Revisitando o Oceano Subsuperficial em Enceladus

http://www2.cnrs.fr/en/2777.htm

A espessura da concha de gelo de Enceladus chega a cerca de 35 km na região encraterada equatorial (mostrada em amarelo) e menos de 5 km na região ativa do polo sul (mostrada em azul), conforme novos estudos científicos. Créditos: LPG-CNRS-U. Nantes/U. Charles, Prague.

Recentemente foi noticiado sobre a possibilidade da existência de oceano subsuperficial em Plutão, baseada nas mudanças de fase dos gelos sob temperaturas e pressões variáveis [1].

Agora, vamos voltar nossos olhos para outro mundo com possibilidades oceânicas interessantes: Enceladus. Aqui, os dados são problemáticos e contraditórios. Os voos rasantes (flybys) realizados pela sonda robótica Cassini detectaram pequenas variações na trajetória da espaçonave que podem ser usadas para medir a gravidade dessa incomum lua de Saturno.

Através da comparação destas perturbações no movimento da sonda Cassini contra a topografia conhecida de Enceladus, os cientistas puderem esboçar tentativas de conclusões sobre a estrutura interna da lua. Enceladus aparece como internamente assimétrica, com uma concha de gelo de 30 a 40 km de espessura no seu hemisfério sul e talvez engrossando até 60 km na altura do seu equador. Mais ainda, os dados da Cassini não foram suficientemente conclusivos sobre a extensão do oceano subsuperficial. Seria a água integralmente espalhada sob a concha ou ficaria confinada em largas áreas nas regiões do polo sul lunar?

Trabalhos anteriores da Universidade de Cornell em 2015 consideraram cerca de 5.800 características da superfície em diferentes ângulos e tempos, permitindo a criação de uma análise estatística e uma modelagem dinâmica do interior de Enceladus. Peter Thomas e seu time descobriram uma libração na rotação da lua, a qual demonstra que a superfície de Enceladus não está solidamente conectada com seu núcleo central. A libração então nos indicaria que o oceano subsuperficial seria global. Além disso os cientistas deduziram pelo modelo que a crosta de gelo seria mais fina, com uma espessura de 20 km, um resultado inconsistente com as medidas de gravidade fornecidas pela sonda robótica Cassini.

Para solucionar a contradição, um novo modelo criado por um time internacional de pesquisadores propõe uma estrutura assimétrica para a lua, com uma forte fonte interna de calor. O novo trabalho sugere a presença de um núcleo rochoso com um raio de 185 km e um oceano subsuperficial com profundidade da ordem de 45 km, além de uma concha de gelo um uma espessura média de cerca de 20 km, exceto no polo sul, onde a crosta congelada teria menos de 5 km de altura.

Nesse novo modelo o oceano subsuperficial comporia cerca de 40% do volume total de Enceladus e seu conteúdo seria salino, similarmente aos oceanos da Terra. Assim, as relativamente finas camadas de gelo superficial nas regiões do polo sul de Enceladus acarretam uma boa promessa para futuras explorações. Embora esse novo modelo nos dê uma saída para reconciliar os resultados das pesquisas anteriores, os resultados também trazem consigo novas questões. Afinal, uma camada de gelo mais fina sustenta menos calor, o que significaria que os estresses causados por marés causados por Saturno em sua lua não poderiam mais explicar o fluxo de calor que em tese afetaria a região polar sul. Estaríamos nos deparando com uma produção de calor significativa originada no interior de Enceladus? Esse aquecimento poderia ser causado pelas fontes hidrotermais no fundo do oceano lunar?

E mais! Moléculas orgânicas complexas têm sido encontradas nas plumas criogênicas ejetadas por Enceladus, compondo um cenário astrobiologicamente interessante quando correlacionado com um oceano interno aquecido. Obviamente, nós temos que continuar pesquisando para descobrir se o modelo sugerido por Ondřej Čadek (Universidade Charles em Praga) e sua equipe, composta de membros do Royal Observatory of Belgium e do Laboratoire de Planétologie Géodynamique em Nantes, se sustenta mediante futuras observações e estudos.

Eventualmente. a relativamente mais fina camada da crosta congelada no polo sul poderá no futuro nos oferecer uma janela de acesso ao oceano. Trata-se, portanto, de um estudo relevante não só para Enceladus, mas também para os demais corpos gelados do Sistema Solar exterior.

O artigo assinado por Čadek et al, intitulado “Enceladus’s internal ocean and ice shell constrained from Cassini gravity, shape, and libration data” foi publicado na Geophysical Research Letters em 11 de junho de 2016.

Nota

[1] Sobre o oceano subsuperficial em Plutão veja o artigo “Recent Tectonic Activity on Pluto Driven by Phase Changes in the Ice Shell”, assinado por Hammond, Barr e Parmentier.

Fontes

Centauri Dreams: Revisiting Enceladus’ Ocean

CNRS: An ocean lies a few kilometers beneath Enceladus’s icy surface

Artigo Científico

Enceladus’s internal ocean and ice shell constrained from Cassini gravity, shape, and libration data

._._.

1 menção

  1. […] jatos nos indica a possível presença de um mar subterrâneo com água no estado líquido que poderia interagir com o núcleo rochoso de Enceladus, de forma semelhante ao oceano subsuperficial que os cientistas estimam que exista na lua de […]

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