Contabilidade cósmica revela um déficit na radiação ultravioleta no Universo

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Estamos cegos? Onde está a luz ultravioleta faltante? [Nebulosa da Tarântula nas Grandes Nuvens de Magalhães, capturada pela câmera WFI do telescópio de 2,2 metros do ESO. Créditos: ESO, J. Alves (Calar Alto, Spain), B. Vandame e Y. Beletski (ESO)]

Estaria errada nossa compreensão do Universo?

Há enorme déficit da radiação ultravioleta no “orçamento” cósmico?

A vasto espaço vazio entre as galáxias está ligado por filamentos de hidrogênio e hélio, que podem ser usados como um preciso “medidor de luz” cósmico. Em um estudo recentemente publicado na The Astrophysical Journal Letters, uma equipe de cientistas descobriu que a luz emitida por populações conhecidas de galáxias e quasares não é suficiente para explicar as observações do hidrogênio intergaláctico. A diferença apurada soma valores ‘estonteantes’ da ordem de 400%.

Juna Kollmeier, Instituto Carnegie para Ciência, autora e líder do estudo, afirmou:

É como se estivéssemos em um quarto grande e bem iluminado, mas se olhássemos ao nosso redor só veríamos algumas tênues lâmpadas incandescentes de 40 watts. De onde está vindo toda aquela luz? Está omitida em nosso censo.

Estranhamente, esta incompatibilidade aparece apenas nas regiões vizinhas e relativamente bem estudadas do Cosmos. Quando os telescópios focam nas galáxias a bilhões de anos-luz de distância (portanto vendo o Universo como era há bilhões de anos atrás), tudo parece fazer sentido. O fato desta contabilidade funcionar no Universo mais jovem, mas falhar localmente, tem dado uma dor-de-cabeça aos cientistas.

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Simulações de computador do hidrogênio intergaláctico em um Universo “mal iluminado” (à esquerda) e um Universo “iluminado” (à direita), que apresenta cinco vezes mais dos fótons energéticos (luz ultravioleta) que destroem os átomos de hidrogênio neutro. Observações pelo Telescópio Espacial Hubble da absorção do hidrogênio correspondem à imagem à direita. Mas, usando apenas as fontes astronômicas conhecidas da luz ultravioleta são produzidas estruturas muito mais espessas, à esquerda, e uma incompatibilidade severa com as observações astronômicas. Créditos: Ben Oppenheimer e Juna Kollmeier

A luz questionada consiste dos fótons altamente energéticos de radiação ultravioleta, capazes de converter os átomos de hidrogênio eletricamente neutros em íons eletricamente carregados. As duas fontes conhecidas para tais fótons ionizantes são:

  1. Os quasares, fornecidos pelo gás quente que cai sobre buracos negros supermassivos de mais de um milhão de vezes a massa do Sol;
  2. As estrelas massivas, mais jovens e quentes.

Observações indicam que os fótons ionizantes provenientes de estrelas jovens são na sua maior parte absorvidos pelo gás presente na sua galáxia hospedeira, por isso praticamente não escapam para afetar o hidrogênio intergaláctico.

Entretanto, o número de quasares conhecidos é muito menor do que o necessário para produzir a luz requerida.

Kollmeier comentou:

Ou a nossa contabilidade da luz ultravioleta das galáxias e quasares está muito errada ou existe alguma outra importante fonte de fótons ionizantes que ainda não reconhecemos. Estamos chamando a esta luz que falta de ‘crise de subprodução de fótons’. Mas, de fato, quem está em crise são os astrônomos, pois, de alguma forma, o Universo está se dando muito bem.

A discrepância emergiu a partir da comparação de simulações computacionais do gás intergaláctico contra as análises mais recentes do instrumento COS (Cosmic Origins Spectrograph) do Telescópio Espacial Hubble.

Ben Oppenheimer, coautor do artigo, da Universidade do Colorado, EUA, explicou:

As simulações se ajustam muito bem aos dados do Universo primitivo e se encaixam muito bem nos dados locais se presumirmos que esta luz extra está realmente lá. É possível que as simulações não estejam refletindo a realidade, o que por si só seria uma surpresa, porque o hidrogênio intergaláctico é o componente do Universo que nós pensamos que melhor entendemos.

Neal Katz, coautor da Universidade do Massachusetts em Amherst, EUA, destacou:

A possibilidade mais excitante seria de que os fótons em falta poderiam ser provenientes de uma nova fonte exótica e não serem originados por galáxias ou quasares.

Como sugestão: a misteriosa matéria escura, que mantém as galáxias juntas mas nunca foi detectada diretamente, pode eventualmente decair por si própria e fornecer esta radiação extra.

Katz exclamou?

Sabemos que é uma crise quando começamos a falar seriamente acerca do decaimento da matéria escura!

O coautor David Weinberg da Universidade Estatal do Ohio, EUA, comentou:

O mais notável sobre esta discrepância de 400% é que sabermos que algo está mesmo errado. Ainda não sabemos por certo do que se trata, mas pelo menos uma coisa que pensávamos que sabíamos sobre o Universo atual [as vizinhanças da nossa galáxia] não é verdade.

Caso a explicação seja ou não exótica, os astrônomos estão trabalhando arduamente para elucidar este enigma cósmico.

Fonte

Phys.org: Cosmic accounting reveals missing light crisis

Artigo Científico

Arxiv.org: THE PHOTON UNDERPRODUCTION CRISIS

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