Inédito! Kepler revela dois exoplanetas em ressonância orbital transitando no sistema Kepler 9

Na direção da constelação Lyra, a uma distância de 2.000 anos luz da Terra, há uma estrela similar ao Sol orbitada por pelo menos dois exoplanetas da “classe Saturno”.

NASA Kepler 9 transitos

Ilustração dos dois planetas com o tamanho de Saturno descobertos pelo observatório espacial Kepler da NASA em torno da estrela Kepler-9. Um terceiro planeta, com apenas 1,5 vezes o tamanho da Terra, pode também orbitar a estrela. Este é o primeiro sistema estelar descoberto com múltiplos planetas em trânsito. Crédito: NASA/Ames/JPL-Caltech

Mas, por que nos interessa tanto esta notícia? Trata-se do primeiro sistema exoplanetário descoberto com mais de um exoplaneta transitando a mesma estrela hospedeira. E mais ainda, isto prova a importância da análise das TTV (variações do tempo de trânsito). Este método poderá ser uma rica fonte de informações a descobrir neste e em outros sistemas alvo.

Missão Kepler rende frutos

Foi a missão Kepler que descobriu as assinaturas do trânsito de dois exoplanetas distintos, observadas nos dados da estrela Kepler-9. Os exoplanetas foram chamados de Kepler-9b e 9c. A descoberta incorpora sete meses de observações de mais de 156.000 estrelas como parte de uma pesquisa contínua em busca de exoplanetas do tamanho da Terra além do nosso Sistema Solar. Estas descobertas foram publicadas na revista Science.

A câmara ultra-precisa do Kepler mede pequenos decréscimos no brilho das estrelas, que ocorrem quando um exoplaneta passa em frente delas (este fenômeno é o que os astrônomos denominam como ‘trânsito’). O tamanho do exoplaneta pode ser derivado a partir destas diminuições temporárias da luminosidade estelar.

Curvas de luminosidade da estrela Kepler 9 mostram os trânsitos. Crédito: Matthew Holman (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics).

Curvas de luminosodade da estrela Kepler 9 mostram os trânsitos. Crédito: Matthew Holman (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics).

A distância do exoplaneta à estrela pode ser calculada através da medição do tempo entre as diminuições sucessivas do brilho estelar à medida que o exoplaneta orbita a estrela. As pequenas variações na regularidade destas reduções de brilho podem ser usadas para determinar as massas dos exoplanetas e detectar outros exoplanetas que não transitam no sistema alvo.

Em junho de 2010, os cientistas da missão submeteram suas descobertas para revisão por seus pares, que identificaram mais de 700 candidatos a exoplanetas nos primeiros 43 dias de operação da missão. Os dados incluíam cinco sistemas candidatos adicionais que pareciam exibir mais de um exoplaneta transeunte. A equipe científica do Kepler recentemente identificou um sexto alvo exibindo trânsitos múltiplos e acumularam suficientes dados para confirmar este sistema multi-planetário.

“Os dados de alta precisão do Kepler e a sua cobertura contínua dos objetos observados permite-nos fazer medições únicas das estrelas e dos seus sistemas exoplanetários,” afirmou Doug Hudgins, cientista do programa Kepler na sede da NASA em Washington.

Exoplanetas em ressonância orbital!

Os cientistas refinaram as estimativas das massas dos exoplanetas usando as medições baseadas nas observações do Observatório Keck, em Mauna Kea, Havaí. Os dados consolidados revelam que o exoplaneta Kepler-9b é o maior dos dois e que ambos têm massas similares entre si, embora ligeiramente inferiores a massa de Saturno. Kepler-9b é o exoplaneta mais próximo da estrela hospedeira, com uma órbita com período de 19,2 dias, enquanto Kepler-9c tem uma órbita que dura 38,9 dias, praticamente o dobro do tempo. Ao observar vários trânsitos por cada um dos exoplanetas de 7 meses de observações foi possível analisar o tempo entre cada trânsito sucessivo. Mais interessante ainda é saber que os dois exoplanetas estão em ressonância orbital na razão 2:1. Assim, enquanto o exoplaneta interior Kepler 9b completa duas órbitas o exterior Kepler 9c completa um giro completo em torno de sua estrela mãe.

Como noticiado na Sky & Telescope:

O exoplaneta interior, Kepler 9b, tem 25% da massa de Júpiter (80 vezes a massa da Terra, ou seja, 80 MT) e o exterior, Kepler 9c, tem 17% da massa de Júpiter (54 MT), com uma incerteza de apenas alguns pontos percentuais. Eles orbitam a 0,14 e 0,22 unidades astronômicas (UA) da estrela, mais próximos do que Mercúrio orbita o Sol (0,39 UA). Isso significa que eles passam freqüentemente muito próximos entre si e conseqüentemente devem interagir gravitacionalmente de forma bastante significativa.

Além disso, a equipe descobriu que o período orbital do Kepler 9b tem aumentando por 4 minutos por órbita, e o exterior Kepler 9c está diminuindo por 39 minutos por órbita. São valores consideráveis. A equipe estimou, através da execução de simulações, que os tempos orbitais oscilam para frente e para trás em torno da exata proporção de 2:1, a cada quatro anos. Os cientistas julgam que é esta ressonância que fez com que o sistema tenha sobrevivido por cerca de 2 bilhões de anos ou mais.

“Além do processo gradual de mudança no período orbital”, os astrônomos publicaram no artigo científico que “os tempos entre pares sucessivos de trânsito de Kepler 9b também mostram um padrão alternado com uma amplitude de 2 a 4 minutos.” Isto é devido à “posição alternada do planeta exterior no momento do trânsito em relação ao planeta interior.” Novamente, a imagem gravitacional deste sistema cai perfeitamente no devido lugar.

“Esta descoberta é a primeira confirmação clara de mudanças significativas nos intervalos de um trânsito planetário para outro, o que podemos chamar de variações temporais em trânsitos,” afirmou Matthew Holman, cientista da missão Kepler do Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica em Cambridge, Massachusetts, EUA. “É prova da interação gravitacional entre os dois exoplanetas.”

Além destes dois gigantes gasosos da ‘classe Saturno’, que foram confirmados por observatórios terrestres, os cientistas do Kepler também identificaram algo parece ser uma terceira assinatura, bem menor, nas observações do sistema Kepler-9. Essa assinatura sugere a presença de um exoplaneta tipo-Terra com cerca de 1,5 vezes o diâmetro terrestre em uma tórrida órbita de apenas 1,6 dias. Serão necessárias mais observações para determinar se este sinal é de fato um exoplaneta ou um fenômeno astronômico não identificado que imita a aparência de um trânsito.

Objetivo da Missão Kepler

Um dos principais objetivos da Missão Kepler é determinar a frequência dos exoplanetas de tamanho igual ou superior a Terra que situam dentro ou próximos das zonas habitáveis de estrelas similares ao Sol. Crédito: NASA/missão Kepler

Paul Gilster em Centauri Dreams completou com mais informações:

São estas boas notícias para os mundos terrestres? Não ainda, mas pelo menos existe uma pista. Alycia Weinberger (Carnegie Institution of Washington) comentou este caso em recente conferência:

Ultimamente, estimamos que Kepler irá encontrar diversos sistemas multiplanetários. Nós iremos conhecer quantos sistemas mostram ressonâncias, qual a freqüência e quando as migrações orbitais planetárias ocorreram enquanto estes corpos se formavam. O candidato com 1,5 vezes o raio da Terra, se confirmado, terá sobrevivido às migrações dos demais planetas deste sistema, um fato que trás bons augúrios para outros sistemas que apresentarem significativas migrações.

Em outras palavras, o sistema Kepler 9 poderá eventualmente nos contar que a migração de planetas gigantes gasosos para dentro do sistema planetário interior não necessariamente significa o apocalipse dos pequenos mundos que lá residem, se confirmada a presença desta super-Terra por lá. Alycia Weinberger também afirmou:

Seria interessante saber que os sistemas planetários com histórias diferentes podem produzir exoplanetas de pequena massa ou semelhantes à Terra em tamanho. Ressonâncias como as encontradas entre Kepler 9b e 9c podem garantir a estabilidade e produzir sistemas planetários estáveis por bilhões de anos. Ressonâncias freqüentes, em outras palavras, são excelentes notícias para exoplanetas de pequena massa, propiciando-lhes órbitas estáveis. Além disso, o método de variação de tempo de trânsito [TTV] pode nos ajudar a deduzir as massas dos planetas envolvidos.

Nada mal para um sistema interessante, sobre o qual vamos aprender ainda mais com o progresso da missão Kepler. Como foi dito, ao produzir dados sobre o tamanho e a massa de um exoplaneta, Kepler nos permite derivar sua densidade, auxiliando os astrônomos a compreender a sua composição, desde gigantes gasosos até planetas rochosos ou repletos de água. Vamos ver o que transpira com o candidato a super-Terra, se ele está lá, ele está em uma órbita abrasadora de 1,6 dias. Trata-se aqui de um mundo infernal, torrado por sua estrela. Mas talvez, novas análises de Kepler 9 ajudem aos astrônomos anunciar em uma futura conferência de imprensa, que há outro planeta semelhante à Terra, residindo em sua zona habitável.

Fontes

  1. Centauri Dreams: New Kepler Planets in Resonance
  2. NASA: NASA’s Kepler Mission Discovers Two Planets Transiting the Same Star
  3. Space.com: Newfound Alien Planets May Include Smallest One Yet
  4. Sky&Telescope: Two Exoplanets in an Interactive Dance

._._.

1 comentário

  1. Se as órbitas dos planetas em torno das estrelas não segue um padrão horizontalmente a nossa localização no universo , conclua-se que so identificamos os planetas visiveis por trânsito, e os demais planetas que tem trânsito na vertical ao nosso horizonte?????????

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