Um Grande Filtro para a Vida no Cosmos? Ou: os Alienígenas estão Silenciosos porque estão Mortos!

http://online.liebertpub.com/doi/abs/10.1089/ast.2015.1387?journalCode=ast

Diagrama dos mecanismos de feedback abióticos primordiais: durante os primeiros bilhões de anos após a formação da Terra (ou de exoplanetas como a Terra), feedbacks positivos abióticos (à esquerda) podem levar a temperaturas de superfície em fuga descontrolada para fora da faixa habitável (ambos muito quente e muito frio). Estes feedbacks positivos levam à perda de água líquida, quer a partir de fuga das moléculas de hidrogênio para o espaço ou pela condensação em gelo. Os feedbacks negativos abióticos (à direita) foram invocados para estabilizar as temperaturas da superfície, mas eles podem não ser significativos no primeiro bilhão de anos, portanto, foram desenhados linhas tracejadas e pontos de interrogação. Quando a vida evolui, pode fortalecer ou enfraquecer estes loops de feedback geoquímico inicialmente abióticos e transformá-los em ciclos biogeoquímicos e loops de feedback. A vida evoluída pode se inserir dentro desses feedbacks nos pontos marcados A, B, C e D. Créditos: Aditya Chopra e Charley Lineweaver / ANU.

Como eliminar as chances de sobrevivência da nossa espécie? O filósofo Nick Bostrom (Universidade de Oxford) lançou questões sobre a extinção humana em termos de um assim chamado “Grande Filtro”. Esse filtro é aquele que nos dá um vislumbre da evolução do Universo. Sob o ponto de vista de Bostrom, ao que tudo indica, há um processo que mantém a galáxia longe de ser positivamente preenchida com civilizações. Em algum lugar ‘ao longo da estrada’ entre a matéria inerte e a inteligência transcendente deve haver um ‘grande filtro’ que extermina a vasta maioria das formas de vida, mantendo baixa a população da galáxia e oferecendo-nos uma maneira de avaliar as nossas próprias chances de sobrevivência futura.

Vamos pensar nisso desta maneira… Talvez o ‘grande filtro’ tenha a ver propriamente com a formação da vida em si. Se este for o caso, então já superamos o filtro e afortunadamente poderemos ir avante para explorar o Universo. Mas se o ‘grande filtro’ está no nosso futuro, então não temos como saber exatamente o que vai acontecer e nem podemos saber se vamos ou não sobreviver. Assim, o termo final da famosa equação de Frank Drake vem à nossa mente, o fator que especifica o tempo de vida estimado das civilizações tecnológicas. Talvez o ‘grande filtro’ tenha a ver com a própria tecnologia atuando de forma destruidora. Nesse caso, o filtro pode significar a nossa própria desgraça. Para saber mais sobre ideias de Bostrom, consulte Bostrom: From Extinction to Transcendence.

Agora, uma visão sinistra, alguns poderão dizer, vem a nós através dos cientistas Aditya Chopra e Charles Lineweaver (Australian National University), em um novo artigo sugerindo um tipo diferente de ‘grande filtro’. Os autores chamam o processo de “Gargalo de Gaia” e é um filtro pelo qual a vida na Terra já passou (felizmente). O cenário sugere que a vida é frágil o suficiente para que raramente se desenvolva gerando a inteligência.

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Dr. Aditya Chopra – crédito Stuart Hay / ANU

O motivo?

Os ambientes planetários jovens são relativamente instáveis. A vida que de fato emerge precisa encontrar maneiras de regular globalmente os gases de efeito estufa, como a água e o dióxido de carbono para manter as temperaturas da superfície do seu ecossistema na escala do habitável. Normalmente pensamos na diminuição do bombardeio da entrada de detritos do Sistema Solar voltando no tempo desde os 4,5 bilhões de anos e que se estende até cerca de 3,8 bilhões de anos atrás como sendo uma chave que tornou a Terra mais adequada para a vida, mas o “Gargalo de Gaia” vê o início da vida como estando sob forte pressão de seleção para modificar e regular o seu próprio ambiente. O artigo científico descreve:

… taxas de bombardeio inevitavelmente diminuem nas zonas habitáveis em volta das estrelas (CHZs – circumstellar habitable zones), mas os prazos para a evolução da “regulação de Gaia” são provavelmente imprevisíveis e não iriam inevitavelmente evoluir rapidamente (ou nunca). Assim, se há algo especial sobre o que aconteceu na Terra para permitir a persistência da vida aqui, esse fator pode ter menos a ver com a taxa decrescente de bombardeio no éon Hadeano [1], ou com ingredientes químicos especiais, ou com fontes de energia livre, ou até mesmo com uma receita rara para o surgimento de vida. A existência da vida na Terra hoje pode ter mais a ver com a evolução biológica extraordinariamente rápida na construção de um nicho eficaz e com o mecanismo de “regulação de Gaia” nos primeiros bilhões de anos. Então, a habitabilidade e as zonas habitáveis não seriam somente propriedades abióticas passivas estelar e planetária de física e química (tais como luminosidade estelar, teor da água inicial e diminuição da taxa de bombardeio), mas seriam também um resultado da capacidade inicial da vida de influenciar nos ciclos da geoquímica planetária inicialmente abiótica e transformá-los em ciclos biogeoquímicos mediados pela vida que nos é familiar na Terra atual …

Neste ponto de vista, nós já passamos pelo filtro e encontramo-nos numa posição não compartilhada pelos demais planetas do Sistema Solar. É concebível que Marte e Vênus tenham sido eventualmente férteis, cerca de um bilhão de anos após a sua formação, mas, Vênus se transformou em inferno que é hoje e Marte entrou em um congelamento profundo. Chopra e Lineweaver argumentam que se porventura houve vida microbiana no início de cada um desses dois mundos, esta foi incapaz de estabilizar seu ambiente, ao passo que na Terra, a vida desempenhou um papel ativo para fazer exatamente isso.

Assim, podemos olhar sem surpresa para nossa galáxia onde rochosos mundos da classe terrestre são comuns, mesmo quando a vida em si não o é. A extinção precoce torna-se um fenômeno quase universal:

Nós argumentamos que os ambientes de superfície habitável de planetas rochosos geralmente tornam-se inabitáveis devido aos mecanismos positivos de fuga abióticos de feedback que envolvem a temperatura da superfície, albedo e a perda de gases voláteis atmosféricos. Por causa da força, rapidez e universalidade dos feedbacks positivos abióticos nas atmosferas de planetas rochosos em CHZs [zonas habitáveis] tradicionais, o feedback negativo biótico ou a “Regulação de Gaia” podem ser necessários para manter a habitabilidade.

Afinal, o que é que vamos encontrar nos exoplanetas orbitando as estrelas próximas? Não serão antigas ruínas de civilizações avançadas que há muito tempo se autodestruíram, mas sim os restos fossilizados de vida microbiana extinta. Não espere encontrar destroços de cidades, mas sim restos longínquos de vida simples que falharam na sua missão de fazer o seu próprio exoplaneta um lugar onde as formas mais complicadas poderiam se desenvolver. Estaríamos vivendo em um Universo onde quase toda a vida é jovem, microbiana ou extinta.

Chopra e Lineweaver analisaram uma diversidade de maneiras pelas quais seus argumentos poderiam ser desafiados. Se por exemplo a “Regulação de Gaia” é uma chave para fazer de um novo planeta um lugar onde a vida pode sobreviver, por que deveria ser necessariamente rara? Além disso, a “Regulação de Gaia” é geralmente considerada como a partir do período Proterozóico, cerca de 2,5 bilhões de anos após a formação do planeta. Invocando uma “Regulação de Gaia” pré-Proterozóica é, no mínimo, ainda mais controversa. Além disso, o estudo observa que o feedback negativo abiótico sobre o ciclo de carbonato-silicato poderia ter estabilizado temperaturas da superfície da Terra sem qualquer recurso à “Regulação de Gaia”. Outras objeções potenciais também são ponderadas.

No entanto, sabendo quantas imponderabilidades estão lidando, os autores sugerem enfim uma sequência de eventos a seguir, que consideram ‘potencialmente universal’, acerca de jovens exoplanetas com água na superfície:

1) Nos primeiros 0,5 bilhões de anos: quente, elevado bombardeamento, inabitável.

2.1) De 0,5 até 1,0 bilhões de anos: mais frio, bombardeamento reduzido, perda de gases voláteis.

2.2) De 0,5 até 1,0 bilhões de anos: Emerge a vida em um ambiente com a tendência de evoluir para fora das características que favorecem a habitabilidade.

3) De 1,0 até 1,5 bilhões de anos, duas alternativas se apresentam:

3.1) Inabilidade de manter a habitabilidade, seguida por extinções;

3.2) Como uma rara alternativa (que aconteceu na Terra) nesse período se desenvolve a “Regulação de Gaia” e manutenção da habitabilidade, seguida pela persistência da vida por mais alguns bilhões de anos.

Além disso, a hipótese do “Gargalo de Gaia” é uma plausível solução do paradoxo de Fermi e um reforço da “Hipótese da Terra Rara“.

Professor Lineweaver concluiu:

Uma intrigante previsão do modelo do “Gargalo de Gaia” prevê que a grande maioria dos fósseis no Universo serão de extintas vidas microbianas e não de espécies multicelulares ou complexas tais como dinossauros ou mamíferos, os quais levam bilhões de anos para evoluir.

O artigo assinado por Chopra e Lineweaver, intitulado “The Case for a Gaian Bottleneck: The Biology of Habitability” foi publicado em Astrobiology 16(1) (Janeiro 2016), páginas 7-22.

Nota

[1] Éon Hadeano

Na escala de tempo geológico, o Hadeano é o éon mais antigo que começou há cerca de 4,57 bilhões de anos, com o princípio do processo de formação dos planetas do Sistema Solar, e terminou na Terra há aproximadamente 3,85 bilhões de anos, quando surgiram as primeiras rochas que hoje observamos, marcando o início do éon Arqueano.

O nome “Hadeano” vem do grego hades, que significa “inferno”. O termo foi cunhado pelo geólogo Preston Cloud para o período sobre o qual temos pouca ou nenhuma informação geológica.

Fontes

Centauri Dreams: A New Filter for Life’s Survival

Phys.org: The aliens are silent because they’re dead

Artigo Científico

The Case for a Gaian Bottleneck: The Biology of Habitability

._._.

Chopra-Lineweaver-2016-The-Case-for-a-Gaian-Bottleneck-The-Biology-of-Habitability

1 comentário

    • jo guerreiro em 04/04/2016 às 22:10
    • Responder

    Acho que esta teoria está no caminho certo, porém ainda na forma embrionária , muito caminho e estudo há a percorrer até que saibamos explicar a evolução da vida nos planetas. Todavia, segundo esta teoria, será possível colonizarmos planetas que estejam na fase inicial enviando para lá as formas de vida mais simples que aqui existem as quais deverão ser capazes de regular os planetas de modo a permitir a introdução das formas de vida mais complexas que habitam a Terra.

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