ALMA explora o Campo Ultra Profundo do Hubble e fornece as observações milimétricas mais profundas obtidas até hoje do Universo primordial

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Esta imagem combina uma imagem de fundo obtida pelo Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA (em azul e verde) com uma nova imagem muito profunda obtida pelo ALMA do mesmo campo (em laranja, marcada com círculos). Todos os objetos que o ALMA vê parecem ser galáxias massivas a formar estrelas. Esta imagem baseia-se no programa de rastreamento do complexo de radiotelescópios ALMA obtido por J. Dunlop e colegas, que cobriu toda a área do HUDF. Créditos: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/NASA/ESA/J. Dunlop et al. and S. Beckwith (STScI) and the HUDF Team.

Duas equipes internacionais de astrônomos utilizaram o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) para explorar o Universo distante revelado pela primeira vez nas icônicas imagens do Campo Ultra Profundo do Hubble (HUDF, sigla do inglês Hubble Ultra Deep Field). Estas novas observações do ALMA são significativamente mais profundas e nítidas do que rastreamentos anteriores feitos nos comprimentos de onda milimétricos e mostram claramente a relação inequívoca que existe entre a taxa de formação estelar em galáxias jovens e a sua massa total de estrelas. As observações também igualmente as previamente desconhecidas abundâncias do gás que está formando estrelas em diferentes épocas, fornecendo assim novos conhecimentos sobre a “Idade de Ouro” da formação de galáxias, a qual ocorreu há aproximadamente 10 bilhões de anos.

Os novos resultados do ALMA serão publicados numa série de artigos científicos nas revistas especializadas Astrophysical Journal e Monthly Notices of the Royal Astronomical Society. Os resultados estão também entre os que serão apresentados esta semana na conferência Half a Decade of ALMA (Meia Década com o ALMA), realizada em Palm Springs, Califórnia, nos EUA.

Em 2004, as imagens do Campo Ultra Profundo do Hubble — pioneiras nas observações de campo profundo do Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA — foram publicadas. Estas imagens exploravam o céu muito mais profundamente do que o que tinha sido feito até então e revelavam uma enorme quantidade e variedade de galáxias que podiam ser vistas até menos de em bilhão de anos depois do Big Bang. Esta área do céu foi observada várias vezes pelo Hubble e por muitos outros telescópios, o que resultou na imagem mais profunda do Universo obtida até então.

Uma quantidade de galáxias, ricas em monóxido de carbono (o que indica formação potencial de estrelas) foram observadas pelo ALMA (em laranja) no Campo Ultra Profundo do Hubble. As estruturas azuis são galáxias observadas pelo Hubble. Esta imagem baseia-se num rastreio muito profundo do ALMA realizado por Manuel Aravena, Fabian Walter e colegas, que cobriu cerca de um sexto da área total do HUDF. Créditos: B. Saxton (NRAO/AUI/NSF); ALMA (ESO/NAOJ/NRAO); NASA/ESA Hubble

Uma quantidade de galáxias, ricas em monóxido de carbono (o que indica formação potencial de estrelas) foram observadas pelo ALMA (em laranja) no Campo Ultra Profundo do Hubble. As estruturas azuis são galáxias observadas pelo Hubble. Esta imagem baseia-se em um rastreamento muito profundo do ALMA realizado por Manuel Aravena, Fabian Walter e colegas, que cobriu cerca de um sexto da área total do HUDF. Créditos: B. Saxton (NRAO/AUI/NSF); ALMA (ESO/NAOJ/NRAO); NASA/ESA Hubble

Astrônomos usaram agora o ALMA para mapear, pela primeira vez na região dos comprimentos de onda do milímetro, esta janela para o Universo distante, correspondente uma área do céu aparentemente comum mas muito estudada [1]. Este mapeamento foi feito de modo profundo e bastante nítido, o que permitiu observar o fraco brilho emitido pelas nuvens de gás e também a emissão da poeira quente existente nas galáxias do Universo primordial.

O ALMA observou o HUDF cerca de 50 horas no total até agora, o que corresponde à maior quantidade de tempo de observação do ALMA passado numa única região do céu.

Uma das equipes, liderada por Jim Dunlop (University of Edinburgh, Reino Unido), utilizou o ALMA para obter a primeira imagem profunda e homogênea de uma região tão grande como o HUDF. Estes dados permitiram ajustar claramente as galáxias detectadas pelo ALMA com objetos já observados pelo Hubble ou por outras infraestruturas.

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Estas imagens foram cortadas da imagem que foi criada a partir de uma fotografia de fundo obtida pelo Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA (a azul/verde) e de uma nova imagem muito profunda obtida pelo ALMA do mesmo campo (em laranja, marcada com círculos). Todos os objetos que o ALMA vê parecem ser galáxias massivas formando estrelas. Esta imagem baseia-se no rastreamento executado pelo ALMA, obtido por J. Dunlop e colegas, que cobriu toda a área do HUDF. Créditos: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/NASA/ESA/J. Dunlop et al. e S. Beckwith (STScI) e Equipe do HUDF

Este estudo mostrou claramente pela primeira vez que a massa estelar de uma galáxia é o fator que melhor prevê a taxa de formação estelar no Universo a elevado desvio para o vermelho. A equipe detectou essencialmente todas as galáxias de elevada massa [2] e virtualmente mais nada.

Jim Dunlop, autor principal do artigo científico que descreve as imagens profundas enfatiza a importância desta descoberta, afirmou:

Este é um avanço revolucionário, pois pela primeira vez conseguimos ligar claramente as imagens visíveis e ultravioletas do Universo distante observadas pelo Hubble com as imagens  no infravermelho longínquo e milímetro obtidas com o ALMA.

A segunda equipe, liderada por Manuel Aravela do Núcleo de Astronomía, Universidad Diego Portales, Santiago do Chile, e por Fabian Walter do Instituto Max Planck de Astronomia em Heidelberg, na Alemanha, conduziu uma busca mais profunda em cerca de um sexto do campo total do HUDF [3].

Chris Carilli, astrônomo do National Radio Astronomy Observatory (NRAO), em Socorro, Novo Mexico, EUA, membro da equipe de pesquisadores, comentou:

Realizamos a primeira busca tridimensional feita “às cegas” de gás frio no Universo primordial. Deste modo, descobrimos uma população de galáxias que não apareceu de forma nada evidente em qualquer outro rastreamento profundo do céu. [4]

Algumas das novas observações ALMA foram especificamente concebidas para detectar galáxias ricas em monóxido de carbono, o qual indica regiões onde se prepara a formação estelar. Estes reservatórios de gás molecular, que dão origem a formação estelar nas galáxias, são muitas vezes difíceis de detectar com o Hubble. O ALMA pode por isso ajudar a revelar a “metade que falta” do processo de formação e evolução das galáxias.

Manuel Aravela, autor principal de dois dos artigos científicos que descrevem estes resultados, adicionou:

Os novos resultados do ALMA apontam para um rápido aumento no conteúdo de gás das galáxias à medida que olhamos para trás no tempo.Este aumento do conteúdo de gás é provavelmente a causa principal do aumento das taxas de formação estelar durante a época principal de formação de galáxias, a qual ocorreu há cerca de 10 bilhões de anos.

Os resultados apresentados hoje são apenas o início de uma série de observações futuras do ALMA para investigar o Universo distante. Por exemplo, está planejada uma campanha de observação de 150 horas do HUDF para termos mais indícios sobre a potencial história de formação estelar no Universo.

Fabian Walter concluiu:

Ao aumentar o nosso conhecimento sobre este material que forma estrelas, anteriormente desconhecido, o Grande Programa do ALMA previsto poderá nos dar uma visão completa das galáxias existentes no icônico Campo Ultra Profundo do Hubble.

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Esta imagem, chamada Campo Extremamente Profundo do Hubble (XDF, sigla do inglês para Hubble eXtreme Deep Field), combina observações Hubble obtidas durante a última década de uma pequena região do céu situada na constelação da Fornalha (Fornax). Com um total de mais de dois milhões de segundos de tempo de exposição, trata-se da imagem mais profunda do Universo já capturada, combinando dados de imagens anteriores, incluindo o Campo Ultra Profundo do Hubble (obtido em 2002 e 2003) e o Campo Ultra Profundo Infravermelho do Hubble (de 2009). A imagem cobre uma região com uma área que é menor que um décimo da área da Lua Cheia, ou seja apenas 30 milionésimas partes de todo o céu. Ainda assim, nesta minúscula fração do céu, esta exposição longa revela cerca de 5.500 galáxias, algumas das quais tão distantes que as vemos quando o Universo tinha menos de 5% da sua idade atual. A imagem do Campo Extremamente Profundo do Hubble contém vários dos objetos mais distantes alguma vez identificados. Créditos: NASA, ESA, G. Illingworth, D. Magee, e P. Oesch (Universidade da California, Santa Cruz), R. Bouwens (Universidade de Leiden), e Equipe do HUDF09

Notas

[1] Os astrônomos escolheram especificamente o HUDF — uma região do espaço situada na tênue constelação austral daFornalha — como área de estudo, de modo a que telescópios terrestres colocados no hemisfério sul, como é o caso do ALMA, pudessem observar a região, expandindo assim o nosso conhecimento do Universo muito longínquo.

Investigar o Universo profundo opticamente invisível era um dos principais objetivos científicos do ALMA.

[2] Neste contexto, “elevada massa” significa galáxias com massas estelares maiores que 20 bilhões de massas solares. Em termos de comparação, a Via Láctea, que é uma galáxia grande, tem aproximadamente uma massa de 100 bilhões de massas solares.

[3] Esta região do céu é cerca de 700 vezes menor que a área do disco da Lua Cheia vista a partir da Terra. Um dos aspectos mais surpreendentes do HUDF foi o vasto número de galáxias encontradas numa fração tão pequena do céu.

[4] A capacidade do ALMA em observar uma região do espectro electromagnético completamente diferente da do Hubble, permite aos astrônomos estudar diferentes tipos de objetos astronômicos, tais como nuvens a formar estrelas e objetos que, de outro modo, seriam demasiado fracas para poderem ser observados no visível, mas que podem ser observados nos comprimentos de onda milimétricos.

Esta busca é “cega” no sentido em que não se focou em nenhum objeto em particular.

As novas observações do ALMA do HUDF incluem dois tipos distintos, mas complementares, de dados: observações de contínuo, que revelam a emissão da poeira e a formação estelar, e um rastreamento de linhas de emissão espectrais, que mostram o gás molecular frio que alimenta a formação estelar. O segundo rastreamento é particularmente valioso porque inclui informação relativa à quantidade de desvio para o vermelho que a radiação emitida por objetos distantes sofre, devido à expansão do Universo. Um maior desvio para o vermelho significa que um objeto se encontra mais afastado e por isso estamos a observá-lo mais longe no passado. Este aspecto permite aos astrônomos criar mapas tridimensionais do gás de formação estelar, traçando assim a sua evolução no tempo cósmico.

Fontes

ESO: eso1633 — ALMA Explores the Hubble Ultra Deep Field – Deepest ever millimetre observations of early Universe

ALMA: ALMA Explores the Hubble Ultra Deep Field: Uncovers Insights into ‘Golden Age’ of Galaxy Formation

NRAO: ALMA Explores the Hubble Ultra Deep Field: Uncovers Insights into ‘Golden Age’ of Galaxy Formation

Artigos Científicos

Este trabalho foi descrito em vários artigos científicos intitulados:

  1. “A deep ALMA image of the Hubble Ultra Deep Field”, de J. Dunlop et al., que será publicado na revista especializada Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
  2. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: Search for the [CII] Line and Dust Emission in 6 < z < 8 Galaxies”, de M. Aravena et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.
  3. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: Molecular Gas Reservoirs in High-Redshift Galaxies”, de R. Decarli et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.
  4. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: CO Luminosity Functions and the Evolution of the Cosmic Density of Molecular Gas”, de R. Decarli et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.
  5. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: Continuum Number Counts, Resolved 1.2-mm Extragalactic Background, and Properties of the Faintest Dusty Star Forming Galaxies”, de M. Aravena et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.
  6. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: Survey Description”, de F. Walter et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.
  7. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: the Infrared excess of UV-selected z= 2-10 Galaxies as a Function of UV-continuum Slope and Stellar Mass”, de R. Bouwens et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.
  8. “The ALMA Spectroscopic Survey in the Hubble Ultra Deep Field: Implication for spectral line intensity mapping at millimeter wavelengths and CMB spectral distortions”, de C. L. Carilli et al. que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.

Links para os Artigos Científicos

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2 comentários

1 menção

    • Patrezzi Luiz Pinto em 25/09/2016 às 13:52
    • Responder

    Queria entender algumas coisas.
    – Os astronomos utilizam os telecópios para ver somente o o lado antigo do Universo?
    – O universo tem que ter um lado mais novo. Eles não visualizam o lado mais novo?
    – Como dizem que o Universo tem por volta de 14 bilhões de anos? É só porque as galáxias mais distantes tem distâncias próximas de 14 bilhões de anos luz?
    – O Universo pode ter muito mais idade e profundidade do que dizem?
    – Se um novo telescópio conseguir visualizar galáxias mais profundas do que as já visualizadas, totalizando distâncias de por exemplo 17 bilhões de anos luz, vão dizer que a idade do Universo é em torno de 17 bilhões de anos?

      • ROCA em 26/09/2016 às 09:28
        Autor

      1) Não, os astrônomos usam para olhar variadas distâncias, desde dentro de nosso Sistema Solar (observando a Lua, planetas, satélites, asteroides, cometas etc), passando pelos objetos da nossa Via Láctea (outras estrelas, nebulosas, etc) até outras galáxias próximas e as distantes (as citadas nesse artigo do ALMA que você está comentando).
      2) “Lado mais novo”? Não existe esse conceito. O que existe são os objetos mais próximos e mais distantes. Entenda o conceito de “Universo Observável” clicando no link abaixo:
      http://eternosaprendizes.com/2008/12/23/estudo-independente-confirma-o-destino-do-universo-e-controlado-pela-energia-escura/i02-29-universe-observable/
      O acontece é que a velocidade da luz é finita, assim para os objetos mais distantes a luz emitida por eles leva mais tempo para chegar até nós que os objetos mais próximos.
      3) O Universo tem cerca de 13,8 bilhões de anos. Como calcular a idade? Leia aqui:
      http://eternosaprendizes.com/2009/10/01/qual-e-a-idade-do-universo-como-calcular-isso/
      4) O que está fora do horizonte do “Universo Observável” não pode ser visto pelos telescópios pois a luz ou a radiação dos objetos distantes NÃO chegou até nós ainda. O mais distante que se consegue medir é a “radiação de fundo de microondas”, a radiação primordial do Universo quando este tinha cerca de 380.000 anos de idade. Leia abaixo:
      http://eternosaprendizes.com/2009/10/03/planck-revela-segredos-do-nascimento-do-universo/
      Boa leitura.

  1. […] [1] O Campo Ultra Profundo do Hubble é uma das áreas do céu mais estudadas. Até agora, 13 instrumentos montados em 8 telescópios, incluindo o ALMA, do qual o ESO é parceiro, observaram este campo, desde os raios-X às ondas de rádio. Leia: ALMA explora o Campo Ultra Profundo do Hubble e fornece as observações milimétricas mais profunda… […]

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