Extinção em massa há 12.900 anos: a Terra foi atingida por um cometa? (parte 2)

Um choque da Terra com um enxame de pedaços de um cometa foi responsável pela extinção há 12.900 anos ? Uma chuva de pedaços de um grande cometa foi responsável pela extinção há 12.900 anos? Crédito: USGS

Um choque da Terra com um enxame de pedaços de um cometa foi responsável pela extinção há 12.900 anos ? Crédito: USGS

Fragmentos do cometa que se partiu em pedaços, 73P/Schwassmann Wachmann 3, capturados pelo telescópio espacial Hubble. Professor Napier estima que um enxame de pedaços de um grande cometa se chocou com a Terra há 12.900 anos, provocando extinções em massa, principalmente no continente Norte-Americano. Crédito: NASA / ESA / H.Weaver (JHU/APL) / M. Mutchler / Z.Levay (STScI)

Fragmentos do cometa que se partiu em pedaços, 73P/Schwassmann Wachmann 3, capturados pelo telescópio espacial Hubble. Professor Napier estima que um enxame de pedaços de um grande cometa se chocou com a Terra há 12.900 anos, provocando extinções em massa, principalmente no continente Norte-Americano. Crédito: NASA / ESA / H.Weaver (JHU/APL) / M. Mutchler / Z.Levay (STScI)

Foi um cometa gigante fragmentado o verdadeiro responsável pela massiva extinção Norte-Americana em 11.000 AC (antes de Cristo)? Um novo modelo proposto explica o cenário provável para este cataclismo.

Há cerca 13.000 anos a Terra foi bombardeada por milhares de fragmentos de cometa ao longo de uma hora, pedaços estes de tamanho similar ao objeto que atingiu Tunguska, em 1908. Tal cataclismo supostamente levou a um esfriamento climático catastrófico no planeta, além, é claro, dos terríveis danos nos locais atingidos, de acordo com o astrônomo e professor Bill Napier do Centro Universitário Cardiff de Astrobiologia.

O professor Napier apresentou seu novo modelo sobre as causas desta catástrofe no jornal mensal da Royal Astronomical Society.

O cometa LINEAR e seus fragmentos. Crédito: NASA/Hubble

O cometa LINEAR e seus fragmentos. Crédito: NASA/Hubble

Resfriamento global (-8°C) e as evidências geológicas

O intenso resfriamento global que chegou até -8°C interrompeu o aquecimento que estava ocorrendo no final da última era glacial e causou o recrudescimento das geleiras, que voltaram a avançar sobre os continentes. Foram encontradas evidências que esta mudança climática catastrófica estava associada a algum acontecimento extraordinário extraterrestre.

Um 'tapete negro' encontrado no Arizona marca a linha de extinção há 12.900 anos. As pontas de Clóvis e os esqueletos do mamute lanoso foram encontrados na linha (marcada pela seta) e abaixo desta, mas nunca acima. Crédito: Allen West, UCSB

Um ‘tapete negro’ encontrado no Arizona marca a linha de extinção há 12.900 anos. As pontas de Clóvis e os esqueletos do mamute lanoso foram encontrados na linha (marcada pela seta) e abaixo desta, mas nunca acima. Crédito: Allen West, UCSB

O limite geológico que delimita o ‘antes e depois’ da catástrofe é marcado pela presença de uma camada semelhante a um tapete negro. Isto corresponde a uma camada de alguns centímetros de espessura encontrada em muitos locais ao longo dos Estados Unidos contendo altos níveis de fuligem [Haynes, 2008] que são indicativos de incêndios com escala continental.

Além da fuligem, foi detectada a presença extensiva de diamantes microscópicos hexagonais (os nanodiamantes), os quais são produzidos unicamente por violentos choques e são encontrados apenas em meteoritos e crateras de impacto.

Estes resultados conduziram à sugestão inicial de que as mudanças catastróficas da época foram causadas pelo impacto de um asteróide ou de um cometa com 4 km de diâmetro [Toon et al. ,1997 e Firestone et al. , 2007]  na folha de gelo de Laurentide, que na época abrangia o que se tornaria o Canadá e parte do norte dos Estados Unidos.

Extinção de megacriaturas e do povo de Clóvis

Sabemos que o resfriamento durou mais de mil anos, e seu início coincide com a rápida extinção de 35 espécies de megamamíferos (como o mamute-lanoso) e aves de grande porte da América do Norte [Faith & Surovell, 2009], bem como o rompimento repentino da cultura paleoíndia (o fim do povo de Clóvis) no continente norte-americano.

No entanto, a principal objeção à idéia do grande impacto originalmente proposta (o suposto cometa de 4 km) se relaciona ao fato de que a probabilidade da Terra ser atingida por um asteróide/cometa deste tamanho há apenas 13.000 anos, é relativamente baixa, estimada em 0,1% (uma chance em mil) [Harris, 2008].

Além disso, o calor gerado pela bola de fogo de um impacto único seria limitado pela curvatura do horizonte e não poderia explicar a ocorrência de incêndios florestais em praticamente todo o continente norte-americano. Assim, para provocar incêndios em áreas continentais o objeto deveria ter sido bem maior (100 km de diâmetro), o qual teria causado a massiva extinção global, praticamente dizimado a vida em todo o planeta Terra [Melosh, 2009]. Como isto não se verificou, pelas evidências geológicas encontradas, a hipótese do impacto único12.900 anos tem sido questionada.

Fragmentos do cometa Shoemaker Levy 9 em 17-05-1994. Crédito: NASA/Hubble Space Telescope

Fragmentos do cometa Shoemaker Levy 9 em 17-05-1994. Crédito: NASA/Hubble Space Telescope

Agora, o professor Napier apresentou um modelo astronômico que representa as principais características desta catástrofe sem envolver um evento tão improvável de um impacto único com objeto massivo. De acordo com o seu modelo, a Terra interceptou uma trilha densa de material cometário em desintegração. Ele ressalta que há fortes evidências de que tal cometa entrou no interior do sistema planetário entre 20.000 e 30.000 anos atrás e foi fragmentando, desde então, dando origem a chuvas de meteoros intrinsecamente relacionados e agrupamentos de asteróides conhecido como o Complexo Taurid.

Modelo mostra uma trilha com 1.000 fragmentos cometários. A trilha foi gerada por um cometa em uma órbita similar a do cometa Encke no seu periélio. Bastam apenas algumas horas para a Terra atravesser uma trilha de escombros cometários como esta do modelo acima. Crédito: Professor Napier

Modelo mostra uma trilha com 1.000 fragmentos cometários. A trilha foi gerada por um cometa em uma órbita similar a do cometa Encke no seu periélio. Bastam apenas algumas horas para a Terra atravesser uma trilha de escombros cometários como esta do modelo acima. Crédito: Professor Napier

Para reforçar sua tese, Professor Napier cita os impactos sofridos por Júpiter em 1994 causado pelo choque com fragmentos do cometa D/1993 F2 Shoemaker Levy 9.

Os efeitos do impacto da explosão de possível fragmento cometário ou asteróide em Tunguska, 1908, ainda são visiveis atualmente. Crédito: Galena HS

Os efeitos do impacto da explosão de possível fragmento cometário ou asteróide em Tunguska, 1908, ainda são visíveis atualmente. Crédito: Galena HS

No decorrer da desintegração do cometa gigante, o ambiente do sistema interplanetário teria se tornado perigoso para a Terra. Nosso planeta provavelmente teria executado uma passagem através de um enxame denso de material cometário. O novo modelo de Napier indica que esse encontro teria a duração cerca de uma hora durante a qual milhares de impactos ocorreram em dimensões continentais, cada fragmento liberando a energia de uma bomba de nuclear de 1 megaton de TNT, gerando os extensivos incêndios florestais, que temos evidência que ocorreram há 12.900 anos no continente norte-americano. Além disso, os nanodiamantes encontrados nos sedimentos que se situam no limite da extinção podem fornecer a justificativa para o impacto do enxame de fragmentos cometários.

O meteorito do Lago Tagish

Um meteorito recente conhecido que poder ter surgido a partir do cometa gigante progenitor: o meteorito do Lago Tagish, que caiu sobre o território de Yukon, em janeiro de 2000. Este meteorito tem a maior abundância de nanodiamantes que qualquer meteorito analisado até agora.

Professor Napier resume o seu modelo: “Um grande cometa foi se desintegrando no ambiente próximo da Terra nos últimos 20.000 a 30.000 anos, e o choque da Terra com milhares de fragmentos deste cometa este é um evento muito mais provável que uma única colisão de grandes dimensões.”

Napier afirma, concluindo que “este modelo dá uma justificativa convincente para as principais características geofísicas encontradas, nesta fronteira geológica.”

A tese do professor Napier

Professor Napier escreveu na introdução de seu artigo:

“A interseção com os escombros de um grande cometa periódico (50 a 100 km de diâmetro) durante o Paleolítico superior fornece uma explicação satisfatória para a catástrofe de origem celestial cuja ocorrência tem sido postulada para 12.900 anos atrás, que precedeu um retorno à idade-do-gelo com duração de 1.300 anos. O complexo Taurid parece ser o responsável pelos escombros deste arcaico cometa; O complexo Taurid engloba pelo menos 19 dos mais brilhantes objetos próximos da Terra. Uma cadeia de corpos como tamanho menor de 1 km pode representar o maior impacto regional destrutivo que temos conhecimento nas escalas de tempos desde o surgimento da raça humana.”

Para saber mais sobre o trabalho do Prof. Napier consulte: Palaeolithic extinctions and the Taurid Complex.

Recomendamos a leitura do artigo “Extinção em massa há 12.900 anos: a Terra foi atingida por um cometa? (parte 1) onde você encontrará detalhes sobre as evidências geológicas da queda dos fragmentos do cometa há 13.000 anos.

Fontes e referências

Cosmos Magazine: Did a comet trigger a mini Ice Age? por Richard Ingham

RAS: Was a giant comet responsible for a North American catastrophe in 11000 BC?

Astrobiology Magazine: The Deadly Sting of a Comet Tail

ArXiv.org: Palaeolithic extinctions and the Taurid Complex por W. M. Napier

Firestone, R.B., 2009, J. Cosmology 2, 256

Harris A., 2008, Nature, 453, 1178

Haynes, C.V., 2008, Proc. Nat. Acad. Sci., 105, 6520

Melosh J., AGU Meeting 14-18 December 2009, San Francisco

Toon O.B., Turco R.P., Covey C., Zahnle K., Morrison D., 1997,

._._.

8 comentários

2 menções

Pular para o formulário de comentário

    • José dos Santos em 20/03/2018 às 08:07
    • Responder

    Olá! Não há nem pode haver conflito entre religião e ciência porque a religião foi a forma encontrada pelos humanos para tentar explicar o que não compreendiam. Uma parte da religião evoluiu para a ciência através do conhecimento e consequente evolução e outra para o poder através da subserviência e consequente estagnação.

  1. Ao que tudo indica em 12.900 AC a Terra foi duramente atingida por chuvas de meteoroides provinda da fragmentação de um cometa. Menos mal que um cometa inteiro, diriam os dinossauros! O Brasil não ficou fora do bombardeio, cíclico e que pode ter acontecido entre 14.000 AC a 1.2000AC. Provocando extição da megafauna e comunidades humanas locais. O evento foi global. As marcas estão em toda parte, em nossos quintais.

    http://sites.google.com/site/cosmopier/impact-craters/end-pleistocene-palaeolagoons

  2. Se toda a vida na terra foi extinta por volta de 13.000 AC, isto vem de encontro com genesis 1.2 que diz que a terra tornou-se sem forma e vazia, e Adao eh calculado seu surgimento por volta de 10.000AC, assim nao ha conflito entre biblia e ciencia

      • ROCA em 12/04/2010 às 09:46
        Autor

      Você está misturando temas de fé com fatos históricos/científicos.

      Não foi ‘toda a vida’ da Terra que se extingiu há 13.000 anos (11.000 AC), mas apenas uma pequena fração dela, principalmente 35 megaespécies (animais de grande porte) e o povo de Clóvis na América do Norte.

      Os demais animais, plantas e humanos espalhados pelos outros continentes NÃO SE EXTINGUIRAM, embora tenha havido muitas mortes, obviamente, com o ressurgimento da glaciação, ou seja, com as mudanças climáticas que esfriaram a Terra após o evento de choque da Terra com os fragmentos do cometa.

      Pense nisso e não misture os assuntos.

  3. Muito obrigado pelo link, é muito bom e bem contado. Eu sabia as datas, mas também todos sabemos que o registo fóssil está sempre sujeito à revisão. É sabido que durante o Würminense o nível do mar desceu muito, e grandes territórios hoje ficam asolagados pelo mar (podia-se ir caminhando da actual Europa continental à ilha da Grã-Bretanha). Não sabemos os achados que estão ai a aguardar pois todos os que temos correspondem ao que era na altura terra bem interior (todo o que ainda deve estar por descobrir a respeito de trebelhos pesqueiros). Acho que isto é importante, porque as populações bem puderam ter-se deslocado maciçamente para a faixa costeira, por qualquer razão (ou razões). E está-se a evidenciar que a queda de asteroides, cometas e outros é um agente muito poderoso de extinção em muitas épocas.

  4. Pergunto-me… poderia ter sido também a causa da extinção dos Neandertais? É um problema ainda sem solução (apenas sabemos que, sendo eles mais fortes e robustos, faziam parte de grupos mais pequenos e eram populações assim mais expostas à extinção súbita).

      • ROCA em 06/04/2010 às 10:54
        Autor

      Palerme,
      Este cataclismo não está relacionado com a extinção do Homo neanderthalensis. Verifique as datas: o fim do povo de Clóvis se deu há 13.000 anos e a extinção do homem de Neandertal há 29.000 anos.

      “O homem-de-neandertal (Homo neanderthalensis) é uma espécie extinta, fóssil, do gênero Homo que habitou a Europa e partes do oeste da Ásia, de cerca de 300.000 anos atrás até aproximadamente 29.000 anos atrás (Paleolítico Médio e Paleolítico Inferior, no Pleistoceno), tendo coexistido com os Homo sapiens.”

      Leia mais no http://colunas.g1.com.br/visoesdavida/2009/08/01/o-ultimo-neandertal/

  5. O homem apresenta três características que fazem dele uma espécie de difícil extinção, no caso de um cenário de alterações ambientais drásticas e repentinas: ele é manualmente hábil, intelectualmente engenhoso e, o principal, onívoro. Se já tinha estas características antes de ter sobrevivido a uma catástrofe meteorológica ou se passou a tê-las ao sobreviver, essa é a questão. Mas outras espécies, bem menos adaptáveis e hábeis do que o homem, também estão habitando o planeta há mais tempo.

    Dois terços dos cometas, ou asteróides, que se chocaram contra a Terra ao longo do cenozóico, provavelmente cairam na água. Pelo menos esta é a probabilidade. Estes, que cairam na água, causaram alterações climáticas diferentes das que usualmente são relacionadas quando se fala em extinções causadas por bólidos celestes. Fogo e atmosfera opaca não é o único resultado possível de uma queda de cometa ou asteróide. Quanto aos que, porventura, tenham caido na Terra já no quaternário, descontados os que cairam nos mares, parece que não tiveram a capacidade de extinguir espécies, pois todas as espécies habitantes do planeta, existem, há, no mínimo, um milhão de anos. O homem inclusive.

  1. […] Extinção em massa há 12.900 anos: a Terra foi atingida por um cometa? (parte 2) […]

  2. […] março de 2010 o Professor Napier reforçou a hipótese cometária alegando que não foi um objeto, mais um enxame de…. Sua tese pode ser lida […]

Deixe uma resposta para Palerme Cancelar resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

error: Esse blog é protegido!