Quando Universos colidem, como saber sobre isso?

Representação gráfica do choque de 'universos-bolha'

Representação gráfica do choque de ‘universos-bolha’

Se nosso Universo se chocou uma vez contra outro, como poderíamos ser capazes de ver as evidências disso nos confins do cosmos? Perguntam-se os astrofísicos.

Até onde podemos dizer, o Universo tem aproximadamente 93 bilhões de anos luz de tamanho e menos de 13,73±0,12[1] bilhões de anos de idade.

Isto é algo que tem feito os cosmologistas coçar a cabeça. Em 14[1] bilhões de anos a luz pode viajar não mais que 14 bilhões de anos-luz (!). Então, como se produziu um Universo tão grande de uma forma tão rápida?

A melhor explicação que temos hoje é o misterioso processo chamado ‘inflação cósmica’. A idéia geral por trás disto é que pouco depois de seu nascimento, o Universo incrementou rapidamente seu tamanho por muitas ordens de magnitude em uma pequena fração de tempo, um instante cósmico.

Os cosmologistas adoram pensar sobre qual foi o gatilho que disparou a inflação universal. Resposta curta: nada se sabe na realidade, embora a especulação sobre isso continue firme e forte.

Um problema menos conhecido e explorado é ‘o que poderia haver detido a inflação’. Por que então o Cosmos não seguiu expandindo-se neste ritmo exponencial?

Uma das respostas mais curiosas é esta: que o Universo ainda está se expandindo e que vivemos em uma diminuta região de estabilidade, uma bolha cósmica em meio a uma gigantesca tormenta universal.

Obviamente, nossa bolha cósmica seria apenas uma entre outras incontáveis bolhas.

Mas, como poderíamos ver alguma vez uma destas bolhas se elas devem estar além da fronteira intransponível (para os nossos instrumentos de medição) do Universo visível?

O choque de ‘universos-bolha’

Agora, Anthony Aguirre da Universidade de Califórnia em Santa Cruz e seu colega Matthew Johnson da Caltech revisaram este cenário proposto e dão uma resposta ousada em recente artigo publicado em 21 de setembro de 2009: “Um relatório de status a respeito da observabilidade das colisões de bolhas cósmicas”. Eles escreveram no abstract:

Neste quadro de eterna inflação guiada por uma potência escalar de mínimos múltiplos, nosso Universo observável reside dentro de uma das diversas bolhas formadas pelas transições de um falso vácuo. Essas bolhas necessariamente colidem entre si, perturbando a homogeneidade e isotropia de nossa bolha interior e possivelmente levando a assinaturas detectáveis na porção observável de nossa bolha cósmica, potencialmente na radiação cósmica de fundo de microondas (CMB – Cosmic Microwave Background) ou outras sondagens de alta precisão. Isto constitui um teste direto experimental da teoria da eterna inflação e o cenário do vácuo da teoria das cordas. A forma simplificada de abordar esta possibilidade pode se resumir a responder 3 questões: O que acontece em uma colisão genérica em bolhas cósmicas? Quais são os efeitos observacionais que poderiam ser esperados? Como poderíamos observar tal colisão? Nesta revisão nós relatamos o progresso corrente em cada uma destas questões, melhoramos alguns dos resultados existentes e tentamos estabelecer direções para futuras pesquisas.

Assim, os cientistas Aguirre e Johnson propõem que a única forma em que poderíamos ver provas da existência de outra bolha cósmica é se no passado remoto a outra bolha tivesse e colidido com o nosso Universo (bolha) no passado distante.

Trata-se de uma idéia interessante, mas com alguns desafios. O principal problema é que na maior parte de os casos, as colisões entre os ‘universos-bolha’ destruiriam os tecidos de espaço-tempo de ambas as bolhas, assegurando assim que nós, como observadores cosmológicos, não poderíamos estar aqui para verificar tais conseqüências.

Entretanto, Aguirre e Johnson identificaram uma família possível de colisões cósmicas que poderiam preservar as três dimensiones do espaço e uma temporal que necessitamos para nossa existência. Contudo, o que foi proposto não se parece tanto como uma colisão cósmica no sentido literal, o evento seria mais como um ‘golpe de raspão’ entre os ‘universos-bolha’.

Então, qual seria a conseqüência de tal ‘raspão cósmico’? Aguirre e Johnson dizem que a evidência de uma curvatura negativa do Universo seria compatível com a idéia de que vivemos em uma bolha cósmica enquanto que uma curvatura positiva descartaria esta hipótese.

Além disso, este choque cósmico haveria deixado seu marca na forma de várias facetas simétricas na radiação cósmica de fundo de microondas (CMB – Cosmic Microwave Background). Isto é algo que poderíamos ver nos dados de sondas espaciais como o novo e poderoso observatório Planck.

Tudo isto é deveras tentador. Contudo, o problema é que nada disso provaria de forma definitiva e inambígua a efetiva evidência de uma colisão. Assim, isto significa que nunca iríamos saber toda a verdade com absoluta certeza.

Mas os cosmologistas não desistem com facilidade, este é o tipo de especulação que eles amam.

Aguirre e Johnson finalizam com esta frase: “Com algo de sorte, o descobrimento de ‘outros universos’, um conceito que aparentemente surgiu da ficção cientifica, pode estar [próximo de nós] logo depois da nossa esquina!”

Se você acredita então você terá uma frutífera e bela carreira à frente, em Cosmologia.

Vamos aguardar o que o telescópio orbital Planck vai apurar…


[1] A idade do Universo foi recalculada com maior precisão em 2008 através da sonda WMAP: 13,73±0,12 bilhões de anos. A título de simplificação nós aqui ‘arredondamos’ o valor para 14 bilhões de anos.

Fontes e referências

MIT Technology Review: When Universes Collide, How Would We Know?

ArXiv.org: A status report on the observability of cosmic bubble collisions por: Anthony Aguirre, Matthew C. Johnson

._._.

1 comentário

3 menções

    • Lisandro Hubris em 06/10/2009 às 10:27
    • Responder

    Igual aos seres vivos, o Universo também produziria “ninhadas” de pequenos universos?
    Assim como os seres vivos, o Universo também estaria vivo e gerando outros mundos ou “bolhas de espuma”?
    Os cientistas chamam de “Espuma do espaço-tempo” a teoria de que as galáxias estariam contidas em uma enorme bolha…
    De cuja superfície escapariam outras bolhas menores, que ocasionalmente dariam origem a novos Universos…
    A maioria dos universos implode ou desaparece depois que se forma…
    Mas ocasionalmente, alguma dessas bolhas atuaria como uma “semente” a partir da qual um novo Universo cresceria e se desenvolveria…

  1. […] artigo de Anthony Aguirre e Atthew Johnson, de 21 de Setembro de 2009. Transcrevo o abstract (do Eternos Aprendizes): “Neste quadro de eterna inflação guiada por uma potência escalar de mínimos múltiplos, […]

  2. […] artigo de Anthony Aguirre e Atthew Johnson, de 21 de Setembro de 2009. Transcrevo o abstract (do Eternos Aprendizes): “Neste quadro de eterna inflação guiada por uma potência escalar de mínimos múltiplos, […]

    • Blog de Astronomia do astroPT » Colisão de Campos em 13/11/2009 às 18:03

    […] Neste artigo de Anthony Aguirre e Atthew Johnson, de 21 de Setembro de 2009. Transcrevo o abstract (do Eternos Aprendizes): […]

Deixe uma resposta para Blog de Astronomia do astroPT » Colisão de Campos Cancelar resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

error: Esse blog é protegido!