5 anos do WMAP revelaram três grandes segredos do Universo: os neutrinos primordiais, o fim da idade das trevas e a inflação cósmica

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Esta visão detalhada de todo o céu mostra o jovem Universo a partir de 5 anos de pesquisa via WMAP. A imagem revela flutuações em torno da temperatura média do Universo de 2,725 +/- 0,0002 Kelvin (aparece nas diferenças de cor) que correspondem às sementes que cresceram para se tornarem nas galáxias. O ruído causado pela Via Láctea foi subtraído dessa imagem usando dados de várias frequências. A imagem mostra um intervalo de temperatura de +/- 200 microKelvin (0,0002 graus K), as regiões vermelhas são as áreas mais quentes no céu e as azuis mais frias. Crédito: NASA / time do WMAP

Aos 5 anos do programa WMAP (Wilkinson Microwave Anisotropy Probe) a NASA relembra as grandes descobertas que permitiram aperfeiçoamento do nosso conhecimento sobre a história do Universo. Trata-se de um tesouro de informação, que contempla, entre outras, essas três grandes descobertas:

  1. Novas evidências que um verdadeiro mar de neutrinos cósmicos, permeia o Universo (o ‘fundo cósmico de neutrinos’);
  2. Claras evidências que as primeiras estrelas levaram mais de quinhentos milhões de anos para criar um nevoeiro cósmico;
  3. A teoria da inflação cósmica (expansão do Universo durante o seu primeiro bilionésimo de segundo) foi refinada.

“Estamos a vivendo em uma época extraordinária”, exclamou Gart Hinshaw do Centro Aeroespacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland. “A nossa geração é a primeira na História da Humanidade a realizar medições tão detalhadas e em distâncias tão longínquas no Universo.”

A sonda WMAP consiste no instrumento fundamental e responsável pela medição de um dos registros fósseis remanescentes da origem do Universo – a CMB – Radiação de Microondas Cósmica de Fundo (Cosmic Microwave Background Radiation), o seu brilho mais antigo. As condições do ambiente do Universo nos tempos primordiais estão aí caracterizadas. É o resultado do que aconteceu nas origens do Cosmos e também uma pista para os desenvolvimentos posteriores do Universo. Esta radiação original perdeu energia à medida que o Universo se expandiu ao longo dos seus 13,73 bilhões de anos de vida, por isso a WMAP vê agora a luz na freqüência de micro-ondas por causa do efeito doppler (desvio para o vermelho). Ao fazer medições precisas dos padrões destas micro-ondas, a sonda WMAP respondeu as grandes e persistentes questões a respeito da idade do Universo, a sua composição e o seu desenvolvimento subseqüente.

O Universo está sendo ‘lavado’ por um ‘mar’ de neutrinos cósmicos. Estas partículas subatômicas com massa infinitesimal viajam quase à velocidade da luz. Milhões de neutrinos cósmicos passam através de nossos corpos a cada segundo, sem interação.

“[Até mesmo] um bloco de chumbo [gigantesco] do tamanho do nosso Sistema Solar não teria a capacidade, nem de perto, de parar um neutrino cósmico”, disse o membro da equipe, Eiichiro Komatsu da Universidade do Texas em Austin.

Os dados da WMAP revelam que o seu conteúdo inclui 4,6% de átomos, a matéria bariônica (convencional) da qual são feitas as estrelas e os planetas. A matéria escura compreende 23% do Universo (gráfico superior). A WMAP revelou uma diferente composição do Universo primordial, com a presença massiva dos neutrinos cósmicos, 10%, quando o Universo tinha 380.000 anos de idade (gráfico inferior). A matéria escura, diferente dos átomos, não emite nem absorve luz (não inteage com as radiações eletromagnéticas). A matéria escura apenas detectada indiretamente devido à interação gravitacional com a matéria convencional. 72% do Universo é composto por "energia escura", que atua como uma espécie de força repulsiva, 'anti-gravidade'. Esta energia, diferente da matéria escura, é responsável pela aceleração da expansão do Universo. Os dados da WMAP são precisos até dois dígitos, por isso o total destes números não dá exatamente 100%. Isto reflete os limites atuais da capacidade da WMAP de definir a matéria escura e a energia escura. Crédito: NASA/WMAP

Os dados da WMAP revelam que o seu conteúdo inclui 4,6% de átomos, a matéria bariônica (convencional) da qual são feitas as estrelas e os planetas. A matéria escura compreende 23% do Universo (gráfico superior). A WMAP revelou uma diferente composição do Universo primordial, com a presença massiva dos neutrinos cósmicos, 10%, quando o Universo tinha 380.000 anos de idade (gráfico inferior). A matéria escura, diferente dos átomos, não emite nem absorve luz (não interage com as radiações eletromagnéticas). A matéria escura tem sido apenas detectada indiretamente devido à interação gravitacional com a matéria convencional. 72% do Universo é composto por “energia escura”, que atua como uma espécie de força repulsiva, ‘anti-gravidade’. Esta energia, diferente da matéria escura, é responsável pela aceleração da expansão do Universo. Os dados da WMAP são precisos até dois dígitos, por isso o total destes números não dá exatamente 100%. Isto reflete os limites atuais da capacidade da WMAP de definir a matéria escura e a energia escura. Crédito: NASA/WMAP

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1. O Fundo Cósmico de Neutrinos

A WMAP descobriu evidências deste ‘fundo cósmico de neutrinos’ do Universo primordial. Os neutrinos tinham um papel mais relevante no início do Universo do que têm agora.

A radiação microondas de fundo medida pela WMAP quando o Universo tinha apenas 380.000 anos nos mostra que, nessa época, os neutrinos constituíam 10% do Universo, a matéria bariônica 12%, a matéria escura 63%, os fótons 15% e a energia escura era desprezível. Agora, em contraste, estimativas dos dados da WMAP mostram que o Universo atual consiste de 4,6% de matéria bariônica, 23% de matéria escura, 72% de energia escura e menos de 1% de neutrinos.

Os neutrinos cósmicos existiam em quantidade tão grande que afetaram o desenvolvimento inicial do Universo. Tal presença, por sua vez, afetou a radiação micro-ondas de fundo que a sonda WMAP observa. Os dados medidos pela WMAP sugerem (com um grau de confiança superior a 99,5%) a existência do ‘fundo cósmico de neutrinos’ – esta é a primeira vez que esta evidência foi inferida pelas micro-ondas cósmicas.

Muito do que a sonda WMAP revela sobre o Universo está associado aos padrões dos mapas celestes. Os padrões chegam oriundos das ‘ondas sonoras’ do Universo primordial. Tal como o som da corda de uma guitarra, existe uma nota primária e uma série de tons harmônicos. O terceiro som harmônico, claramente capturado agora pela sonda WMAP, aponta a evidência dos neutrinos.

O Universo jovem, muito mais quente e denso, passou por um período em que foi capaz de realizar a nucleossíntese e produziu o hélio. Teorias baseadas na quantidade de hélio medida atualmente estabelecem que uma torrente de neutrinos deveria estar presente quando o hélio foi produzido pela primeira vez nos primeiros instantes do Universo. Os novos dados coletados pela sonda anisotrópica WMAP estão em consonância com esta tese, que está coerente com as medições precisas das propriedades dos neutrinos, realizadas por experimentos utilizando colisores de partículas.

2. As Primeiras Estrelas e o Nevoeiro Cósmico

Outro avanço científico notável, deduzido pelo levantamento da WMAP, consiste na clara evidência que as primeiras estrelas (População III) levaram mais de 500 milhões de anos para criar o ‘Nevoeiro Cósmico’. Os dados providenciam novas revelações cruciais sobre o fim da “Idade Negra”, quando a primeira geração de estrelas começou a brilhar. O brilho destas estrelas criou um fino nevoeiro de elétrons no gás em volta que espalha as micro-ondas, tal como o nevoeiro espalha os raios de luz dos faróis de um carro.

“Temos agora evidências que a criação deste ‘nevoeiro’ foi um processo lento que se iniciou quando o Universo tinha cerca de 400 milhões de anos de idade e o processo[de formação do nevoeiro cósmico] levou mais 500 milhões de anos [ para se completar]”, disse Joanna Dunkley, da Universidade de Oxford no Reino Unido e também da Universidade de Princeton, integrante da equipe da WMAP. “Estas medições são atualmente possíveis apenas com a WMAP”, Joanna confirmou.

3. A Inflação Cósmica

A terceira grande descoberta do levantamento realizado pela WMAP impõe duras restrições na extraordinária expansão de crescimento no primeiro bilionésimo de segundo do Universo, um evento chamado de ‘era da inflação’, quando as ondulações no tecido do espaço-tempo foram criadas. Algumas versões da teoria da inflação foram eliminadas agora, em conseqüência destes novos dados. Por outro lado, outras partes da teoria do Universo Inflacionário ganharam maior sustentação.

“Os novos dados da WMAP eliminam muitas das idéias antigas que procuravam descrever a rápida expansão do Universo primordial”, disse o investigador principal da WMAP, Charles Bennett, da Universidade Johns Hopkins em Baltimore, Maryland. “É surpreendente que as previsões dos eventos nos primeiros momentos do Universo possam agora ser confrontadas contra sólidas medições”.

Os dados de cinco anos da WMAP foram publicados em uma série de sete artigos científicos, submetidos ao Astrophysical Journal.

Antes do anúncio sobre este levantamento de 5 anos, a WMAP já tinha feito um par de notáveis descobertas. Em 2003, as medições da WMAP determinaram a existência de uma grande quantidade presente de energia escura no Universo apagou as dúvidas que havia sobre a própria existência da energia escura. Também foi em 2003 que a WMAP refinou a idade do Universo, avaliando-a em 13,7 bilhões de anos, mas este cálculo agora foi novamente atualizado, vejamos a seguir:

E sobre a idade do Universo, o que mudou?

SIM, tivemos um progresso aqui! A sonda Wilkinson Microwave Anisotropy Probe (WMAP) refinou as medidas da idade do Universo, aumentando a sua precisão. De acordo com observações extremamente precisas da radiação de fundo de microondas (CMB) em todo o céu os cientistas do time da WMAP chegaram aos 4 dígitos de precisão: a idade do Universo é 13,73 bilhões de anos ± 120 milhões de anos. Tal significa uma margem de erro de apenas 0,874%… nada mal! (o número anterior era 13,7 bilhões de anos ± 200 milhões de anos e a margem de erro era igual a 1,46%).

Diagrama que mostra onde fica o ponto de Lagrange L2, a 1,5 milhões de quilômetros da Terra onde reside a sonda WMAP.

Diagrama que mostra onde fica o ponto de Lagrange L2, a 1,5 milhões de quilômetros da Terra onde reside a sonda WMAP.

A sonda WMAP orbita o Sol desde 2001 e reside no segundo ponto de Lagrange (L2). O ponto L2 está localizado a cerca de 1,5 milhões de quilômetros da Terra no lado noturno, isto é, WMAP está sempre na sombra da Terra em relação ao Sol. As principais razões de se colocar este equipamento tão sensível nesta posição são:

  • A natureza estável do ponto L2, devido ao alinhamento gravitacional em relação tanto à Terra quanto ao Sol;
  • A ausência da interferência eletromagnética do Sol, beneficiando os resultados das medidas cósmicas da WMAP.

Olhando constantemente para o espaço sideral a WMAP varre o cosmos com seu receptor de microondas super sensível, mapeando as pequenas variações da ‘temperatura’ de fundo (anisotrópica) do Universo. A WMAP tem capacidade de detectar radiação no comprimento de onda de 3,3 a 13,6 milímetros, que corresponde a faixa de frequências de 90 a 22 Giga Hertz. As regiões mais aquecidas e as mais frias do espaço são então mapeadas e a informação sobre a polaridade da radiação também é coletada.

A radiação de fundo de microondas (CMB – Cosmic Microwave Background Radiation) é proveniente do Universo primordial, com a idade de 380.000 anos após o Big Bang, quando se tornou transparente (deixou de ser opaco) e a radiação passou a fluir livremente pelo espaço. A temperatura do Universo naquela época era de 3.000° Kelvin (K). Nesta temperatura cósmica, a existência de átomos neutros de hidrogênio era viável, liberando fótons pelo espaço. São justamente estes fótons que o WMAP observa hoje quando o Universo apresenta uma temperatura de fundo de 2,7° K, apenas 2,7°C acima do zero absoluto, -273,15°C. O WMAP constantemente observa esta radiação cósmica, medido minúsculas alterações pontuais na temperatura e polaridade. Essas medidas são básicas para refinar nosso entendimento sobre a estrutura do Universo pós Big Bang e também nos ajudam a entender a natureza do período chamado de ‘inflação cósmica’ nos primeiros instantes da expansão universal.

Quanto mais WMAP observa o cosmos, mais ele consegue refinar as medições, foi assim que após 5 anos de observações chegou-se ao valor atual da idade do Universo (13,73 ± 0,12 bilhões de anos / precisão = 0,874%) desde o Big Bang.

Charles L. Bennett, professor de Física e Astronomia na Johns Hopkins University, afirmou:

Tudo está se ajustando e nos dando melhores valores e precisão todo o tempo. […] Os valores são sempre efetivamente mais significativos que os resultados anteriores. Há mais riqueza em todos os tipo de dados.

Estas são noticias empolgantes para os cosmologistas uma vez que as teorias sobre o instante inicial do Universo continuam a evoluir cada vez mais.

Para saber mais sobre o Big Bang e as origens do Cosmos recomendamos fortemente a leitura do excelente artigo de Hubert Reeves:

Os Primeiros Momentos do nosso Universo

Fontes e referências:

Novo modelo cosmológico tenta dar novas pistas sobre o Big-Bang e o Universo inflacionário

NASA/WMAP (Wilkinson Microwave Anisotropy Probe):  As 10 maiores descobertas do WMAP

NASA: WMAP Reveals Neutrinos, End of Dark Ages, First Second of Universe

Universe Today:

Universidade de Princeton:  Satellite reveals treasure trove of data, including evidence for early universe neutrinos

Science Daily: NASA Probe Finds Sea Of Cosmic Neutrinos, New Evidence Of Early Universe

WMAP: NASA

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  1. […] 5 anos do WMAP revelaram três grandes segredos do Universo: os neutrinos primordiais, o fim da idad… […]

  2. […] Os pesquisadores do Instituto Kavli para Astrofísica de Partículas e Cosmologia (KIPAC) no SLAC National Accelerator Laboratory do Departamento de Energia dos Estados Unidos e da Universidade de Stanford, a Universidade de Bonn  e outras instituições dos Estados Unidos e Alemanha, publicaram os resultados da pesquisa na edição de 1 de março do The Astrophysical Journal. Os pesquisadores usaram os dados coletados pelo Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA e mostraram maior precisão proporcionada pela combinação com os dados da sonda Wilkinson Anisotrópica de Microondas (WMAP). […]

  3. […] no início do Cosmos. As sobras da luz primordial do Big Bang, a radiação de microondas de fundo, esfriaram para apenas 2,7º C acima do zero absoluto, -273,15º C, mas ainda retém a mesma polarização que apresentava no início do Universo, há 13,7 bilhões […]

  4. […] de ionização parecia tão baixo, o que constitui uma contradição com os cálculos do time do satélite WMAP da NASA. Concluímos que a re-ionização começou não além de 600 milhões de anos após o Big Bang”, […]

  5. […] no início do Cosmos. As sobras da luz primordial do Big Bang, a radiação de microondas de fundo, esfriaram para apenas 2,7º C acima do zero absoluto, -273,15º C, mas ainda retém a mesma polarização que apresentava no início do Universo, há 13,7 bilhões […]

  6. […] de ionização parecia tão baixo, o que constitui uma contradição com os cálculos do time do satélite WMAP da NASA. Concluímos que a re-ionização começou não além de 600 milhões de anos após o Big Bang”, […]

    • Blog de Astronomia do astroPT » Experimento QUaD: os cosmologistas descobrem mais evidências para a Matéria Escura em 05/11/2009 às 10:34

    […] no início do Cosmos. As sobras da luz primordial do Big Bang, a radiação de microondas de fundo, esfriaram para apenas 2,7º C acima do zero absoluto, -273,15º C, mas ainda retém a mesma polarização que apresentava no início do Universo, há 13,7 bilhões […]

  7. […] A idade do Universo foi recalculada com maior precisão em 2008 através da sonda WMAP: 13,73±0,12 bilhões de anos. A título de simplificação nós aqui […]

  8. […] z = 6,43). Isto indica que se trata de um objeto bem jovem tendo em mente que o Universo surgiu há 13,73 ± 0,12 bilhões de anos e trás implicações para a teoria da formação das galáxias. O cientista Tomotsugu Goto […]

  9. […] 5 anos do WMAP revelaram três grandes segredos do Universo: os neutrinos primordiais, o fim da idad… […]

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