O VLT do ESO investiga o verão de Tritão revela sua atmosfera de Metano e Monóxido de Carbono

Ilustração de L. Calçada mostra como a maior lua de Netuno, Tritão, se parece a partir de elevada altura em relação a sua superfície. O Sol aparece distante acima, à esquerda e Netuno crescente surge à direita. Os astrônomos do ESO usaram o dispositivo CRIRES do VLT para inspecionar o verão no hemisfério sul de Tritão. Crédito: ESO/L. Calçada

Ilustração de L. Calçada mostra como a maior lua de Netuno, Tritão, se parece a partir de elevada altura em relação a sua superfície. O Sol aparece distante acima, à esquerda e Netuno crescente surge à direita. Os astrônomos do ESO usaram o dispositivo CRIRES do VLT para inspecionar o verão no hemisfério sul de Tritão. Crédito: ESO/L. Calçada

A primeira análise já realizada no espectro infravermelho da atmosfera de Tritão, lua de Netuno, revela detalhes do seu hemisfério sul que se encontra no verão. Uma equipe de cientistas europeus utilizou o Very Large Telescope do ESO e lá descobriu monóxido de carbono e metano, pela primeira vez a partir de observações de telescópios terrestres. Estas observações revelam que a fina atmosfera de Tritão varia de estação para estação, tornando-se mais espessa quando está quente.

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Tritão e suas estações climáticas

“Descobrimos evidências sólidas que o Sol infringe sua marca em Tritão, mesmo encontrando-se a uma distância tão grande. Esta lua gelada tem estações assim como nosso planeta, mas que variam muito mais lentamente,” afirmou Emmanuel Lellouch, autor principal do artigo científico que detalha estes resultados na revista Astronomy & Astrophysics [1]

A temperatura média à superfície de Tritão ronda os – 235º Celsius. Agora, Tritão está passando pelo seu verão no hemisfério sul e no inverno no hemisfério norte. À medida que o hemisfério sul se aquece uma camada fina gelada de azoto (nitrogênio), metano e monóxido de carbono na superfície de Tritão sublima-se em gás, tornando a atmosfera gelada do satélite mais espessa à medida que a estação progride no decurso da órbita de 165 anos  que Tritão executa em volta do Sol. Uma estação climática em Tritão dura um pouco mais de 40 anos, e Tritão passou o solstício de verão do hemisfério sul em 2000.

Baseando-se na quantidade de gás medido, Lelouch e colegas estimam que a pressão atmosférica de Tritão aumentou 4 vezes quando comparada às medições feitas pela sonda Voyager 2 em 1989, quando ainda Tritão ainda estava em sua primavera. A pressão atmosférica de Tritão encontra-se agora entre 40 e 65 microbares, 20.000 vezes inferior a pressão da atmosfera terrestre.

Sabia-se que monóxido de carbono se encontra presente à superfície sob a forma de gelo, mas Lellouch e a sua equipe descobriram que a camada mais superficial se encontra enriquecida por gelo de monóxido de carbono de cerca de um fator dez quando comparada com as camadas mais profundas, e que é esta camada superficial que alimenta a atmosfera. Embora a maior parte da atmosfera de Tritão seja composta por azoto (tal como na Terra), o metano na atmosfera, primeiramente detectado pela Voyager 2 e só agora confirmado por este estudo feito a partir da Terra, desempenha igualmente um papel importante. “O clima e os modelos atmosféricos de Tritão terão que ser revistos, agora que descobrimos monóxido de carbono e tornamos a medir seu metano,” disse a co-autora Catherine de Bergh.

Dos 13 satélites conhecidos de Netuno, Tritão é notavelmente o maior, com 2.700 quilômetros de diâmetro (cerca de 75% do tamanho da Lua), Tritão consiste no sétimo maior satélite do Sistema Solar. Desde a sua descoberta em 1846, Tritão tem intrigado os astrônomos devido à sua atividade geológica, suas exóticas superfícies congeladas, com nitrogênio, água  e dióxido de carbono em estado sólido e principalmente pelo seu movimento retrógrado [2].

Observar a atmosfera de Tritão não é trivial, já que este satélite se encontra 30 vezes mais afastado do Sol do que a Terra. Nos anos 80 do século XX, os astrônomos pensavam que a atmosfera deste satélite de Netuno devia ser tão espessa como a de Marte (7 milibares). Só quando a sonda Voyager 2 passou pelo planeta em 1989 é que a atmosfera de azoto e metano, com uma pressão atual de 14 microbares, 70.000 vezes menos densa que a da Terra, foi efetivamente medida. Desde então, as observações a partir do solo têm sido escassas. Observações de ocultações estelares (um fenômeno que ocorre quando um corpo do Sistema Solar passa em frente a uma estrela e tapa parte da sua radiação) indicavam que a pressão à superfície estava a aumentar desde os anos 90 do século passado. Foi preciso esperar pela construção do espectrógrafo CRICES (do inglês Cryogenic High-Resolution Infrared Echelle Spectrograph)  montado no Very Large Telescope (VLT) para que a equipe tivesse a oportunidade de desenvolver um estudo mais detalhado sobre a atmosfera de Tritão. “Necessitávamos da sensibilidade e capacidade do CRICES para obter espectros muito detalhados da sua muito tênue atmosfera,” disse o co-autor Ulli Käufl. As observações fazem parte de um programa que inclui igualmente um estudo de Plutão [eso0908].

Plutão, considerado algumas vezes como o ‘primo de Tritão’, tem condições similares e por isso está neste momento a atrair atenção devido a esta descoberta de monóxido de carbono em Tritão. Os astrônomos estão a tentar descobrir igualmente este químico neste planeta anão ainda mais distante.

Este é apenas o primeiro passo para que os astrônomos com a ajuda do CRICES compreendam a física dos corpos distantes do Sistema Solar. “Podemos agora começar a monitorizar a atmosfera e aprender muito sobre a evolução de Tritão com as estações, ao longo de décadas,” disse Lellouch.

Notas

[1] Este trabalho foi publicado na Astronomy & Astrophysics (“Detection of CO in Triton’s atmosphere and the nature of surface-atmosphere interactions”, por E. Lellouch et al., referência DOI : 10.1051/0004-6361/201014339).

[2] Tritão é o único satélite de grande porte no Sistema Solar que apresenta um movimento retrógrado, isto é, um movimento que vai no sentido oposto ao da rotação de seu planeta. Esta é uma das razões porque se especula que Tritão foi capturado do cinturão de Kuiper e como tal partilha muitas das características dos planetas anões, como Plutão. Há uma hipótese, contudo, que sugere que Netuno tenha engolido uma super-terra e capturado sua lua, Tritão.

Equipe

E. Lellouch, C. de Bergh, B. Sicardy (LESIA, Observatoire de Paris, França), S. Ferron (ACRI-ST, Sophia-Antipolis, França) e H.-U. Käufl (ESO).

Fontes e referências

ESO:

A&A: Detection of CO in Triton’s atmosphere and the nature of surface-atmosphere interactions

._._.

3 comentários

  1. Oi Helena, bem interessante sua colocação. Eu particularmente acredito que o que está acontecendo atualmente é algo que sempre aconteceu e sempre acontecerá. O problema é que a população mundial cresce muito rapidamente e a maioria começa a ocupar espaços que não são muito ‘seguros’ para se morar.

    Desta forma estão sujeitos aos fenômenos naturais que sempre ocorreram e sempre irão ocorrer, seja terremotos, furacoes, vulcoes, etc. De fato, a sequencia de eventos naturais ocorridos atualmente tem sido bem assutadora. Se você considerar que nos últimos 3 meses foram 3 terremotos devastadores em três regiões diferentes da terra, e isto sem falar nos vulcoes, chuvas, etc.

    Tambem nao sou muito de acreditar nestas histórias de “fim do mundo” assim como você, mas confesso que vendo estes desastres todos, fico meio que ‘desconfiado’… rsrs..

    Deixo como dica pra você, o documentário Cosmos do lendário Carl Sagan. Se ainda não assistiu eu te recomento. Se não tiver muito tempo disponível e/ou paciencia assista o último episódio da série intitulado “O Futuro da Terra”, ele vai dirimir todas as suas dúvidas de forma cética, clara e objetiva.

    Grande abraço, e estou aguardando também a opinião do Ricardo.

      • ROCA em 21/04/2010 às 11:35
        Autor

      Ericson e Helena,
      O que assistimos nada mais é que a manifestação natural de eventos de mudanças em nosso planeta. Nosso planeta está em contínua mutação e tem sido isto que sustenta a vida aqui. Se por um lado a movimentação tectônica de placas trás consigo os perigosos vulcões e devastadores tsunamis e terremotos, é graças a ela que a vida na Terra prosperou. Tanto é que hoje os cientistas afirmam que um exoplaneta sem atividade tectônica é um planeta morto (temos dois exemplos aqui no Sistema Solar: Marte e Vênus). Sugiro a leitura:

      Vida extraterrestre: a presença da tectônica de placas é condição necessária para a vida

      Podem as Super Terras serem superiores para hospedar a vida?

      Quanto ao fato de haver mais mortes isto também é infelizmente uma consequência natural do aumento da população e do empobrecimento, assunto explorado aqui:

      Há mais terremotos na Terra? Não! Há mais pessoas morando em áreas de alto risco!

      ” Os especialistas em desastres e terremotos dizem que o cenário só irá piorar. Das 130 cidades no mundo com mais de 1 milhão de habitantes, mais da metade estão em locais com falhas geológicas, em regiões de alto risco, tornando-as mais propensas a terremotos, lembrou Bilham. “Eu calculei que atualmente mais de 400 milhões de pessoas correm riscos somente por causa disto”, completou Bilham. As nações em desenvolvimento, onde há uma explosão demográfica, não tem prestado atenção nos preparativos contra terremotos, comentou Bilham. “Se você tem graves problemas para se alimentar, você não vai efetivamente se preocupar com terremotos.” ”

  2. Olá Ricardo, gosto muito do seu blog e sempre o acesso, confiando de que aqui encontrarei material verdadeiramente científico e confiável, e com fontes confiáveis. Primeiramente ia comentar a respeito do post que achei interessantíssimo, porém, acabei de ver uma notícia que me assustou um pouco e peço desculpas por desviar do assunto do post. Eu até procurei seu email pelo blog, mas não o achei.
    .
    Nunca fui de acreditar nessa história de “fim do mundo”, nem em 99 e nem agora em 2012, porém os recentes acontecimentos tem sido um tanto assustadores. Primeiro as chuvas de proporções históricas, os terremotos, tsunamis, o vulcão na Islândia, e ao que parece um Meteoro que se desintegrou ao entrar em contato com a atmosfera iluminou 4 estados amricanos dia 15/04. Por que a NASA não falou nada a respeito desse meteoro? Por que nada foi divulgado até para acalmar as pessoas que já andam tão assustadas com as recentes loucuras que andam acontecendo. Nem mesmo o seu blog noticiou algo a respeito. E a Revista Época divulgou uma matéria falando que há uma companhia nuclear construindo abrigos contra o fim do mundo e que custa R$50.000 por pessoa.
    .
    O que você tem a dizer a respeito? Existe algo acontecendo que não sabemos? Independente de “calendário maia” e toda essa baboseira. Porque se continuar assim, a tendência é não chegarmos nem a 2012.

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