Como pequenas erupções solares podem trazer consequências significativas aos planetas indefesos?

http://www.nasa.gov/sites/default/files/thumbnails/image/cme-at-venus-animated.gif

Uma relativamente pequena nuvem de material solar pode ser vista escapando do Sol na parte superior esquerda deste filme capturado pela sonda SOHO no dia 19 de dezembro de 2006. Esta ejeção lenta, no entanto, foi poderosa o suficiente para fazer com que Vênus, quatro dias depois, perdesse uma quantidade significativa de oxigênio da sua atmosfera. Créditos: ESA/NASA/SOHO/JHelioviewer

Embora ainda não saibamos todos os ingredientes necessários para se construir um mundo propício à vida, entendemos que a interação entre o Sol e a Terra é essencial para tornar o nosso planeta habitável, através de um equilíbrio entre uma estrela que fornece a energia necessária e um planeta resistente, com sistemas que permitem protegê-lo das mais violentas emissões solares. O nosso Sol emite constantemente energia sob a forma da luz visível e outros tipos de radiação. O Sol também produz um fluxo de partículas chamado vento solar que banha os planetas à medida que viaja pelo espaço. Além disso no Sol ocorrem ejeções de massa coronal (EMC), erupções de material solar que podem perturbar a atmosfera em torno de um planeta. Na Terra, a maior parte do efeito das EMC tem sido desviada por uma bolha magnética natural chamada magnetosfera.

Por outro lado, outros planetas (Vênus e Marte, por exemplo) não têm magnetosferas protetoras e isso pode trazer consequências catastróficas. No dia 19 de dezembro de 2006, o Sol ejetou uma pequena e lenta nuvem de material solar. Quatro dias depois, esta EMC de menor porte foi poderosa o suficiente para arrancar quantidades significativas de oxigênio da atmosfera de Vênus e enviá-las para o espaço, perdendo-se para sempre.

Aprender porque uma EMC de menor porte teve um impacto tão forte pode ter consequências profundas para entender o que torna um planeta propício à vida como a conhecemos.

Glyn Collinson, autor líder do artigo, membro do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland, EUA, indagou:

E se a Terra não possuísse uma magnetosfera protetora? Será que a magnetosfera é um pré-requisito para um planeta que sustente vida? Ainda não sabemos com certeza, mas podemos estudar estas questões ao observar planetas sem magnetosferas, como Vênus.

O trabalho de Collinson começou com dados da sonda Vênus Express da ESA, que passou a orbitar Vênus em 2006 e realizou uma missão de oito anos. Estudando dados do primeiro ano desta missão, Collinson notou que no dia 23 de dezembro de 2006, a atmosfera de Vênus perdeu oxigênio a um ritmo incrível. Ao mesmo tempo que as partículas escapavam, os dados também mostravam que algo incomum estava acontecendo ao vento solar que passava por Vênus.

Para saber mais, Collinson trabalhou com Lan Jian, uma cientista espacial do Instituto Goddard (NASA), especializada em identificar eventos no vento solar. Usando dados da Vênus Express, Jian juntou as peças para desvendar o que tinha atingido o planeta. O fenômeno parecia ser uma EMC, por isso ela analisou as observações da sonda SOHO (Solar and Heliospheric Observatory) da ESA/NASA. Os cientistas identificaram uma EMC fraca no dia 19 de dezembro de 2006, a candidata provável para o que avistaram quatro dias depois perto de Vênus. Ao medir o tempo que levou a chegar a Vênus, estabeleceram que movia-se a mais de 320 km/s, uma velocidade extremamente lenta para os padrões das EMC de grande porte, aproximadamente a mesma velocidade do próprio vento solar.

Os cientistas separam as EMC em duas grandes categorias:

  1. EMC veloz o suficiente para produzir uma onda de choque à sua frente enquanto se afastam do Sol;
  2. EMC que se move muito mais lentamente, como a ‘chegada de um nevoeiro’.

 As EMC rápidas têm sido observadas impactando outros planetas e sabemos que afetam a fuga atmosférica, mas ninguém ainda havia observado os efeitos de uma EMC lenta.

Collinson comentou:

O Sol ‘tossiu’ uma EMC aparentemente inexpressiva. Mas o planeta Vênus reagiu como se tivesse sido atingido por algo massivo. Ao que parece, tal comportamento é similar a diferença entre (1) colocar uma lagosta em água fervendo contra (2) colocá-la em água fria e ir aquecendo a água lentamente. De qualquer maneira, a lagosta estará em maus lençóis.

Semelhantemente, os efeitos da EMC pequena se acumularam ao longo do tempo (como no cenário 2 da Lagosta, descrito acima no comentário de Collinson), arrancando parte da atmosfera de Vênus e puxando-a para o espaço. Esta observação não prova que cada EMC pequena tem um efeito semelhante, mas deixa claro que este comportamento é possível. Por sua vez, isto sugere que, sem uma magnetosfera, a atmosfera de um planeta é intensamente vulnerável aos eventos meteorológicos do Sol.

Vênus é um planeta particularmente inóspito. Vênus é cerca de 10 vezes mais quente que a Terra. Além disso, Vênus possui uma atmosfera tão espessa que o máximo que uma espaçonave que lá pousou sobreviveu, na superfície, antes de ser esmagada, foi pouco mais de duas horas. Talvez estas vulnerabilidades às tempestades solares tenham contribuído para este ambiente. Independentemente disso, o entendimento exato do efeito que a falta de uma magnetosfera tem num planeta como Vênus pode ajudar-nos a perceber mais sobre a habitabilidade dos exoplanetas, que descobrimos fora do nosso Sistema Solar.

http://eternosaprendizes.com/2010/06/28/tera-sido-venus-um-planeta-habitavel/

Arco de choque de Vênus x Vento Solar

Os pesquisadores examinaram detalhadamente os seus dados para ver se poderiam determinar o mecanismo que estava ejetando a atmosfera. A EMC tinha claramente empurrado o arco de choque da atmosfera em volta de Vênus. Os cientistas também observaram ondas dentro do arco de choque 100 vezes mais poderosas do que aquelas normalmente presentes [aquelas decorrentes do vento solar].

Collinson explicou:

É similar aquilo que vemos em frente de uma rocha durante uma tempestade à medida que passa uma onda. O espaço à frente de Vênus tornou-se muito turbulento.

O time da pesquisa desenvolveu três hipóteses alternativas para o mecanismo que carregou o oxigênio para o espaço.

  • Até uma EMC lenta aumenta a pressão do vento solar e tal pode ter interrompido o fluxo normal da atmosfera ao redor do planeta da frente para trás, ao invés de forçá-la para o espaço;
  • A segunda possibilidade é que os campos magnéticos que viajam com a EMC mudaram os campos magnéticos normalmente induzidos em torno de Vênus pelo vento solar para uma configuração que pode provocar a fuga atmosférica;
  • Em terceiro lugar, as ondas dentro do arco de choque de Vênus podem ter transportado as partículas à medida que se moviam.

Collinson diz que vai continuar pesquisando dentro dos oito anos de dados da Vênus Express em busca de mais informações, mas ressalta que é preciso sorte para encontrar outra EMC perto de outro planeta. Perto da Terra, temos várias naves espaciais que podem observar uma EMC sendo liberada pelo Sol e os seus efeitos perto da Terra, mas é difícil seguir estes eventos perto de outros planetas.

Esta foi uma observação rara de uma EMC que fornece informações cruciais sobre um planeta tão diferente do nosso e, por sua vez, sobre a Terra. Quanto mais aprendemos sobre outros mundos, mais compreendemos a história do nosso próprio planeta e o que o tornou tão hospitaleiro para a vida como a conhecemos.

Estes resultados foram publicados na edição de 9 de abril de 2015 na revista Journal of Geophysical Research.

Fonte

NASA: NASA Study Finds Small Solar Eruptions Can Have Profound Effects On Unprotected Planets

Artigo Científico

Journal of Geophysical Research: The impact of a slow Interplanetary Coronal Mass Ejection (ICME) on Venus

._._.

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

error: Esse blog é protegido!