ESO descobre a galáxia primordial CR7 com indícios das primeiras estrelas do Universo – População III

http://www.eso.org/public/images/eso1524a/

Esta concepção artística mostra CR7, uma galáxia muito distante que foi descoberta com o auxílio do Very Large Telescope do ESO. Esta galáxia é mais brilhante encontrada até hoje no Universo primordial e existem evidências fortes de que este objeto contém estrelas da primeira geração. Estas estrelas massivas e brilhantes, puramente teóricas até agora, foram as criadoras dos primeiros elementos pesados na história — os elementos necessários à formação das estrelas que nos rodeiam atualmente, os planetas que as orbitam e a vida tal como a conhecemos. A galáxia recentemente descoberta é três vezes mais brilhante do que a galáxia distante mais brilhante que era conhecida até agora. Crédito: ESO/M. Kornmesser

Com o auxílio do Very Large Telescope do ESO, astrônomos descobriram a galáxia mais brilhante observada até hoje no Universo primordial e encontraram evidências fortes de que este objeto contém estrelas da primeira geração (População III). Estas estrelas massivas e brilhantes, puramente teóricas até agora, foram as criadoras dos primeiros elementos pesados na história — os elementos necessários à formação das estrelas que nos rodeiam atualmente, os planetas que as orbitam e a vida tal como a conhecemos. A galáxia recentemente descoberta chamada CR7 é três vezes mais brilhante do que a galáxia distante mais brilhante que era conhecida até agora.

Os astrônomos desenvolveram há algum tempo a teoria da existência de uma primeira geração de estrelas – conhecidas por estrelas da População III — que teriam nascido do material primordial do Big Bang [1]. Todos os elementos químicos mais pesados — como o oxigênio, nitrogênio, carbono e ferro, que são essenciais à vida — formaram-se no interior das estrelas, o que significa que as primeiras estrelas se devem ter formado dos únicos elementos que existiam antes delas: hidrogênio, hélio e traços mínimos de lítio.

Estas estrelas de População III seriam enormes — várias centenas ou mesmo milhares de vezes mais massivas do que o Sol — extremamente quentes e transientes — e explodiriam sob a forma de supernovas após cerca de apenas dois milhões de anos. No entanto, até agora, a busca de provas físicas da sua existência se revelava infrutífera [2].

A equipe liderada por David Sobral, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, Universidade de Lisboa, e do Observatório de Leiden, Holanda, utilizou o Very Large Telescope do ESO (VLT) para observar o Universo primordial, no período conhecido pela era da reionização, que ocorreu cerca de 800 milhões de anos após o Big Bang. Em vez de fazer um estudo profundo e direcionado a uma pequena área do céu, a equipe ampliou o seu foco de estudo produzindo o maior rastreamento de galáxias muito distantes já obtido.

Este extenso estudo fez uso não apenas do VLT, mas também do Observatório W. M. Keck, do Telescópio Subaru e do Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA. A equipe descobriu — e confirmou — um número surpreendente de galáxias brilhantes muito jovens. Uma delas, chamada CR7 [3], trata-se de um objeto excepcionalmente raro, de longe a galáxia mais brilhante alguma vez observada nesta época do Universo [4]. Com a descoberta de CR7 e outras galáxias brilhantes, o estudo já se tornou um sucesso, no entanto investigação posterior produziu resultados ainda melhores.

Com o auxílio dos instrumentos X-shooter e SINFONI montados no VLT, a equipe encontrou forte emissão de hélio ionizado em CR7 mas — crucialmente e surpreendentemente — nenhum traço de elementos mais pesados na região mais brilhante da galáxia! Tal fato o que constitui uma forte evidência da existência de aglomerados de estrelas de População III com gás ionizado, numa galáxia do Universo primordial [5].


David Sobral esclareceu:

A descoberta superou, desde o início, todas as nossas expectativas, uma vez que não esperávamos encontrar uma galáxia tão brilhante. Após desvendarmos pouco a pouco a natureza de CR7, percebemos que não só tínhamos descoberto a galáxia distante mais brilhante conhecida até agora, como também que este objeto tinha todas as características que se esperam de estrelas de População III. Estas estrelas são as que formaram os primeiros núcleos pesados [do Carbono em diante] que, em última análise, são os que nos permitem estar aqui. Este estudo revelou-se extremamente interessante.

Em CR7 encontraram-se tanto aglomerados de estrelas mais azuis como também alguns mais vermelhos, o que indica que a formação das estrelas de População III ocorreu em ondas — como se previa. O que a equipe observou de modo direto foi o último período de estrelas de População III formadas, sugerindo que tais estrelas devem ser mais fáceis de detectar do que o que se pensava anteriormente: estas estrelas encontram-se no meio de estrelas regulares, em galáxias mais brilhantes, e não apenas nas galáxias mais tênues, menores e precoces, as quais são tão fracas que se tornam extremamente difíceis de estudar.

Jorry Matthee, coautor do artigo científico que descreve os resultados, concluiu:

Sempre me perguntei de onde é que nós viemos. Mesmo quando era pequeno queria saber de onde vinham os elementos químicos: o cálcio dos meus ossos, o carbono dos meus músculos, o ferro do meu sangue. Descobri que estes elementos foram formados inicialmente no início do Universo, pela primeira geração de estrelas. Com esta descoberta estamos a ver, de fato, tais objetos pela primeira vez.

Estão planejadas mais observações com o VLT, o ALMA e o Telescópio Espacial Hubble de modo a confirmar sem sombra de dúvidas que o que se observou são estrelas de População III e procurar e identificar outros exemplos.

Este trabalho foi descrito no artigo científico intitulado “Evidence for PopIII-like stellar populations in the most luminous Lyman-α emitters at the epoch of re-ionisation: spectroscopic confirmation”, assinado por D. Sobral, et al., que foi publicado na revista especializada The Astrophysical Journal.

Notas

[1] O nome População III vem do fato dos astrônomos já terem classificado anteriormente as estrelas da Via Láctea como sendo de População I (estrelas como o Sol, ricas em elementos pesados e que formam o disco da galáxia) e de População II (estrelas mais velhas, com baixo conteúdo de elementos pesados e encontradas no bojo e no halo da Via Láctea e em aglomerados globulares).

[2] Encontrar estas estrelas é muito difícil: estes objetos teriam uma vida muito curta e teriam brilhado na época em que o Universo era essencialmente opaco à sua luz. Descobertas anteriores incluem Nagao et al., 2008, onde não foi detectado hélio ionizado; De Breuck et al., 2000, onde se detectou hélio ionizado ao mesmo tempo que carbono e oxigênio, assim como uma assinatura clara de um núcleo ativo de galáxia; e Cassata et al., 2013, onde foi detectado hélio ionizado, mas com uma largura equivalente muito pequena (ou fraca intensidade), ao mesmo tempo que carbono e oxigênio.

[3] O nome CR7 é uma abreviação do COSMOS Redshift 7, uma medida do lugar ocupado em termos de tempo cósmico. Quanto maior o desvio para o vermelho (redshift), mais distante estará a galáxia e mais para trás no tempo da história do Universo se encontra também. A A1689-zD1, uma das galáxias mais velhas já observada, por exemplo, tem um desvio para o vermelho de 7,5.

[4] CR7 é três vezes mais brilhante que a anterior detentora deste título, Himiko, que se pensava ser uma galáxia extraordinária para esta época precoce do Universo. Galáxias ricas em poeira observadas em épocas mais recentes do Universo podem irradiar mais energia que CR7, através da emissão infravermelha da poeira morna. A energia proveniente de CR7 é majoritariamente luz visível e ultravioleta.

[5] A equipe considerou duas teorias alternativas: que a fonte de luz era ou um AGN ou estrelas Wolf-Rayet. A falta de elementos pesados e outras evidências, no entanto, vão contra estas duas teorias. A equipe considerou também que a fonte poderia ser um buraco negro em colapso direto, um tipo de objeto que é ele próprio excepcionalmente exótico e puramente teórico. A ausência de uma linha de emissão larga e o fato da luminosidade do hidrogênio e do hélio serem muito maiores do que o previsto para tais buracos negros indicam que esta hipótese é, também ela, altamente improvável. A ausência de emissão de raios X negaria também esta possibilidade, no entanto são necessárias mais observações.

Fonte

ESO: eso1524 — Best Observational Evidence of First Generation Stars in the Universe / VLT discovers CR7, the brightest distant galaxy, and signs of Population III stars

._._.

eso1524a-Evidence-for-PopIII-like-stellar-populations-in-the-most-luminous-Lyman-alpha-emitters-at-the-epoch-of-re-ionisation-spectroscopic-confirmation

The-Evolution-of-Population-III-Stars-Stephen-Redman

1 menção

  1. […] Excepcionalmente para galáxias com tais regiões de intensa formação estelar, as BCDs em geral não possuem uma grande quantidade de poeira, nem traços de elementos pesados ​​que são tipicamente encontrados em estrelas recentemente formadas. Assim, sua composição é muito semelhante à do material das primeiras estrelas que se formaram Universo primordial. Devido a isso, os astrônomos consideram as galáxias BCD como excelentes alvos para estudo afim de melhorar a nossa compreensão dos processos de formação de estrelas primordiais. […]

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