Astrônomos do ESO respondem a pergunta: Gliese 581d é um planeta extrasolar potencialmente habitável?

Este diagrama demonstra as distâncias dos planetas em nosso Sistema Solar (linha superior) e as distâncias no sistema Gliese 581 (linha inferior), a partir de suas respectivas estrelas (à esquerda). A zona de habitação está indicada pela área azul. O novo exoplaneta Gliese 581 g reside justamente entre Gliese 581 c e Gliese 581 d e tal equivale a posição da Terra em relação ao Sol em termos de habitabilidade. Da mesma forma Gliese 581 c está em posição equivalente a de Vênis e Gliese 581 d está em distância equivalente a de Marte. Crédito: ESO

Este diagrama demonstra as distâncias dos planetas em nosso Sistema Solar (linha superior) e as distâncias no sistema Gliese 581 (linha inferior), a partir de suas respectivas estrelas (à esquerda). A zona de habitação está indicada pela área azul. O novo exoplaneta Gliese 581 g reside justamente entre Gliese 581 c e Gliese 581 d e tal equivale a posição da Terra em relação ao Sol em termos de habitabilidade. Da mesma forma Gliese 581 c está em posição equivalente a de Vênis e Gliese 581 d está em distância equivalente a de Marte. Crédito: ESO

Embora o exoplaneta não confirmado Gliese 581g tenha recebido atenção exagerada por ter chances de ser um mundo habitável, os astrônomos do ESO voltaram suas atenções para seu vizinho real mais próximo, o exoplaneta confirmado Gliese 581d para responder questões  sobre sua potencial habitabilidade.

Novas investigações sugerem que o exoplaneta Gliese 581d, uma das super-Terras que orbita a estrela anã vermelha Gliese 581, pode muito bem estar residindo dentro da “zona habitável” do seu sistema, a distância perfeita para permitir a existência de água no estado líquido. A descoberta segue a de um estudo similar, publicado em maio de 2010, que demonstrou a mesma conclusão sobre Gliese 581d.

O autor líder do novo estudo, Philip von Paris, do Instituto de Investigação Planetária do Centro Aeroespacial da Alemanha em Berlim explicou:

O fato dos dois modelos indicarem condições favoráveis para a água líquida existir em Gliese 581d fortalece a suposição que seja este cenário seja plenamente possível, ou seja, não parece impossível a hipótese de habitabilidade neste exoplaneta.

O sistema Gliese 581 apresenta diversas possibilidades interessantes

Gliese 581 é uma anã vermelha localizada a 20 anos-luz da Terra, um “pequeno salto” nas escalas de distâncias do Universo. Até hoje os astrônomos estimaram a presença potencial de  seis exoplanetas (4 confirmados e 2 a confirmar) em órbita desta tão estudada estrela.

Calcula-se que o exoplaneta candidato não confirmado Gliese 581g, se existir, tem cerca de 3 vezes a massa da Terra e deve ser provavelmente um mundo rochoso. Os cálculos preliminares sugeriram que Gliese 581g também está situado mesmo no meio da zona habitável, o que o torna um dos candidatos principais para conter água líquida e vida como a conhecemos, caso este exoplaneta realmente exista.

As órbitas dos planetas no sistema Gliese 581 neste diagrama são comparadas com as dos planetas do nosso próprio sistema solar. A estrela Gliese 581 tem cerca de 30% da massa do nosso Sol e o exoplaneta mais externo é mais próximo de sua estrela do que a Terra é do Sol. O quarto exoplaneta, o hipotético Gliese 581g, é um candidato a exoplaneta em posição orbital favorável a sustentar a vida. Crédito: Zina Deretsky, National Science Foundation

As órbitas dos planetas no sistema Gliese 581 neste diagrama são comparadas com as dos planetas do nosso próprio sistema solar. A estrela Gliese 581 tem cerca de 30% da massa do nosso Sol e o exoplaneta mais externo é mais próximo de sua estrela do que a Terra é do Sol. O quarto exoplaneta, o hipotético Gliese 581g, é um candidato a exoplaneta em posição orbital favorável a sustentar a vida. Crédito: Zina Deretsky, National Science Foundation

As controvérsias de Gliese 581g…

Depois do anúncio sobre a descoberta de Gliese 581g (e Gliese 581f), alguns cientistas questionaram veementemente a análise usada para descobrir estes exoplanetas e alegaram que não conseguiram (até agora) confirmar a existência de Gliese 581g (também do f) em estudos posteriores. A questão permanece em aberto pois os descobridores desta dupla de exoplanetas, no entanto, fazem pé firme com relação ao seu achado.

Assim, os dois exoplanetas vizinhos (mais perto e mais longe) de Gliese 581g raspam os limites da zona habitável e por isso tem também inspirado interesse e intriga desde a sua descoberta em 2007. O vizinho interior do hipotético Gliese 581g, o Gliese 581c, foi, tão logo da sua descoberta, considerado um bom candidato para a água líquida, mas os estudos posteriores demonstraram que um efeito de estufa desenfreado provavelmente domina este exoplaneta tornando-o demasiado quente, de forma similar ao que presenciamos no planeta Vênus no nosso Sistema Solar.

Gliese 581d, por outro lado, orbita além de Gliese 581g, longe o suficiente para que os investigadores conjeturassem logo que era um mundo demasiado frio para manter água no estado líquido, na superfície, e assim sustentar a vida como a conhecemos. Todavia,  de acordo com este novo estudo agora publicado, um forte efeito de estufa pode aquecer Gliese 581d substancialmente, talvez o suficiente para suportar água líquida.

Modelando uma atmosfera alienígena

Gliese 581d tem 7,09 vezes a massa da Terra (veja na tabela 2 abaixo), um diâmetro de 1,71 vezes o diâmetro terrestre e os astrônomos suspeitam que é rochoso tal como nosso planeta. A gravidade deste exoplaneta (23,76 m/s², mais do dobro da gravidade terrestre) tem a capacidade de suportar uma atmosfera espessa, embora os pesquisadores ainda tenham de confirmar sua existência e caracterizá-la.

Parâmetros do exoplaneta Gliese 581d utilizados nas simulações tais como sua massa de 7,09 vezes a massa da Terra, o raio de 1,17 vezes o raio da Terra

Von Paris e a sua equipe modelaram as condições superficiais que podem resultar em Gliese 581d a partir de diferentes tipos de atmosfera, usando o nosso Sistema Solar como guia. Os cientistas planetários usaram como exemplo uma atmosfera composta por vapor de água, dióxido de carbono e nitrogênio, elementos encontrados em abundância na atmosfera de planetas telúricos como a Terra, Marte e Vênus.

A equipe de pesquisa executou simulações computacionais em concentrações diferentes de dióxido de carbono, imitando os níveis conhecidos em nosso Sistema Solar. Várias simulações assumiram diferentes quantidades de CO2 presentes aqui na Terra atual, na Terra primordial, além de Marte e Vênus, atualmente.

O modelo simulado pela equipe também variou também os dados da pressão atmosférica, da mais baixa para a mais alta. Ao final do trabalho, os cientistas concluíram que alguns destes cenários atmosféricos resultaram em temperaturas superficiais médias da ordem de 0 (zero) graus Celsius (273 K). Vejamos os resultados nos gráficos abaixo:

Temperatura de superfície e o aumento da pressão parcial de CO2. Crédito: Von Paris et al.

Gráfico demonstra os resultados ao longo do tempo (bilhões de anos) das temperaturas de superfície de Gliese 581d. Crédito P. von Paris et al.

Tal resultado que implica que Gliese 581d pode hospedar água líquida em vastas regiões de sua superfície.

Uma atmosfera com pressão média ou alta e com 95% de CO2 seria suficiente, descobriram. Tal como uma atmosfera com alta pressão e com apenas 5% de CO2. Von Paris exclamou:

É muito excitante descobrir que, mesmo com uma atmosfera com 5% de dióxido de carbono, obtivemos condições habitáveis em um dos casos analisados.

ABSTRACT: O planeta extrasolar Gliese 581d é um exoplaneta potenciamente habitável? Clique na imagem para ler o artigo científico.

Muito resta a explicar…

Outro estudo atmosférico de Gliese 581d, publicado em maio de 2010, também sugeriu um forte efeito estufa (com grandes quantidades de CO2) o que tornaria Gliese 581d quente o suficiente para suportar a água líquida. Além disso, há outras equipes científicas que chegaram a conclusões similares anteriormente.

Tais trabalhos, embora intrigantes, permanecem como provisórios e especulativos. Von Paris e a sua equipe seguiram o nosso próprio Sistema Solar como modelo, mas a sua simulação teve por base algumas premissas específicas. Von Paris realçou:

O problema, claro, é que nada sabemos com plena certeza sobre a atmosfera destes mundos.

Os astrônomos não sabem com exatidão se Gliese 581d é um planeta rochoso como a Terra, Marte ou Vênus. Pensam que sim, baseando-se em seu tamanho estimado, mas são necessários mais estudos para confirmar os dados atuais.

Embora von Paris seja o primeiro a mencionar estes limites e fatos desconhecidos, ele está excitado sobre a probabilidade de Gliese 581d ser capaz de suportar água líquida,  especialmente sabendo que o Universo é tão vasto e a procura por planetas extrasolares está ainda na sua infância. Os astrônomos já descobriram mais de 500 exoplanetas e o primeiro deles foi descoberto há menos de 20 anos, em 1992. Von Paris conclui:

Gliese 581 é uma vizinha nossa [distante 20,3 anos luz da Terra] e está entre as 100 estrelas mais próximas, do meu ponto de vista, isto implica que tais exoplanetas possam ser razoavelmente comuns.

Fontes

Space.com:

Artigo científico

ArXiv.org: The extrasolar planet GL 581d: A potentially habitable planet? Autores: P. von Paris, S. Gebauer, M. Godolt, J.L. Grenfell, P. Hedelt, D. Kitzmann, A.B.C. Patzer, H. Rauer, B. Stracke

._._.

5 comentários

1 menção

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    • André Luiz Neves da Silva em 17/05/2011 às 17:09
    • Responder

    Encontrei uma reportagem sobre Gliese 581d ,com simulações de clima feitas por um grupo de cientistas do Instituto Pierre Simon Laplace, da França.
    .
    http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=primeiro-exoplaneta-habitavel&id=010130110517

  1. Verdade. Se não fosse a lua, o hemisfério norte derreteria de vez, e haveria uma modificação oscilante extrema em todo o clima global. Realmente um satélite natural ajuda a manter um “equilíbrio” no eixo do planeta-mãe.

    Aproveitando o espaço, abraço à equipe Eternos aprendizes, o Ricardo. E boas festas, e ótimo 2011 aos nossos amigos internautas, com muito mais conhecimento e descobertas, e avanços tecnológicos, e possibilidades nesse vasto universo em expansão, e possíveis variadas formas de vida! Abraço aos que olham para o céu noturno e sonham!

  2. Para o planeta conter vida, é fundamental também a presença de agua em estado líquido, mas para que isso ocorra, além do planeta estar na zona Goldilocks em relação a sua estrela mãe, o eixo de inclinação tem que ser parecido com o da terra, pois dependendo podemos ter um planeta coberto de gelo, ou desértico ou se for parecido com o eixo da terra conter água líquida, conforme artigo publicado na Geo . Será que Gliese 581d tem um eixo de rotação que permita conter água em estado líquido igual a nossa terra?

      • ROCA em 23/12/2010 às 10:31
        Autor

      Luiz Bonfim,

      Bem lembrado!

      Gliese 581d é uma super-Terra e das ‘grandes’… Tem 7,09 vezes a massa da Terra e 1,71 vezes o diâmetro terrestre. Nosso conhecimento de super-Terras ainda é bastante limitado, afinal, não há super-Terras no Sistema Solar!

      No entanto, sugiro ler o artigo abaixo que esclarecem sobre o potencial da vida em super-Terras:
      http://eternosaprendizes.com/2009/12/14/podem-as-super-terras-serem-superiores-para-hospedar-a-vida/

      Quanto a estabilidade do eixo de rotação em Gliese 581d que você menciona, leia abaixo:
      “um aspecto que pode afetar significativamente o potencial para a vida é a presença de uma lua companheira. A Lua ajuda a Terra a balancear sua rotação gerando uma estabilidade na inclinação de seu eixo ao longo do tempo. Sasselov calcula que a massa extra de uma Super Terra poderá contribuir para que esta tenha também uma rotação estável e desta forma uma Lua de grande porte como a nossa não seria imprescindível para manter o exoplaneta alinhado.” Assim, a resposta é positiva, Gliese 581d é uma super-Terra e como tal deveria ser manter girando de forma estável, sem grandes oscilações do eixo de rotação.

      No artigo a seguir falamos sobre as 4 categorias para exoplanetas que podem sustentar a vida como a conhecemos:
      http://eternosaprendizes.com/2008/12/21/os-exoplanetas-habitaveis-podem-ser-classificados-em-quatro-tipos-quais-sao/

      Assim, embora sua densidade média estimada seja 41,8% maior, teoricamente (segundo meus cálculos), que a da Terra, Gliese 581d pode até ser um mundo tipo 3 (coberto por capa de gelo, como Europa) ou tipo 4 (coberto por um profundo oceano global).
      No entanto, a densidade deste exoplaneta ainda é incerta para concluirmos certos detalhes. Ficamos por enquanto navegando em hipóteses.

      ._._.

  3. Ainda realmente não confimaram a existência de Gliese g (mas o farão, e será positiva, com certeza), e em relação ao gliese d, “o resultado implica que pode hospedar água líquida em vastas regiões de sua superfície”.
    O interessante nos experimentos são as possibilidades ou “condições habitáveis”, favoráveis de vida, mesmo em alto teor, ou apenas 5% de CO2, com pressão média ou alta.
    Vamos aguardar maiores dados. O excitante nisso tudo, é que estamos à cerca de 20,3 anos-luz, e já encontramos potencial de vida. Imagina as 100 bilhões de galáxias! Abs

  1. […] agora estão confiantes de que o exoplaneta chamado GJ 581d (Gliese 581d), identificado há alguns anos no programa HARPS e que orbita a estrela Gliese 581, de fato […]

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