Segue 1 – a galáxia fóssil nos revela os segredos do universo primitivo

http://cdn.phys.org/newman/gfx/news/hires/2014/nearbygalaxy.jpg

À esquerda imagem  da região onde se encontra Segue 1 (repare que não conseguimos ver esta galáxia). À direita, a foto anotada com diversas estrelas que fazem parte de Segue 1 dentro dos círculos. Crédito: Marla Geha, Universidade Yale

Residente a cerca de 75.000 anos-luz de distância da Terra, a galáxia conhecida como Segue 1 tem propriedades incomuns. Segue 1 é a galáxia mais tênue até hoje já detectada. Trata-se de uma galáxia diminuta, que contém somente cerca de 1.000 estrelas. A composição química de Segue 1 é relativamente rara, com a presença de quantidades extremamente pequenas de elementos metálicos [1].

Agora, uma equipe de cientistas, incluindo um astrônomo do MIT, analisou a composição química de Segue 1 e descobriu novas informações sobre a evolução das galáxias nos estágios iniciais do nosso Universo – ou, neste caso, uma impressionante inexistência de evolução em Segue 1. Em geral, as estrelas massivas (> 10M☼), milhões de anos depois de se formar a partir de nuvens de gás [2], terminam suas vidas em explosões de supernova, expelindo mais e novos elementos que constituem a base de novas gerações de formação estelar.

Isto, no entanto, não aconteceu em Segue 1. Ao contrário das demais galáxias, como esta nova análise mostra, parece que o processo de formação estelar de Segue 1 se estagnou em um estágio inicial de desenvolvimento galáctico, tornando esta tênue galáxia um fóssil do Universo primordial.

A tênue galáxia Segue 1 é mostrada aqui junto com as estrelas ao redor em imagem da Sloan Digital Sky Survey (à esquerda). Marla Geha e equipe da Universidade de Yale editaram a foto para destacar as 24 estrelas conhecidas da Segue 1 (à direita). Créditos: SDSS / Marla Geha

A tênue galáxia Segue 1 é mostrada aqui junto com as estrelas ao redor em imagem da Sloan Digital Sky Survey (à esquerda). Marla Geha e equipe da Universidade de Yale editaram a foto para destacar as 24 estrelas conhecidas da Segue 1 (à direita). Créditos: SDSS / Marla Geha

Segue 1 – a galáxia fóssil

Anna Frebel, professora assistente de física no MIT (Massachusetts Institute of Technology, EUA), autora principal do novo artigo acerca de Segue 1, explicou:

Segue 1 é quimicamente bastante primitiva. Em primeiro lugar tal indica que a galáxia nunca fez muitas estrelas. É uma galáxia bastante fraca. Esta galáxia tentou crescer como uma galáxia maior, mas falhou.

Mas, justamente porque se manteve no mesmo estado primordial ao longo do tempo, Segue 1 contém informações valiosas sobre as condições iniciais do Universo logo após o Big Bang.

Frebel disse:

Segue 1 nos conta como as galáxias começaram. Ela realmente acrescenta outra dimensão à arqueologia estelar, onde olhamos para trás no tempo para estudar a era das primeiras estrelas e da formação das primeiras galáxias.

http://newsoffice.mit.edu/2014/wimpy-dwarf-fossil-galaxy-reveals-new-facts-about-early-universe-0501

Imagem dos telescópios Magalhães no Observatório de Las Campanas, Chile, onde parte da pesquisa sobre Segue 1 foi conduzida. Crédito da foto: Anna Frebel

Segue 1 tem estrelas pobres em metais, um sinal revelador de como é primitiva!

A análise usou novos dados obtidos pelos telescópios Magalhães no Chile e do Observatório Keck no Havaí, pertencentes às seis estrelas gigantes vermelhas em Segue 1, as mais brilhantes dessa minúscula galáxia. Os astrônomos conseguem determinar quais elementos estão presentes nas estrelas porque cada elemento tem uma assinatura única que se torna detectável em observações por telescópios.

As estrelas de Segue 1 são distintamente pobres em conteúdo metálico. Todos os elementos em Segue 1 mais pesados que o hélio, parecem ter sido originados de uma única explosão de supernova, ou talvez de algumas poucas explosões, que ocorreram há bilhões de anos, pouco tempo após a formação da galáxia. Depois destes eventos iniciais, Segue efetivamente “desligou-se” em termos evolutivos, porque perdeu o seu gás devido às explosões e parou de produzir novas estrelas.

Fresbel esclareceu:

Segue 1 simplesmente não tem bastante gás e não conseguiu recolher mais gás, o suficiente para crescer e fabricar mais estrelas. Como consequência, não conseguiu produzir mais elementos pesados.

De fato, uma pequena galáxia normal do seu gênero contém em geral mais de 1 milhão de estrelas, Surpreendentemente, Segue 1 contém apenas cerca de 1.000 estrelas.

Os astrônomos também descobriram evidências reveladoras na falta dos chamados “elementos de captura de nêutrons”. Estes elementos químicos são aqueles encontrados na metade inferior da tabela periódica, criados em estrelas de massa intermédia. Mas em Segue 1, comentou Frebel, “os níveis de presença de elementos de captura de nêutrons nesta galáxia são os mais baixos já encontrados.” Isto, mais uma vez, indica uma ausência de formação estelar repetida e eventos de supernovas.

De fato, a composição química e estática de Segue 1 até mesmo a torna diferente das outras galáxias pequenas que os astrônomos têm estudado.

Frebel destacou:

Segue 1 é muito diferente das outras galáxias anãs esferoidais que tiveram uma evolução química completa. Essas são apenas mini galáxias, enquanto que Segue 1 é uma galáxia truncada. Ela não mostra evolução.

“Nós gostaríamos de encontrar mais galáxias assim”

Frebel explicou que as galáxias anãs, segundo modelos astronômicos, parecem formar blocos de construção para galáxias maiores como a nossa Via Láctea. A análise química de Segue 1 lança uma nova luz sobre a natureza destes blocos de construção.

Na verdade, outros astrônomos sugeriram que o estudo de galáxias como Segue 1 é uma parte vital no progresso no campo. Volker Bromm, professor de astronomia da Universidade do Texas, disse que este estudo é “muito bom e importante,” e “consubstancia a ideia” de que a análise de galáxias anãs fracas pode produzir um vislumbre sobre o desenvolvimento do Universo.

Bromm destacou que quando se trata da composição química das primeiras estrelas, toda a busca por evidências entre estrelas mais próximas da Via Láctea pode ser problemática. A maioria dessas estrelas teve um “uma história muito complexa de formação e enriquecimento, ondas muitas gerações de supernovas contribuíram para os padrões de abundância [de elementos] vistos nessas estrelas.” As estrelas das galáxias anãs não têm este problema.

As conclusões sobre Segue 1 também indicam que pode haver uma maior diversidade de caminhos evolutivos entre galáxias no início do Universo do que se pensava. No entanto, porque Segue 1 um exemplo único, Frebel está relutante em fazer afirmações gerais, dizendo:

Nós realmente precisamos de encontrar mais destes sistemas. Ou, se nunca mais encontrarmos outra [como Segue 1], tal nos dirá quão raramente as galáxias falham na sua evolução. Nós simplesmente não sabemos neste estágio sobre isto, porque esta é a primeira do seu tipo já encontrada.

O trabalho de Frebel geralmente tem sido focado na análise da composição química de estrelas incomuns mais próximas de nós. Entretanto, ela disse que gostaria de continuar este tipo de análise para quaisquer outras galáxias similares a Segue 1 que os astrônomos porventura encontrem. Este processo pode demorar algum tempo, ela reconhece que tais descobertas futuras exigirão “paciência e uma dose de sorte”.

O artigo intitulado “Segue 1: An Unevolved Fossil Galaxy from the Early Universe” foi recentemente publicado na revista Astrophysical Journal. Além de Anna Frebel, os coautores do artigo são: Joshua D. Simon, astrônomo dos Observatórios da Instituição Carnegie, em Pasadena, Califórnia, e Evan N. Kirby, astrônomo da Universidade da Califórnia em Irvine, cujo abstract reproduzimos a seguir:

Apresentamos resultados de alta resolução dos espectros de todas estrelas gigantes vermelhas da galáxia anã Segue 1, obtidos através dos observatórios/dispositivos Magalhães/MIKE e Keck/HIRES. Notavelmente, três das sete estrelas analisadas possuem metalicidade abaixo de [Fe/H] = –3.5, sugerindo que Segue 1 é a galáxia menos evoluída quimicamente conhecida.

Nós confirmamos análise previas em resolução media que demonstram que as estrelas de Segue 1 apresentam um faixa de metalicidade igual a cerca de 2 dex, desde [Fe/H] = –1,4 até [Fe/H] = –3,8. Todas as estrelas de Segue 1 são fortemente compostas de elemento α, com [α/Fe] ~ +0,5. Altas abundâncias do elemento α são típicas das estrelas com baixa concentração de metais, uma vez que em galáxias previamente estudadas o índice [α/Fe] declina para estrelas mais ricas em metais, tipicamente enriquecidas por matéria fornecida por supernovas tipo Ia.

A ausência desta assinatura em Segue 1 indica que foi enriquecida por metais apenas por estrelas massivas. Outras concentrações de elementos leves em Segue 1, incluindo carbono nas três estrelas mais pobres em metais são similares aquelas encontradas em estrelas no halo galáctico pobre em metais.

Finalmente, nós classificamos a estrela mais ricas em metais como uma estrela CH dada a sua larga abundância de carbono e elementos criados pelo processo-s. As outras 6 estrelas mostram notavelmente abundâncias de elementos de ‘baixa captura de nêutrons” com índices de estrôncio [Sr/H] < –4,9 e Bário [Ba/H] < –4,2, os quais são comparáveis aos mais baixos níveis já detectados entre estrelas do halo.

Tal sugere um enriquecimento mínimo por captura de nêutrons, talvez limitado a um único processo-r ou a um fraco processo-s em evento de síntese. Juntas como um todo, as abundâncias químicas em Segue 1 indicam a ausência de evolução química suportando a ideia de que Segue 1 é uma galáxia primordial sobrevivente que experimentou apenas um ciclo de formação estelar.

Para saber mais sobre os mistérios de Segue 1 leia: Galáxias furtivas vizinhas espreitam a Via Láctea e escapam da detecção

Notas

[1] Em astronomia e cosmologia física, a metalicidade (também chamada índice Z) de um objeto é a proporção da sua matéria constituída de elementos químicos diferentes do hidrogênio e hélio. Como as estrelas, que se constituem na maior parte da matéria visível do universo, são compostas principalmente de hidrogênio e hélio, os astrônomos usam por conveniência o termo genérico “metal” para descrever todos os outros elementos coletivamente. Assim, uma nebulosa rica em carbono, nitrogênio, oxigênio e neônio seria “rica em metais” em termos astrofísicos, embora esses elementos não sejam metais na química.

[2] O tempo de vida da estrela (tempo em que ela permanece na sequência principal, enquanto o hidrogênio do núcleo não se esgota) varia enormemente, de acordo com a massa da estrela. Veja tabela dos tempos médios a seguir para compreender melhor.

Massa (M☼)

Tempo aproximado na sequência principal (anos) * Classe espectral da estrela

Explode como Supernova? (S/N)

60

3 milhões O3 S

30

11 milhões O7

S

10

32 milhões B4

S

3

370 milhões A5

N

1,5

3 bilhões F5

N

1

10 bilhões G2 (Sol)

N

0,1 1 trilhão M7

N

* O tempo de vida depende da metalicidade original da estrela, entre outros fatores.

Fontes

MIT news: A “wimpy” dwarf fossil galaxy reveals new facts about early universe – Faintest galaxy ever detected illuminates unusual aspects of the universe’s early evolution.

Science Daily: Nearby galaxy is a ‘fossil’ from the early universe

Artigo Científico

SEGUE 1: AN UNEVOLVED FOSSIL GALAXY FROM THE EARLY UNIVERSE*

._._.

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

error: Esse blog é protegido!