‘Órbitas circulares para exoplanetas pequenos’ é uma regra?

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O sistema compacto Kepler 444 é o lar de cinco exoplanetas pequenos em órbitas muito próximas da sua estrela. Os exoplanetas foram detectados através da diminuição de brilho que ocorrem quando transitam o disco da estrela, como ilustrado nesta impressão artística . Créditos: Tiago Campante & Peter Devine

Se olharmos de cima do disco do nosso Sistema Solar, as órbitas dos planetas em volta do Sol lembram anéis em volta do centro de um alvo. Cada planeta, incluindo a Terra, se desloca através de um percurso quase circular, mantendo em todo o tempo quase sempre a mesma distância do Sol.

Ao longo das décadas, os astrônomos têm tentado entender se as órbitas circulares do Sistema Solar são verdadeiramente raras no Universo. Agora, uma nova análise sugere que tal regularidade orbital é, de fato, a norma geral, pelo menos para os sistemas com exoplanetas pequenos quanto a Terra.

Em artigo publicado na revista The Astrophysical Journal, pesquisadores do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e da universidade de Aarhus na Dinamarca relataram que 74 exoplanetas, localizados a centenas de anos-luz de distância, orbitam as suas estrelas hospedeiras em padrões circulares, tal como os planetas do nosso Sistema Solar.

Estes 74 exoplanetas, os quais orbitam 28 estrelas, são aproximadamente do tamanho da Terra e as suas trajetórias circulares contrastam fortemente com aquelas de exoplanetas mais massivos, alguns dos quais orbitam extremamente perto das suas estrelas antes de serem arremessados para longe em órbitas altamente excêntricas e alongadas.

Vincent Van Eylen, estudante do Departamento de Física do MIT, afirmou:

Há vinte anos atrás, só conhecíamos o nosso Sistema Solar, tudo era circular e assim todos esperavam órbitas circulares em toda a parte. Depois que começamos a encontrar estes exoplanetas gigantes e descobrimos, subitamente, uma grande variedade de excentricidades, por isso a questão de saber se isto também era válido para exoplanetas menores ficou em aberto. Agora, nós descobrimos que para exoplanetas pequenos, a órbita circular é provavelmente a norma geral.

Em última análise, Van Eylen disse que estas são boas notícias no que tange à procura por vida em exoplanetas. Para um exoplaneta ser habitável, entre outros requisitos, terá que ser aproximadamente do mesmo tamanho que a Terra, pequeno e compacto o suficiente para ser rochoso e não ser gasoso. Se um exoplaneta pequeno também mantiver uma órbita circular, será mais favorável à vida, pois pode suportar um clima estável durante todo o ano (em contrapartida, um exoplaneta com uma órbita mais excêntrica pode passar por várias oscilações dramáticas no clima, quando está mais perto da estrela e quando está mais longe).

Van Eylen explicou:

Se as órbitas excêntricas fossem comuns para os exoplanetas habitáveis, tal fato seria uma preocupação para a vida, porque exoplanetas assim acolhem uma grande gama de propriedades climáticas. Mas o que achamos é que provavelmente não precisamos de nos preocupar assim tanto uma vez que as órbitas circulares parecem ser bastante comuns.

Números estelares cruzados

No passado, os astrônomos calcularam as excentricidades orbitais de exoplanetas grandes e gasosos usando a velocidade radial, uma técnica que mede o movimento da estrela influenciado pela presença do exoplaneta. Se um exoplaneta orbita uma estrela, a sua força gravitacional puxa a estrela, fazendo com que se mova em um padrão que reflete a órbita do exoplaneta. No entanto, a técnica é mais bem-sucedida para exoplanetas massivos, pois exercem força gravitacional poderosa o suficiente para influenciar as suas estrelas.

Os cientistas regularmente encontram exoplanetas menores usando o método de detecção pela técnica do trânsito, no qual estudam a luz emitida por uma estrela à procura de diminuições no brilho estelar que assinalam a passagem, ou “trânsito”, de um exoplaneta em frente, momentaneamente diminuindo a sua luz. Normalmente, este método apenas assinala a existência de um exoplaneta, não exatamente o formato de sua órbita. Mas Van Eylen e o parceiro Simon Albrecht, da Universidade de Aarhus, desenvolveram uma forma de recolher informações a partir dos dados dos trânsitos exoplanetários.

Primeiro, os astrônomos pensaram que caso soubessem a massa e o raio da estrela hospedeira mãe, poderiam a seguir calcular quanto tempo um exoplaneta levaria para orbitá-la, caso a sua órbita fosse circular. A massa e o diâmetro de uma estrela determinam a sua força gravitacional, o que, por sua vez, influencia na velocidade orbital do exoplaneta em torno da sua estrela.

Ao calcular a velocidade orbital de um exoplaneta em uma órbita circular poderiam, então, estimar a duração do trânsito, ou seja, quanto tempo um exoplaneta leva para passar em frente da sua estrela. Caso o trânsito calculado coincidisse com o trânsito real, os cientistas concluiriam que a órbita do exoplaneta devia ser circular. Se o trânsito fosse mais demorado ou mais curto, a órbita deveria ser mais alongada ou excêntrica.

Nem tão excêntricas

Para obter os dados reais dos trânsitos, o time vasculhou os dados recolhidos ao longo dos últimos quatro anos do Telescópio Kepler da NASA, um observatório espacial que examinou uma área fixa do céu em busca de exoplanetas. O telescópio Kepler monitorou o brilho de mais de 145.000 estrelas por anos, sendo que apenas uma fração desse valor já foi caracterizada em detalhe.

O time decidiu se focar em 28 estrelas cuja massa e raio já tinham sido anteriormente determinados através da asterosismologia (ou sismologia estelar), uma técnica que mede as pulsações estelares e que permite o cálculo da massa e do raio de uma estrela.

Estas 28 estrelas hospedam 74 exoplanetas. Os pesquisadores usaram os dados do Kepler para cada exoplaneta, examinando não apenas a ocorrência dos trânsitos, como também sua duração. Uma vez conhecida a massa e o diâmetro das estrelas hospedeiras, o time calculou a duração de cada trânsito exoplanetário assumindo suas órbitas como circulares e posteriormente comparou os cálculos das durações estimadas com os tempos reais obtidos no banco de dados do observatório Kepler.

Em toda a amostra, Van Eylen e Albrecht descobriram que as durações calculadas e as durações reais coincidiam, sugerindo que todos os 74 exoplanetas mantinham órbitas circulares ou pouco excêntricas.

Van Eylen disse:

Descobrimos que a maioria coincidia muito bem, o que significa que estão muito perto de serem circulares. Estamos certos que se as excentricidades altas fossem comuns, nós as teríamos visto e isso não ocorreu.

Van Eylen comentou que os resultados orbitais para estes exoplanetas menores podem eventualmente ajudar a explicar a razão dos exoplanetas maiores possuírem órbitas mais extremas.

Van Eylen prosseguiu:

Nós queremos compreender porque é que alguns exoplanetas têm órbitas extremamente excêntricas, enquanto em outros casos, como o do Sistema Solar, os exoplanetas têm órbitas principalmente circulares. Esta é uma das primeiras vezes que medimos de forma confiável as excentricidades de exoplanetas menores e é emocionante ver que são diferentes dos exoplanetas gigantes, mas semelhantes as propriedades do Sistema Solar.

David Kipping, astrônomo membro do CfA (Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica), ressaltou que a amostra dos 74 exoplanetas de Van Eylen é relativamente pequena, considerando as centenas de milhares de estrelas estudadas pelo Kepler.

Kipping, que não esteve envolvido na pesquisa, confessou:

Eu acho que a evidência de exoplanetas menores terem órbitas mais circulares é atualmente provisória. Isto nos leva a investigar esta questão em mais detalhe e a ver se é realmente uma tendência universal, ou uma característica própria da pequena amostra estudada.”

Com respeito ao nosso próprio Sistema Solar, Kipping especulou que:

Com uma maior amostra de sistemas exoplanetários, podemos investigar a excentricidade em função da multiplicidade e ver se os oito planetas do Sistema Solar são típicos ou não.

Fonte

MIT News: Circular orbits identified for small exoplanets – Observations of 74 Earth-sized planets around distant stars may narrow field of habitable candidates.

Artigo Científico

Eccentricity from transit photometry: small planets in Kepler multi-planet systems have low eccentricities

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