Estrelas desaparecidas ajudam astrônomos a comprovar a origem das supernovas tipo II

Representação artística da supernova SN 1993J

Representação artística da supernova SN 1993J, onde uma a estrela progenitora supergigante vermelha classe K (à esquerda) iniciou sua explosão depois de ter transferido parte do gás hidrogênio (cerca de 7 vezes a massa do Sol) para a sua companheira binária gigante azul classe B (à direita). Crédito: ESA

Os astrônomos confirmaram através de imagens dos telescópios Hubble e Gemini o que há muito suspeitavam: as supernovas tipo II são de fato resultantes da explosão de estrelas supergigantes vermelhas.

As supernovas tipo II são explosões cósmicas impressionantes que resultam do colapso interno de uma estrela massiva. Também são conhecidas como supernovas de colapso do núcleo (“core collapse supernovae“).

As supernovas ocorrem em média uma vez a cada 50 anos para galáxias similares a Via-Láctea. O grande problema é que os cientistas não conseguem estimar quando as supernovas irão ocorrer, assim tentar saber qual foi a estrela progenitora da supernova acaba tornando-se uma tarefa ardilosa.

Observações anteriores e modelos simulados têm sugerido que as supergigantes vermelhas são as naturais progenitoras das supernovas tipo II, mas a melhor evidência que tínhamos até agora é que tais estrelas se apresentavam na área próxima antes da supernova, mas não no exato ponto onde a explosão ocorreu.

Assim o astrônomo Justyn Manud da Universidade de Copenhagen na Dinamarca, associado da Universidade da Califórnia e seu colega Stephen J. Smartt da universidade Queen’s University Belfast na Inglaterra  usaram imagens de telescópios na tentativa de responder a questão: “Qual a certeza que temos que tal estrela é a progenitora da supernova?”.

A pesquisa foi realizada através da consulta ao banco de dados de imagens do telescópio espacial Hubble e do telescópio Gemini comparando imagens de antes e depois de duas explosões de supernova: SN 2003gd e SN 1993J. Os pesquisadores acharam supergigantes vermelhas nos pontos exatos associados as explosões: antes a supergigante vermelha candidata a progenitora estava lá e depois a tal progenitora desapareceu!, exclamou Maund.

As análises constataram que a estrela progenitora da supernova SN 2003gd é uma supergigante vermelha classe M e a progenitora da supernova SN 1993J é uma supergigante vermelha classe K que desapareceu e sua companheira binária, gigante azul da classe B, permanece presente após a ocorrência da SN 1993J.

Maund e seu time conseguiu medir as massas das estrelas progenitoras. A massa da estrela classe M que originou a SN 2003gd foi avaliada em cerca de 7 vezes a massa do Sol, o que é considerado abaixo do limite inferior para um evento desse tipo. Embora haja incerteza sobre essa estimativa eles afirmam que não resta dúvida que a progenitora está associada ao limite mínimo de massa que provoca as supernovas de colapso de núcleo.

No caso da SN 1993J o evento foi excepcional por causa da interação entre a progenitora supergigante vermelha e a sua companheira binária azul. A companheira menor gigante azul absorveu grande parte das camadas externas de hidrogênio da progenitora, avaliado em cerca de 7 massas solares, ao longo de 250 anos, incrementando sua massa para 22 massas solares.

SN 2003gd

Supernova SN 2003gd na galáxia M74

A descoberta, detalhada na revista Science em 20 de Março, confirma essa antiga teoria sobre a formação da supernova tipo II. “Não há outro modo de explicar esses casos”, Maund informou a Space.com.

Esse tipo de confirmação da teoria levou um tempo considerável, pois os astrônomos tiveram que esperar por anos que o brilho das supernovas evanescesse até permitir que se tomasse uma “imagem posterior” consistente.

As descobertas continuam!

Por incrível que pareça, paralelamente, uma supernova do tipo II, estudada por outra dupla de astrônomos, cerca de 200 milhões de anos-luz de distância da Terra também foi associada a sua estrela progenitora. Usando técnica similar, o astrofísico Avishay Gal-Yam do Weizmann Institute of Science em Rehovot, Israel, e o astrônomo Douglas Leonard da San Diego State University usaram imagens do Hubble e do Keck para examinar a estrela. Em imagens obtidas em 1997 havia uma luz brilhante nas proximidades do ponto onde a supernova, denominada SN 2005gl, foi observada em 2005 na galáxia NGC 266.

Representação de uma LBV (estrela gigante azul de luminosidade variável) Crédito: Melissa Weiss, CXC, NASA

Representação de uma LBV (estrela gigante azul de luminosidade variável) Crédito: Melissa Weiss, CXC, NASA

A progenitora da SN 2005gl, por sua vez, era uma estrela bem mais massiva, uma hipergigante azul de luminosidade variável (LBV).

Em um artigo anterior Gal-Yam, Leonard e colegas tinham apontado essa evidência como indicativo que essa luminosa e massiva estrela tinha gerado a supernova SN 2005gl. Mas sem as imagens posteriores da ocorrência da supernova não estava claro se a estrela tinha ou não desaparecido ou se a estrela suspeita pertencia a um aglomerado estelar. Graças às novas imagens do Hubble de 2007, observou-se um vazio onde a  supernova ocorrerau o que levou a conclusão sobre a associação da progenitora e a supernova SN 2005gl. Essa descoberta foi relatada em artigo da revista Nature em 22 de março de 2009.

Assim, antes dessas 3 supernovas tipo II analisadas, até agora só uma havia sido associada a sua progenitora: SN 1987A. Essa fantástica supernova, a mais próxima da Terra em 400 anos, visível ao olho-nú em 1987, ocorreu na Nuvem Maior de Magalhães, cerca de 168.000 anos-luz de distância da Terra.

Acima, uma fotografia terrestre de 2005 da estrela em explosão SN 2005gl na galáxia NGC 266. Abaixo a esquerda: uma imagem do arquivo de Hubble em luz visível de 1997 da região da galáxia onde explodiu a supernova. O círculo branco marca a estrela progenitora. Abaixo no centro: imagem em infravermelho pelo telescópio Keck da explosão de supernova em 2005. Abaixo a direita: Imagem do cenário pós-supernova em luz visível do Hubble tomada em 26 de setembro de 2007. Observa-se uma fonte brilhante nas três imagens, à direita embaixo, perto do local da supernova, mas a estrela progenitora desapareceu na foto tomada pelo Hubble após a supernova ter evanescido.

Acima, uma fotografia terrestre (observatório Puckett) de 2005 da estrela em explosão SN 2005gl na galáxia NGC 266. Abaixo a esquerda: uma imagem do arquivo de Hubble em luz visível de 1997 da região da galáxia onde explodiu a supernova. O círculo branco marca a estrela progenitora. Abaixo no centro: imagem em infravermelho pelo telescópio Keck da explosão de supernova em 2005. Abaixo a direita: Imagem do cenário pós-supernova em luz visível do Hubble tomada em 26 de setembro de 2007. Observa-se uma fonte brilhante nas três imagens, à direita embaixo, perto do local da supernova, mas a estrela progenitora desapareceu na foto de 2007 tomada pelo Hubble após a supernova ter evanescido. Oops: mas essa estrela explodiu antes da hora! e agora?

Oops… mas a supernova SN 2005gl explodiu antes da hora! O que ocorreu?

A análise da SN 2005gl trouxe novidades e novos pontos de interrogação na teoria da evolução estelar…

Constatou-se que estrela progenitora da SN 2005gl, altamente massiva e um milhão de vezes mais brilhante que nosso Sol explodiu prematuramente (em desacordo com as teorias existentes), o que pode sugerir aos cientistas que não conhecemos a evolução estelar tão bem como pensávamos.

“Isto poderia significar que estamos fundamentalmente equivocados sobre a evolução das estrelas massivas, e que se faz necessário uma revisão das teorias associadas ao ciclo de vida das estrelas massivas”, disse Avishay Gal-Yam do Instituto Weizmann de Ciência em Rehovot, Israel.

De acordo com a teoria existente, a estrela condenada, aproximadamente de 100 vezes a massa de nosso Sol, não era bastante madura para ter desenvolvido um núcleo massivo de ferro das cinzas da fusão nuclear. A consolidação do núcleo de ferro/níquel é considerada como uma condição necessária para uma implosão do núcleo que dispare o tipo de explosão de supernova que se viu.

A LBV progenitora pertence a uma categoria de estrelas gigantes massivas “e nenhum outro tipo de estrela é intrinsecamente tão brilhante”, disse Gal-Yam. Quando uma estrela da classe LBV evolui, ela perde grande parte de sua massa em um violento vento estelar, na fase denominada estrela de Wolf-Rayet. Ao final da fase de Wolf-Rayet o núcleo de ferro amadurece atingindo o limite de máximo de massa e então este colapsa gerando a seguir uma fantástica explosão.

A inesperada e prematura explosão poderia significar que estrelas massivas podem comportar-se de uma forma anômala, que poderia incluir uma relativamente próxima de nós, conhecida como Eta Carinae, apenas a 7.500 anos luz de distância em nossa galáxia, a Via Láctea. As estrelas extremadamente massivas e luminosas que alcançam cerca de 100 massas solares, como é o caso de Eta Carinae, espera-se que percam todo seu envoltório de hidrogênio antes de suas explosões finais como supernova.

“Estas observações demonstram que muitos detalhes na evolução e destino das LBVs seguem sendo um mistério”, disse Mario Livio do Instituto de Ciência do Telescópio Espacial em Baltimore. “Deveríamos seguir mantendo um olho sobre Eta Carinae, pode surpreender-nos de novo”.

“A identificação da estrela progenitora demonstra que, ao menos em alguns casos, as estrelas massivas explodem antes de perder a maior parte de suas camadas externas de hidrogênio, e tal sugere que a evolução do núcleo e a evolução das camadas externas estão menos acopladas do que anteriormente se achava, um hiato que pode requerer uma revisão da teoria de evolução estelar”, ressaltou o co-autor Douglas Leonard da Universidade Estatal de São Diego.

Uma possibilidade alternativa é que a progenitora de SN 2005gl seja na realidade um par de estrelas, um sistema binário que se fundiu. Essa fusão possivelmente disparou reações nucleares que iluminaram enormemente a estrela, tornando-a mais luminosa e menos evoluída do parece na realidade.

“Isto também deixa aberta a questão de que pode haver outros mecanismos que disparem as explosões de supernova”, disse Gal-Yam. “Pode ser que estejamos passando por alto algo muito básico na compreensão de como uma estrela superluminosa perde sua massa”.

Gal-Yam informa de que a observação revelou que só uma pequena parte da massa da estrela saiu ejetada na explosão. A maior parte do material, disse Gal-Yam, foi arrastada no colapso do núcleo que se converteu provavelmente em um buraco negro com massa estimada entre 10 a 15 massas solares.

Fontes e referências:

Astroamador: Estrelas Gigantes – LBV e Wolf-Rayet

Universe Today:

Space.com: Genesis for Exploding Stars Confirmed por Andrea Thompson

Science: The Disappearance of the Progenitors of Supernovae 1993J and 2003gd por Justyn R. Maund e Stephen J. Smartt

The Astrophisical Journal: On the Progenitor of SN 2005gl and the Nature of Type IIn Supernovae por Avishay Gal-Yam, D. C. Leonard, D. B. Fox, S. B. Cenko, A. M. Soderberg, D.-S. Moon, D. J. Sand (Caltech Core Collapse Program), Weidong Li, Alexei V. Filippenko, G. Aldering e Y. Copin

Nature: A massive hypergiant star as the progenitor of the supernova SN 2005gl por A. Gal-Yam & D. C. Leonard

Hubblesite: Hubble Uncovers an Unusual Stellar Progenitor to a Supernova

Centauri Dreams: Explosion of a Gigantic Star

Spaceref.com: Hubble Uncovers Unusual Supernova Progenitor Star

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