time de astrônomos estimou o poder de ampliação da lente tem um fator de 52. Devido à natureza de ‘vela padrão’ da supernova iPTF16geu, é a primeira vez que esta medição foi feita sem quaisquer pressupostos anteriores sobre a forma da lente e sem parâmetros cosmológicos.

Os instrumentos de ótica adaptativa do Observatório W. M. Keck em Mauna Kea, Hawaii, foram capazes de resolver a explosão da supernova iPTF16geu em detalhes. Créditos: ESA/NASA/Hubble & Observatório W. M. Keck
Atualmente, o time está atuando no processo de medir com precisão quanto tempo demorou para a luz chegar aqui na Terra para cada uma das quatro imagens da supernova. As diferenças nos tempos de chegada podem então ser usadas para calcular a constante de Hubble (ritmo de expansão do Universo) com alta precisão [4]. Isto é particularmente crucial tendo em conta a recente discrepância entre as medições do seu valor no Universo local e no Universo primordial.
As supernovas observadas através de lentes gravitacionais são tão importantes a cosmologia, quanto são extremamente difíceis de se achar. Não só a sua descoberta depende de um alinhamento muito particular e preciso de objetos no céu, como também são apenas visíveis durante um curto período de tempo.
Rahman Amanullah, coautor do artigo e cientista da Universidade de Estocolmo, declarou:
A descoberta de iPTF16geu é realmente como encontrar uma agulha estranha em um palheiro. Revela um pouco mais sobre o Universo, mas principalmente deriva uma série de novas questões científicas.
O estudo de mais supernovas também observadas através de lentes gravitacionais ajudará a moldar a nossa compreensão de quão rápido o Universo está em expansão. As chances de encontrar tais supernovas irão melhorar com a instalação de novos telescópios automatizados no futuro próximo.
Os resultados foram publicados na Science, no artigo intitulado “iPTF16geu: A multiply-imaged gravitationally lensed Type Ia supernova”, assinado por Goobar et al.
Videos
- Essa animação mostra o fenômeno de lente gravitacional forte. Esse efeito provocou um aumento da supernova iPTF16geu mais de 50 vezes mais brilhante que sob circunstâncias normais. Além disso a lente replicou a imagem da supernova por quatro vezes. Créditos: ESA/Hubble, L. Calçada
- O programa do Hubble “Frontier Fields” utiliza o poder de ampliação de massivos aglomerados de galáxias para perscrutar dentro do espaço profundo, incluindo o Universo Primordial. O vídeo ‘Hubblecast 70’ demonstra o fenômeno das lentes gravitacionais e explora como elas atuam, além de mostra como elas nos ajudam a descobrir os segredos dos confins do Universo.
Notas
[1] iPTF16geu foi observada inicialmente pela colaboração iPTF (intermediate Palomar Transient Factory) do observatório Palomar, um levantamento totalmente automatizado que fornece uma exploração sistemática do céu no espectro visível.
[2] Isso corresponde a um desvio para o vermelho (redshift) z=0,4. A galáxia que operou como uma lente gravitacional tem um desvio para o vermelho z=0,2.

A galáxia SDSS J210415.89-062024.7 reside a 2,5 bilhões de anos luz. Essa galáxia atuou como uma forte lente gravitacional para uma supernova ainda mais distante, criando quarto imagens distintas da explosão estelar. Créditos: ESA/NASA/Hubble
[3] O efeito de lente gravitacional é um fenômeno que foi previsto por Albert Einstein em 1912. O fenômeno ocorre quando um objeto massivo, situado entre uma distante fonte de luz e o observador, distorce e amplia a luz da fonte por trás. Permite com que os astrônomos observem objetos que, de outro modo, seriam demasiadamente tênues para serem observados.
[4] Para cada imagem dessa supernova, a luz não foi distorcida do mesmo modo. Isto resultou em diferentes tempos de viagem. Contudo, o desfasamento máximo de tempo entre as quatro imagens foi estimado em menos de 35 horas.
Fontes
Berkeley Lab: Rare Supernova Discovery Ushers in New Era for Cosmology
Caltech: Rare Brightening of a Supernova’s Light found by Palomar Observatory
Universidade de Estocolmo: Light rays from a supernova bent by the curvature space-time around a galaxy
._._.
heic1710a – iPTF16geu – A multiply-imaged gravitationally lensed
Comentários Recentes