O VLT do ESO encontra estrelas primitivas nas vizinhanças da Via Láctea

A galáxia anã de Fornax (Fornalha), vizinha da Via Láctea, foi alvo da busca por estrelas primitivas. Crédito: ESO/Digitized Sky Survey 2

A galáxia anã de Fornax (Fornalha), vizinha da Via Láctea, foi alvo da busca por estrelas primitivas. Crédito: ESO/Digitized Sky Survey 2

Durante muitos anos as estrelas anciãs primordiais residentes fora da Via Láctea se mantiveram escondidas. Agora elas finalmente foram detectadas. O ESO utilizou o Very Large Telescope (VLT) para resolver este importante problema astrofísico, relativo às estrelas mais antigas na nossa vizinhança galáctica. O entendimento sobre as estrelas primitivas é crucial o conhecimento da evolução do Universo desde seus primórdios.

Na realidade, descobrimos uma falha nos ‘métodos forenses’ utilizados até agora,” disse Else Starkenburg, autora líder deste estudo. “O nosso método mais desenvolvido permitiu-nos descobrir as estrelas primitivas escondidas no meio de todas as outras estrelas mais comuns.”

http://www.eso.org/public/images/eso1007b/

A galáxia anã do Escultor, satélite da Via Láctea, foi pesquisada na busca por estrela de metalicidade extremamente baixa, as estrelas pertencentes as primeiras gerações. Crédito: ESO/Digitized Sky Survey 2

A busca por estrelas primitivas para entender as origens do Universo

Os astrônomos estimam que as estrelas primitivas se formaram a partir de matéria forjada logo após o Big Bang, que ocorreu há 13,7 bilhões de anos. Estas estrelas têm, tipicamente, menos que uma milésima parte da quantidade de elementos químicos mais pesados que o hidrogênio e o hélio, encontrados no Sol. Assim estas estrelas antigas são estrelas extremamente pobres em metais, ou seja, são estrelas de metalicidade extremamente baixa [1]. Estas estrelas podem pertencer a uma das primeiras gerações de estrelas no Universo observável. Tais estrelas, extremamente raras, tem sido observadas principalmente aqui na Via Láctea.

Os cosmologistas julgam que as galáxias maiores, como a Via Láctea ou Andrômeda, se formaram a partir da fusão de galáxias menores. A população de estrelas de baixa metalicidade da Via Láctea deveria já estar presente nas galáxias anãs que lhe deram origem, e por isso, populações similares deveriam estar igualmente presentes em outras galáxias anãs. “Até agora, evidências destas populações tinham sido escassas,” disse a co-autora Giuseppina Battaglia. “Levantamentos feitos nos últimos anos mostraram seguidamente que as populações estelares mais antigas da Via Láctea e de galáxias anãs não coincidem, fato que não é de todo esperado segundo os modelos cosmológicos.”

Dificuldades na detecção

A abundância dos elementos é medida a partir de espectros, que nos fornecem as impressões digitais químicas das estrelas [2]. A Equipe de Abundâncias e Velocidades Radiais de Galáxias Anãs [3] utilizou o instrumento FLAMES montado no Very Large Telescope do ESO para medir o espectro de cerca de 2.000 estrelas gigantes individuais em quatro das nossas galáxias anãs em nossa vizinhança: Fornax (Fornalha), Escultor, Sextante e Carina. Uma vez que as galáxias anãs estão a distâncias típicas de 300.000 anos-luz (cerca de três vezes o diâmetro da Via Láctea) apenas os riscos e as bandas mais intensas no espectro puderam ser medidas. Além disso, estas aparecem como uma impressão digital tênue e borrada. A equipe descobriu dentro do conjunto levantado que nenhuma das impressões digitais espectrais parecia pertencer à classe de estrelas que buscavam, ou seja, raras estrelas extremamente pobres em metais encontradas na Via Láctea.

Agora, a equipe de astrônomos liderada por Starkenburg conseguiu resultados interessantes ao comparar cuidadosamente os espectros com modelos computacionais. Esta equipe descobriu que são diferenças muito sutis que efetivamente distinguem a impressão digital química de uma estrela pobre em metais normal de uma estrela extremamente pobre em metais. Assim, isto explica porque os métodos anteriores falharam na seleção destas estrelas.

Metalicidade ultra baixa

Os astrônomos confirmaram também o estado imaculado de várias estrelas extremamente pobres em metais, graças aos espectros muito detalhados obtidos pelo instrumento UVES montado no VLT (Very Large Telescope) do ESO. “Comparadas com as impressões digitais muito tênues que tínhamos anteriormente, estas se assemelham à impressão digital vista ao microscópio,” explica Vanessa Hill, membro da equipe. “Infelizmente, apenas um pequeno número de estrelas pode ser observado desta maneira uma vez que esta observação que exige um esforço muito maior”.

Entre as novas estrelas extremamente pobres em metais descobertas nestas galáxias anãs, três têm uma quantidade relativa de elementos químicos entre apenas 1/3.000 e 1/10.000 da que é observada no Sol, incluindo assim a estrela que detém o atual recorde da mais primitiva encontrada fora da Via Láctea,“ disse Martin Tafelmeyer, membro da equipe.

O nosso trabalho não só revelou algumas das  interessantes estrelas primordiais nestas galáxias, como ainda fornece uma nova e poderosa técnica de detecção de estrelas deste tipo,” conclui Starkenburg. “A partir de agora as estrelas já não têm como se esconder!

Sobre o trabalho e a equipe

Este trabalho foi publicado em Astronomy and Astrophysics (“The NIR Ca II triplet at low metallicity”, E. Starkenburg et al.). Há outro artigo (por Tafelmeyer et al.), que apresentará as medições feitas sobre os espectros obtidos pelo UVES de várias estrelas primitivas, que se encontra em desenvolvimento.

A equipe é composta por Else Starkenburg, Eline Tolstoy, Amina Helmi e Thomas de Boer (Kapteyn Astronomical Institute, University of Groningen, Holanda), Vanessa Hill (Laboratoire Cassiopée, Université de Nice Sophia Antipolis, Observatoire de la Côte d’Azur, CNRS, França), Jonay I. González Hernández (Observatoire de Paris, CNRS, Meudon, França e Universidad Complutense de Madrid, Espanha), Mike Irwin (University of Cambridge, UK), Giuseppina Battaglia (ESO), Pascale Jablonka e Martin Tafelmeyer (Université de Genève, Ecole Polytechnique Fédérale de Lausanne, Suíça), Matthew Shetrone (University of Texas, McDonald Observatory, USA), e Kim Venn (University of Victoria, Canadá).

Notas

[1] Metalicidade: de acordo com a definição usada em astronomia, “metais” são todos os elementos com exceção do hidrogênio e do hélio. Com exceção do hidrogênio, hélio e frações de lítio e berílio, todos os elementos ‘metálicos’ foram criados dentro das estrelas por nucleossíntese ou no decorrer das explosões de supernovas.

[2] Espectro: como vemos em quaisquer arco-íris ou em halos solares, a luz branca pode dividir-se em diferentes cores. Os astrônomos separam artificialmente a luz que recebem de objetos distantes nas suas diferentes cores (ou “comprimentos de onda”). Entretanto, enquanto os humanos distinguem as sete cores no arco-íris, os astrônomos mapeiam centenas de nuances coloridas, produzindo um espectro – o registro das diferentes quantidades de radiação que o objeto emite em cada banda de cor estreita. Os detalhes de um espectro (mais radiação emitida em determinadas cores e menos em outras) fornecem indícios precisos sobre a composição química da matéria que produz essa radiação.

[3] DART: o Time de Abundâncias e Velocidades Radiais de Galáxias Anãs (The Dwarf galaxies Abundances and Radial-velocities Team – DART) é uma colaboração internacional que conta com membros de institutos de nove países diferentes.

Fontes

ESO: No Place to Hide: Missing Primitive Stars Outside Milky Way Uncovered

The NIR Ca II triplet at low metallicity

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