Mundos em colisão: Spitzer descobre rastros deixados por exoplanetas que se chocaram

Concepção artística da colisão de exoplanetas detectada pelo Spitzer no sistema HD 172555. Crédito: NASA/JPL

Concepção artística da colisão de exoplanetas detectada pelo Spitzer no sistema HD 172555. Crédito: NASA/JPL

Um violento choque de exoplanetas no jovem sistema HD 172555 mandou para o espaço rochas derretidas e lava aquecida. O telescópio espacial Spitzer da NASA descobriu pistas de uma colisão em alta-velocidade entre dois exoplanetas recém-formados em torno de uma jovem estrela.

Os astrônomos dizem que dois corpos rochosos, um das dimensões da Lua e o outro similar a Mercúrio, colidiram entre si recentemente, nos últimos mil anos – o que é pouco tempo para os padrões cósmicos. O impacto destruiu o objeto menor, vaporizando grandes quantidades de rocha e libertando massivas quantidades de lava fervente para o espaço.

Uma curiosa animação artística ilustra o evento, neste link: http://www.nasa.gov/mission_pages/spitzer/multimedia/spitzer-20090810.html.


Os detectores infravermelhos do telescópio espacial Spitzer foram capazes de detectar as assinaturas da rocha vaporizada junto com os resíduos de lava aglomerada recongelada, chamados de tectitas.

Colisão em alta velocidade

Carey M. Lisse, cientista do Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins em Laurel, Maryland, EUA, autor líder de novo trabalho científico relatando a investigação na edição de 20 de Agosto do Astrophysical Journal, explicou:

Esta colisão deve ter sido gigantesca e ter acontecido a uma velocidade incrível para ter vaporizado e derretido rochas. Este é realmente um evento raro e de vida-curta, crítico na formação de planetas tipo-Terra e luas. Tivemos sorte em observar um logo [ em escalas cósmicas ] depois de ter acontecido.

Lisse e seus colegas informam que a colisão cósmica é semelhante aquela que formou a nossa Lua há mais de 4 bilhões de anos, quando um corpo do tamanho de Marte (denominado Theia) se chocou com a Terra.

O co-autor do artigo, Geoff Bryden do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da NASA em Pasadena, Califórnia afirmou:

A colisão que formou a nossa Lua deve ter sido tremenda, o suficiente para derreter a superfície da Terra. Os detritos da colisão aparentemente formaram um disco em torno da Terra e o disco eventualmente coalesceu para criar a Lua. Esta é aproximadamente a mesma escala do impacto que estamos vendo com o Spitzer. Nós não sabemos se irá formar uma lua, mas sabemos que a superfície de um dos corpos está em vermelho quente e derreteu.

As colisões massivas são típicas de sistemas jovens?

Um impacto colossal pode ser a causa da anomalia do movimento de Vênus

Um impacto colossal pode ser a causa da anomalia do movimento de Vênus

A história do nosso Sistema Solar é rica em contos de destruição parecidos com este. Hoje estimamos que impactos gigantes provocaram eventos como:

Tamanha violência é um aspecto rotineiro da construção planetária. Os planetas rochosos formam-se e crescem em tamanho através das colisões e agregações entre objetos, fundindo os seus núcleos. Embora as coisas estejam estabilizadas hoje em dia em nosso sistema Solar, ainda assim ocorrem impactos, tal como o que foi observado há um mês, quando um objeto cósmico de menor tamanho colidiu com Júpiter.

Lisse e a sua equipe analisaram o cenário encontrado no sistema jovem HD 172555, que tem cerca de 12 milhões de anos de idade e está localizado a 100 anos-luz da Terra na constelação do Pavão (Pavo) no Hemisfério Sul (lembre-se que, em comparação, o nosso Sistema Solar tem ≈ 4,5 bilhões de anos de idade). Os astrônomos usaram o espectrógrafo do telescópio espacial Spitzer, para verificar a distribuição do espectro luminoso da estrela e procurar assinaturas de elementos químicos. Eles foram então surpreendidos pelo que viram: “Nunca tinha visto nada como isto”, disse Lisse. “O espectro era bastante incomum”.

Após uma cuidadosa análise, os pesquisadores identificaram grandes quantidades de sílica amorfa natural (o mesmo que vidro derretido). A sílica é encontrada aqui na Terra em rochas obsidianas e tectitas. As rochas obsidianas são essencialmente pedaços brilhantes de vidro negro vulcânicos. As tectitas são aglomerados de lava que se formam quando os meteoritos atingem a Terra.

Grandes quantidades do gás monóxido de silício foram também detectadas orbitando o exoplaneta, este gás é criado com a vaporização das rochas devido ao impacto. Em adição a tudo isso, os astrônomos descobriram detritos rochosos provavelmente expelidos pelo desastre planetário.

A quantidade de poeira e gás observada sugere que a massa combinada dos dois corpos que se fundiram teria pelo menos mais do que o dobro da massa da Lua. A velocidade da colisão também deve ter sido tremenda – os dois corpos deveriam estar orbitando a uma velocidade relativa de pelo menos 10 km/s (36.000 quilômetros por hora), antes da colisão.

Este foi um cenário inédito para o Sptizer

O telescópio espacial Spitzer já testemunhou os restos de grandes impactos de asteróides anteriormente, mas ainda não havia descoberto cenário semelhante com tamanha violência – rocha derretida e vaporizada para todos os lados. Por outro lado, Spitzer já tinha observado grandes quantidades de poeira, cascalhos e escombros rochosos, indicando que as colisões devem ter sido graduais. Lisse concluiu:

Quase todos os grandes impactos são como a colisão de um lento Titanic contra um iceberg, enquanto que este evento deve ter gerado uma explosão de fogo gigantesca, cheia de fúria e que durou apenas um piscar de olhos.

Novas luas?

George Rieke (que não faz parte do time do Spitzer), da Unversidade do Arizona em Tucson, disse em entrevista a New Scientist que os estudos de sistemas que sofreram grandes colisões poderão revelar mais sobre como o nosso sistema Solar se formou. Rieke afirmou:

O interesse da ciência é que estamos realmente encontrando traços de importantes colisões que pensamos ter formatado o sistema Terra-Lua.

Rieke ressalta que ainda não está claro se a colisão observada no sistema HD 172555 criou uma quantidade suficiente de escombros que irá coalescer em uma futura lua. O fato de até agora apenas termos detectado poucas estrelas que nos mostram colisões violentas, embora centenas delas estejam rodeadas de discos de poeira, sugere que os impactos violentos que formataram nosso sistema Solar podem ser extremamente raras. Rieke concluiu:

Isto pode implicar que as luas como a nossa podem ser bastante incomuns.

Vejamos a seguir os comentários do Phil Plait em seu blog Bad Astronomy:

Há outra coisa que eu pessoalmente acho muito interessante. Lembramos que o sistema HD 172555 está a apenas 100 anos-luz de distância. Isto é considerado muito perto na escala galáctica (nossa galáxia tem 100.000 anos-luz de diâmetro, então esta estrela é nossa vizinha próxima). Parece incrivelmente improvável que este seja um evento raro na galáxia, uma vez que ele ocorreu tão perto e tão recentemente. É bem mais plausível que tal evento ocorra com freqüência nos sistemas solares jovens, o que quer dizer que isto também aconteceu conosco. Bem, há muito tempo, mais de 4 bilhões de anos, os objetos do tamanho de planetas (ou luas) eram bem mais comuns no nosso sistema solar em formação.

Mas isto leva a credenciar a idéia que colisões em escala planetária realmente ocorrem. Nós já sabemos disso, é claro, por causa da certeza que temos sobre a formação da nossa Lua derivada de uma colisão de um objeto do tamanho de Marte com a Terra há 4,5 bilhões de anos. Nós temos também evidências de vastos impactos em outros objetos do sistema solar.

Mas ver agora evidências disso em outra estrela, com diferentes condições, significa que este tipo de evento pode ser comum e até um passo inevitável no processo de formação de um sistema solar. O Universo é um lugar violento, mas a cada dia que passa torna-se claro que esta violência foi necessária para estarmos aqui agora, afinal. Não tenho certeza aqui se há alguma lição para ser aprendida, mas certamente esse tema é algo que devemos nos lembrar, sempre.

Fontes e Referências

Discover: When worlds collide

New Scientist: Planetary smashup leaves trail of frozen lava por Rachel Courtland

NASA: Planet Smash-Up Sends Vaporized Rock, Hot Lava Flying

SPACE.com: Two Worlds Collide in Deep Space por Clara Moskowitz

Universe Today: Spitzer Finds Evidence of Violent Planetary Collision por Nancy Atkinson

PHYSORG.com: Planet Smash-Up Sends Vaporized Rock, Hot Lava Flying

Science Daily: Planet Smash-Up Sends Vaporized Rock, Hot Lava Flying

Astronomy.com: Planet smash-up sends vaporized rock, hot lava flying

National Geographic News: space photos of the week: planets collide

Science:

  • Planetary smash-up
  • Vídeo

Centauri Dreams: A Massive Extrasolar Collision

ArXiv.org: Abundant Circumstellar Silica Dust and SiO Gas Created by a Giant Hypervelocity Collision in the ~12 Myr HD172555 System

Eternos Aprendizes:

Sobre o Telescópio Espacial Spitzer:

NASA – Spitzer
Centro Espacial Spitzer
Página oficial do Spitzer

._._.

2 menções

  1. […] Qual a razão do movimento retrógrado de Vênus? 01 de março – a sonda Venera 3 e Vênus Mundos em colisão: Spitzer descobre rastros deixados por exoplanetas que se chocaram Discussões sobre a formação do Sistema Solar parte 3: Teria Netuno engolido uma super-terra e […]

  2. […] Esta diferença nas cores nos indica algumas pistas da composição do material no solo, revelando a violenta história de Mimas. Provavelmente, se tivesse ocorrido um impacto maior em Mimas, ligeiramente mais violento que este que originou esta cratera de 130 km de Herschel, teria provavelmente pulverizado totalmente a lua Mimas, transformando-a em um anel de escombros. […]

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

error: Esse blog é protegido!