ESO: O instrumento MUSE completa o mais profundo rastreamento espectroscópico executado até hoje

Dez artigos científicos exploram as profundezas por mapear do Campo Ultra Profundo

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Esta imagem a cores mostra a região do Campo Ultra Profundo do Hubble, uma região minúscula mas muito bem estudada na constelação da Fornalha, observada pelo instrumento MUSE montado no Very Large Telescope do ESO. No entanto, esta imagem dá apenas uma visão muito parcial da riqueza dos dados do MUSE, os quais fornecem também um espectro para cada pixel da imagem. Este conjunto de dados permitiu aos astrônomos não apenas medir distâncias para muito mais destas galáxias do que antes — um total de 1600 — mas também descobrir muito mais sobre cada uma delas. Surpreendentemente, foram descobertas 72 novas galáxias que não tinham sido anteriormente descobertas pelo Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA. Créditos: ESO/MUSE HUDF collaboration

Com o auxílio do instrumento MUSE montado no Very Large Telescope do ESO no Chile, astrônomos efetuaram o rastreamento espectroscópico mais profundo realizado até à hoje. Os pesquisadores focaram-se no Campo Ultra Profundo do Hubble, medindo distâncias e propriedades de 1600 galáxias muito fracas, incluindo 72 galáxias que nunca tinham sido detectadas antes, nem mesmo com o próprio Hubble. Este conjunto de dados inovador deu já origem a dez artigos científicos, que estão sendo publicados em um número especial da revista Astronomy & Astrophysics. Esta enorme quantidade de novos dados fornece aos astrônomos informações sobre a formação estelar no Universo primordial, permitindo o estudo dos movimentos e outras propriedades das galáxias primitivas — possível graças às capacidades espectroscópicas únicas do MUSE.

A equipe do Rastreamento MUSE HUDF, liderada por Roland Bacon da Universidade de Lyon (CRAL, CNRS), França, utilizou o instrumento MUSE (Multi Unit Spectroscopic Explorer) para observar o Campo Ultra Profundo do Hubble (Hubble Ultra Deep Field — HUDF — heic0406), uma região do céu na constelação austral da Fornalha bastante estudada. Obtiveram-se assim as observações espectroscópicas mais profundas até hoje; foram medidas informações espectroscópicas precisas para 1600 galáxias, o que corresponde a dez vezes o número de galáxias que se tinham conseguido medir neste campo durante a última década, com telescópios colocados no solo.

As imagens HUDF originais, publicadas em 2004, são observações de campo profundo obtidas com o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA. Eram as mais profundas obtidas até então e revelaram uma enorme quantidade de galáxias, observadas quando o Universo tinha menos de um bilhão de anos. A região foi subsequentemente observada muitas vezes, tanto com o Hubble como com outros telescópios, resultando na imagem mais profunda do Universo obtida até então [1]. Agora, e apesar da profundidade das observações Hubble, o MUSE conseguiu — entre muitos outros resultados — revelar 72 galáxias nunca antes observadas nesta minúscula área do céu.

Roland Bacon explicou:

O MUSE consegue fazer algo que o Hubble não é capaz — separa a luz vinda de cada ponto da imagem nas suas componentes de cor, criando um espectro. Isso permite medir distâncias, cores e outras propriedades de todas as galáxias que observamos — incluindo algumas invisíveis ao próprio Hubble!

Os dados MUSE dão uma nova visão de galáxias muitos distantes e fracas, observadas próximo do início do Universo, há cerca de 13 bilhões de anos. Este instrumento detectou galáxias 100 vezes mais fracas do que os rastreamentos anteriores, acrescentando assim a um campo observado já muito rico e aprofundando o nosso conhecimento das galáxias ao longo dos tempos.

O rastreamento descobriu 72 candidatas a galáxias do tipo Lyman-alfa, objetos que emitem apenas em radiação Lyman-alfa [2]. A nossa compreensão atual da formação estelar não explica completamente este tipo de galáxias, que parecem apenas brilhar intensamente nesta cor. Uma vez que o MUSE dispersa a luz nas suas componentes de cor, estes objetos tornam-se aparentes, mas permanecem invisíveis em imagens diretas profundas, como é o caso das do Hubble.

Jarle Brinchmann, autor principal de um dos artigos científicos que descreve os resultados deste rastreamento, da Universidade de Leiden, na Holanda, e do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, Porto, Portugal, esclareceu:

O MUSE tem a capacidade única de extrair informação sobre algumas das galáxias mais precoces do Universo — mesmo numa região do céu já tão bem estudada. Usando espectroscopia podemos aprender mais sobre estas galáxias, tais como o seu conteúdo químico e movimentos internos — não para cada galáxia de sua vez, mas para todas as galáxias ao mesmo tempo!

Outro resultado importante deste estudo foi a detecção sistemática de halos de hidrogênio luminoso em torno de galáxias do Universo primordial, o que dá aos astrônomos uma nova maneira promissora de estudar como é que o material flui para dentro e para fora das galáxias primitivas.

Em uma vasta série de artigos científicos são exploradas muitas outras aplicações potenciais desta base de dados, incluindo o papel de galáxias tênues durante a reionização cósmica, taxas de fusão de galáxias quando o Universo era jovem, ventos galácticos, formação estelar e mapeamento dos movimentos das estrelas no Universo primordial.

Roland Bacon concluiu [3]:

Notavelmente, estes dados foram todos obtidos sem o uso do recente melhoramento do MUSE relativo à Infraestrutura de Óptica Adaptativa. A ativação desta infraestrutura, após uma década de trabalho intenso por parte dos astrônomos e engenheiros do ESO, promete dados ainda mais revolucionários no futuro.

Notas

[1] O Campo Ultra Profundo do Hubble é uma das áreas do céu mais estudadas. Até agora, 13 instrumentos montados em 8 telescópios, incluindo o ALMA, do qual o ESO é parceiro, observaram este campo, desde os raios-X às ondas de rádio. Leia: ALMA explora o Campo Ultra Profundo do Hubble e fornece as observações milimétricas mais profundas obtidas até hoje do Universo primordial

[2] Os elétrons carregados negativamente que orbitam os núcleos carregados positivamente de um átomo, têm níveis de energia quantificados. Isto significa que apenas podem existir em estados de energia específicos e apenas podem transitar entre estes estados ganhando ou perdendo quantidades precisas de energia. A radiação de Lyman-alfa é produzida quando elétrons nos átomos de hidrogênio decaem do segundo nível de energia mais baixa para o primeiro nível de energia mais baixa. Esta quantidade de energia precisa que se perde, é libertada sob a forma de radiação com um comprimento de onda particular na região ultravioleta do espectro eletromagnético, a qual é detectada pelos astrônomos com telescópios no espaço, ou no solo, no caso de se tratarem de objetos que apresentam desvios para o vermelho. Para estes dados, com desvios para o vermelho entre 3 e 6,6, a radiação de Lyman-alfa é observada na luz visível ou infravermelha próxima.

[3] A Infraestrutura de Óptica Adaptativa com o MUSE revelou já anéis em torno da nebulosa planetária IC 4406, estruturas nunca antes observadas. Leia: Infraestrutura de Ótica Adaptativa de vanguarda: ESO revela uma enorme melhoria na nitidez das imagens do MUSE.

Fonte

ESO: eso1738 — MUSE Probes Uncharted Depths of Hubble Ultra Deep Field

Artigos científicos

Este trabalho foi descrito na série de 10 artigos científicos publicados na revista especializada Astronomy & Astrophysics. Para conhecê-los:

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