A Formação de Anéis Planetários e Pistas sobre o Último Grande Bombardeamento

http://www.kobe-u.ac.jp/en/NEWS/research/2016_10_31_01.html

À esquerda: imagem dos anéis de Saturno capturada pela sonda Cassini; à direita: imagem dos anéis de Urano, obtida pelo Telescópio Hubble. Créditos: NASA/JPL/SSI; NASA/JPL/STScI. Links para as imagens: http://photojournal.jpl.nasa.gov/catalog/PIA06077 e http://photojournal.jpl.nasa.gov/catalog/PIA02963

Um time de cientistas apresentou um novo modelo visando explicar a origem dos anéis de Saturno baseando-se em resultados de simulações computacionais. Os resultados das simulações são também aplicáveis aos anéis de outros planetas gigantes e explicam as diferenças entre as estruturas e composições dos anéis de Saturno e Urano.

Todos os quatro planetas gigantes residentes em nosso Sistema Solar têm sistemas anéis muito diversificados. As observações mostram que os anéis de Saturno são formados por mais de 95% de partículas geladas, enquanto os anéis de Urano e Netuno são bem mais escuros, o que são indícios de que podem abrigar um maior conteúdo rochoso em sua composição.

Desde quando os anéis de Saturno foram vistos pela primeira vez no século XVII, a investigação dos seus anéis se desenvolveu através do uso de telescópios terrestres, observatórios espaciais e até de espaçonaves como as Voyager 1 e 2, além da sonda robótica Cassini. No entanto, a origem dos anéis ainda não era clara e os mecanismos que levaram a criação dos diversos sistemas de anéis permaneciam desconhecidos.

Agora, um recente estudo focou-se no período chamado “Último Grande Bombardeamento” ou “Intenso Bombardeio Tardio” (Late Heavy Bombardment) [1] que se estima ter ocorrido há 4 bilhões de anos em nosso Sistema Solar, quando os planetas gigantes sofreram uma migração orbital. Os cientistas julgam que existiam vários milhares de objetos do tamanho de Plutão (um-quinto do tamanho da Terra) oriundos do Cinturão de Kuiper, além da órbita de Netuno. Primeiro, os cientistas calcularam a probabilidade destes objetos passarem perto o suficiente dos planetas gigantes para serem destruídos pelas forças de maré durante o “Último Grande Bombardeamento”. Os resultados da simulação sugerem que Saturno, Urano e Netuno tiveram encontros próximos com estes corpos celestes múltiplas vezes.

http://www.kobe-u.ac.jp/images/en/NEWS/research/2016_10_31_01-2.jpg

Diagrama esquemático do processo de formação de anéis. As linhas pontilhadas mostram a distância na qual a gravidade dos planetas gigantes é suficientemente forte para que ocorra a ruptura de marés. (a) Quando os objetos do Cinturão de Kuiper têm encontros próximos com os planetas gigantes, são destruídos pelas forças de maré. (b) Como resultado da fragmentação de maré, alguns fragmentos são capturados para órbitas em redor do planeta. (c) As colisões repetidas provocam a quebra dos fragmentos capturados, a sua órbita torna-se gradualmente mais circular e então se formam os anéis atuais. Créditos: Hyodo, Charnoz, Ohtsuki, Genda 2016, Icarus

O time de cientistas usou simulações computacionais para investigar a perturbação destes objetos do Cinturão de Kuiper pelas forças de maré quando passaram pela vizinhança dos planetas gigantes (ver a figura a). Os resultados das simulações variam dependendo das condições iniciais, como a rotação dos objetos em passagem e da sua aproximação mínima ao planeta. No entanto, descobriram que, em muitos casos, os fragmentos entre 0,1% e 10% da massa inicial dos objetos passageiros foram capturados em órbitas em redor do planeta (figuras a, b). Descobriu-se que a massa combinada destes fragmentos capturados é suficiente para explicar a massa dos anéis ao redor de Saturno e Urano. Em outras palavras, estes anéis planetários foram formados quando objetos suficientemente grandes passaram muito perto dos planetas gigantes e foram fragmentados pelas forças de maré.

Os pesquisadores também simularam a evolução a longo prazo dos fragmentos capturados, usando os supercomputadores do NAOJ (National Astronomical Observatory of Japan – Observatório Astronômico Nacional do Japão). A partir destas simulações, o time descobriu que os fragmentos capturados com um tamanho inicial de vários quilômetros devem ter sofrido repetidas colisões sob alta-velocidade e gradualmente ter sido pulverizados em pedaços da ordem de centímetros a metros, do tipo que observamos nos anéis de Saturno. Estas colisões entre fragmentos também teriam circularizado suas órbitas e eventualmente levaram à formação dos anéis observados atualmente (figuras b e c).

Este modelo também ajuda a explicar as diferenças na composição entre os anéis de Saturno e de Urano. Em comparação com Saturno, Urano [e também Netuno] têm uma maior densidade (a densidade média de Urano é 1,27 g/cm3 e a de Netuno é 1,64 g/cm3, enquanto a de Saturno é de apenas 0,69 g/cm3). Isto significa que nos casos de Urano e Netuno, os objetos que passam muito perto da sua vizinhança devem sofrer forças de maré extremamente fortes. Por outro lado, Saturno tem uma densidade mais baixa e uma maior relação diâmetro-massa e dessa forma se os objetos passam demasiadamente perto de Saturno, acabam por colidir com o próprio planeta. Como resultado do modelo, supondo-se que os objetos do Cinturão de Kuiper possuam estruturas em camadas (um núcleo rochoso coberto por um manto gelado), ao passar muito perto de Urano e Netuno, tanto o manto gelado quanto o núcleo rochoso seriam destruídos e capturados, formando os anéis. Isto explica as distintas composições dos anéis observadas entre os planetas gigantes gasosos.

Este novo modelo demonstra que os anéis dos quatro planetas gigantes gasosos são subprodutos naturais do processo de formação planetária inerente ao nosso Sistema Solar. Isto implica que os exoplanetas gigantes descobertos em redor de outras estrelas têm, provavelmente, anéis formados por um processo semelhante. Recentemente foi noticiada a descoberta de um sistema de anéis em torno de um exoplaneta e as descobertas adicionais de anéis e satélites ao redor de exoplanetas irá elevar nosso entendimento sobre sua origem.

Os estudos foram relatados em 6 de outubro de 2016, no artigo intitulado “Ring Formation around Giant Planets by Tidal Disruption of a Single Passing Large Kuiper Belt Object”, assinado por Ryuki Hyodo et al. e publicado na Icarus.

Nota

[1] O “Último Grande Bombardeamento” ou “Intenso Bombardeio Tardio” (Late Heavy Bombardment) foi um período de instabilidade orbital que ocorreu em nosso Sistema Solar há cerca de 4 bilhões de anos. Os cientistas estimam que durante essa era havia uma grande quantidade de corpos menores que não haviam sido incorporados aos planetas e residiam além da órbita de Netuno. Como resultado de interações gravitacionais com os planetas gigantes, as órbitas desses objetos menores tornaram-se instáveis e muitos deles decaíram para órbitas mais internas do Sistema Solar acabando por colidir com os planetas já formados. Pensa-se que a grande maioria das crateras de grande porte na superfície da Lua foram forjadas nesse turbulento período da história do Sistema Solar.

Fontes

Kobe: Mystery solved behind birth of Saturn’s rings

Centauri Dreams: Ring Formation: Clues from the Late Heavy Bombardment

Artigo Científico

Icarus: Ring Formation around Giant Planets by Tidal Disruption of a Single Passing Large Kuiper Belt Object

._._.

1609-02396v1-ring-formation-around-giant-planets-by-tidal-disruption-of-a-single-passing-large-kuiper-belt-object

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

error: Esse blog é protegido!