Anãs marrons gêmeas no sistema 2M 0939 são os objetos sub-estelares mais tênues já observados

Esta concepção artística mostra os corpos estelares mais tênues conhecidos atualmente: as anãs marrons gêmeas conhecidas como 2M 0939. Crédito da imagem: NASA/JPL-Caltech

Esta concepção artística mostra os corpos estelares mais tênues conhecidos atualmente: as anãs marrons gêmeas conhecidas como 2M 0939. Crédito da imagem: NASA/JPL-Caltech

Empataram! O novo recorde de objeto estelar mais tênue conhecido no Universo foi atribuído a duas estrelas “falhadas” gêmeas, anãs marrons, cada uma das quais brilha fracamente com apenas um milionésimo da luz do nosso Sol.

Anteriormente, os astrônomos pensavam que esse par de tênues bulbos estelares era simplesmente uma única anã marrom corriqueira sem nenhuma chance de bater algum recorde. Mas quando o Telescópio Espacial Spitzer da NASA observou essa anã marrom com sua visão infravermelha detectora de calor, os astrônomos foram capazes de medir com precisão a extrema debilidade do objeto sub-estelar e sua baixa temperatura pela primeira vez. E ainda mais, os dados do Spitzer revelaram que a suposta anã marrom é, na verdade, um par de anãs gêmeas.

“Ambos objetos são os primeiros a romper a barreira mínima da fração milionésima da energia luminosa solar emitida”, afirmou Adam Burgasser do Instituto Tecnológico de Massachusetts em Cambridge. Burgasser é o autor principal de novo artigo sobre essa descoberta que foi publicado na revista Astrophysical Journal Letters.

As anãs marrons são objetos degenerados no cosmos. São enormes e compactas bolas de gás que flutuam livremente pelo espaço, mas são demasiado frias e leves para serem estrelas e demasiadamente quentes e massivas para serem planetas. O nome de “anã marrom” foi designado tendo em vista que estes objetos sub-estelares mudam de cor conforme se esfriam e, portanto não têm uma cor bem definida. Na realidade, a maioria das anãs marrons nos parece bem mais avermelhadas se visualizadas. Sua débil emissão de luz também significa que são muito difíceis de encontrar. A primeira anã marrom foi descoberta só recentemente, em 1995. Embora ainda não se conheçam centenas delas, os astrônomos afirmam que há uma quantidade enorme dessas sub-estrelas espalhadas pelo espaço esperando a serem descobertas.

Essa recém descoberta dupla de anãs marrons, embora notáveis por sua excepcional debilidade luminosa, provavelmente não será lembrada pelo seu nome original. Esse sistema é conhecido como 2MASS J09393548-2448279 através do “Estudo de Todo o Céu de 2 Mícron” (Two Micron All-Sky Survey), ou “2MASS,” missão em parte patrocinada pela NASA que detectou pela primeira vez esse sistema em 1999.

O estudo foi baseado na visão infravermelha ultra-sensível do Spitzer para aprender mais sobre esse sistema, que antes se pensava tratar-se de uma singela anã marrom. Estes dados revelaram uma temperatura atmosférica aquecida de 565 a 635 graus Kelvin. Embora sejam objetos centenas de graus acima da temperatura de Júpiter (165 K @1bar), tal valor de temperatura é muito mais frio do que se encontra usualmente em uma estrela. De fato, 2MASS J09393548-2448279, ou 2M 0939 para abreviar, é um dos corpos estelares mais frios já medidos até hoje.

Para calcular o brilho desses objetos, os pesquisadores teriam primeiro que determinar sua distância a Terra. Após três anos de medidas precisas com o Observatório Anglo-Australiano na Austrália, eles concluíram que 2M 0939 é a quinta anã marrom conhecida mais próxima da Terra, há 17 anos luz de distância na constelação de Antlia. Esta distância, junto com a medição de Spitzer, permitiu aos astrônomos concluírem que o objeto era extremadamente frio e com fraca luminosidade.

Mas havia algo enigmático para os astrônomos. O brilho do tal objeto era o dobro do esperado para una anã marrom com esta temperatura específica. A solução para o impasse? O objeto deveria ter o dobro de sua área de superfície. Em outras palavras, tratava-se na verdade de um par de objetos gêmeos, cada um brilhando na metade do total apurado e cada objeto com massa entre 30 e 40 vezes a massa de Júpiter. Esses objetos são um milhão de vezes mais tênues que o Sol na sua luminosidade total, e pelo menos um bilhão de vezes mais fracos que o Sol considerando-se apenas o espectro da luz visível.

“Estas anãs marrons são as ‘lâmpadas’ estelares de menor potência que se conhece até o momento”, disse Burgasser. “E como ‘lâmpadas fluorescentes’ de baixa energia, essas anãs marrons emitem a maior parte de sua energia em uma estreita faixa de comprimentos de onda, nesse caso no espectro infravermelho”.

De acordo com os autores, devem existir anãs marrons ainda mais tênues dispersas pela galáxia, a maior parte delas demasiadamente débeis para serem detectadas com as atuais pesquisas celestes. A próxima missão da NASA, a Wide-Field Infrared Survey Explorer (WISE), varrerá todo o céu nos comprimentos de onda do espectro infravermelho, e se espera que se encontrem centenas desses discretos personagens cósmicos.

“O Santo Graal da pesquisa sobre as anãs marrons será encontrar qual é de fato o valor mínimo a que se pode chegar com relação à temperatura, massa e brilho”, afirma Davy Kirkpatrick, co-autor do artigo, do Centro de Análise e Processamento Infravermelho da NASA no Instituto Tecnológico de Califórnia em Pasadena. “Isto nos dirá mais sobre como se formam e evoluem as anãs marrons”, completa Kirkpatrick.

Os demais autores deste artigo são Chris Tinney da Universidade de New South Wales na Austrália; Michael C. Cushing da Universidade do Havaí em Manoa; Didier Saumon do Laboratório Nacional de Los Álamos no Novo México; Mark S. Marley, do Centro de Investigação Ames em Moffett Field, Califórnia e Clara S. Bennett do Massachusetts Institute of Technology (MIT).

Características básicas e formação (conforme a Wikipédia) das anãs marrons

Anãs marrons são objetos formados de plasma e compostos em maior quantidade de hidrogênio e hélio e em menor quantidade por deutério, lítio e outros elementos. Possuem uma massa superior a 13, mas inferior a 75 vezes a massa de Júpiter. Devido ao processo de degeneração (ver abaixo em Formação), elas apresentam um tamanho muito próximo de Júpiter e uma luminosidade muito fraca e avermelhada e não marrom como o nome pode erroneamente sugerir. Por causa dessa fraca luminosidade, sua luz se situa na faixa do infravermelho próximo do espectro.

Alcançam temperaturas de aproximadamente 1.000 a 3.400 K. São encontradas em sua maioria em sistemas binários, orbitando estrelas de massa baixa. Em alguns casos o sistema binário em si pode ser composto duas anãs marrons que compartilham um baricentro; ou ainda podem ser encontradas como objetos solitários.

Formação: Os processos de formação das anãs marrons são semelhantes aos das estrelas. Acredita-se que elas sejam formadas pela contração gravitacional de nuvens de gás e poeira. Essas nuvens são compostas majoritariamente de hélio, hidrogênio e outros elementos menos significativos em quantidade, como lítio e o deutério. Ao colapsar, a nuvem se torna uma bola de gás gigante com um disco de mesma composição ao seu redor. À medida que a gravidade da anã a comprime, seu núcleo fica mais quente e denso (transformando o gás em plasma).

Como elas não possuem massa suficiente para realizar a fusão do hidrogênio (as de massa alta conseguem fundir hidrogênio, mas esporadicamente e com baixa eficiência), inicialmente realizam a fusão de deutério. A fusão produz energia suficiente que contrapõe a força gravitacional, fazendo-as brilharem (as anãs marrons com massa superior a 60 massas Júpiter, ainda conseguem realizar a fusão do lítio). Quando o deutério acaba, a contração continua. Essa contração aumenta a pressão térmica do núcleo que se opõem as forças gravitacionais. Os elétrons ficam livres de seus núcleos por causa das altas temperaturas. Como dois elétrons não ocupam o mesmo estado quântico, quando o núcleo é muito denso os estados de baixa energia são preenchidos e muitos elétrons são forçados a ocupar altos estados de energia. Isso gera uma pressão insensível à temperatura. Objetos alimentados por esse processo são denominados de degenerados. Isso já não ocorre com as estrelas, já que elas têm capacidade de fusão constante do hidrogênio. Quando isso ocorre, a estrela para de contrair mantendo seu brilho e tamanho. Já nas anãs marrons, quando a pressão de degeneração diminui seu colapso, a luminosidade gerada por sua contração gravitacional diminui gradativamente.

Uma anã marron pode ser considerada um planeta?

Não. Existe uma separação do conceito de planeta extrasolar e de anã-marrom segundo a definição do WORKING GROUP ON EXTRASOLAR PLANETS (WGESP) pertencente à IAU (INTERNATIONAL ASTRONOMICAL UNION), publicada em fevereiro de 2001:

  1. Objetos com massas abaixo do limite inferior que permite a fusão termonuclear do deutério (atualmente estimada em 13 vezes a massa de Júpiter para objetos com metalicidade similar a do Sol) que orbitam estrelas ou objetos remanescentes de estrelas (exemplos: anãs-brancas, estrelas de nêutrons, pulsares, buracos negros) são considerados “planetas” (não importando a maneira que foram formados). A massa/tamanho mínima requerida para um objeto extrasolar ser considerado um planeta deve ser a mesma usada no sistema Solar.
  2. Objetos sub-estelares com massas acima do limite mínimo de massa que permitem a fusão termonuclear do deutério são considerados “anãs-marrons”, não importando a maneira como foram formados nem a sua localização.
  3. Objetos livres gravitacionalmente em aglomerados estrelares jovens com massas abaixo do limite inferior para a fusão termonuclear do deutério não são considerados “planetas”, mas são denominados “sub-anãs-marrons” (ou outro nome mais apropriado a ser estabelecido).

Referências e Fontes:

New Scientist: Milky Way’s dimmest bulbs found

NASA JPL Caltech: Astronomers Find the Two Dimmest Stellar Bulbs

MIT NEWS: Dimmest star-like objects discovered por David Chandler, MIT News Office e Whitney Clavin, Jet Propulsion Laboratory

Space Daily: Astronomers Find The Two Dimmest Stellar Bulbs

Science Daily: Astronomers Find The Two Dimmest Stellar Bulbs

Yahoo-Respostas: Uma anã-marron é uma estrela? ou não? Que objeto é esse?

._._.

3 comentários

14 menções

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  1. Como sabem quando o mundo vai acabar? Só existe um ser que sabe isso!!!

      • ROCA em 05/09/2011 às 12:36
        Autor

      O que significa a expressão “o mundo acabar”? Não me parece nada claro o que quer dizer…

      Parece-me plausível que o “mundo acaba” para o indivíduo quando ele morre. Nós (exceto os suicidas, obviamente) sabemos quando iremos morrer?

  2. Excelente, excelente, excelente !
    Matéria muito bem pesquisada e PRECISA.
    Raramente encontramos um blog em astronomia que trás conteúdo tão detalhado com fontes realmente confiáveis. Acredito também que este texto requereu muitas horas exaustivas de pesquisa.
    É isso, ai!
    Mostre para todos que brasileiro não vive só no mundo da lua. Também vê estrelas (rs).
    Parabéns ! ! ! (voltarei, viu?).

  1. […] disso é que 2 deles superam a massa de 13 vezes a massa de Júpiter e portanto, em tese, são anãs-marrons. Veja abaixo a relação dos 30 exoplanetas ordenados por massa (do menor para o maior). Na […]

  2. […] Está começando a parecer que os astrônomos estão se tornando cansados de observar diretamente os exoplanetas, já estivemos aqui, já fizemos isso… Assim eles estão agora se aprofundando mais visando uma nova grande descoberta: a detecção de exoluas (ou lua extrasolar) orbitando exoplanetas. Em novo estudo um astrônomo britânico quer usar a técnica mais comumente utilizada na observação indireta de exoplanetas. Essa tradicional e amplamente usada técnica verifica a estrela candidata para ver se ela tremula. A tremulação ou flutuação orbital estelar é usualmente causada pela presença de um objeto massivo orbitando a estrela, revelando indiretamente a presença de um exoplaneta (ou um objeto sub-estelar como uma anã-marrom). […]

  3. […] consenso geral vigente até então, conforme a UAI estabeleceu em 2001, é que se um objeto tem a capacidade de suportar a fusão do deutério (uma forma de hidrogênio […]

  4. […] ser feita para separar os planetas dos objetos muito massivos compõem tanto as estrelas como as anãs marrons. Stern descreve isso como uma definição de senso comum que está livre de outros qualificadores […]

  5. […] ser feita para separar os planetas dos objetos muito massivos compõem tanto as estrelas como as anãs marrons. Stern descreve isso como uma definição de senso comum que está livre de outros qualificadores […]

  6. […] Além disso, a anãs marrons têm muito em comum com o planeta Júpiter, que tem uma massa menor, mas possui tamanho e composição semelhantes a esses objetos sub-estelares. Se Júpiter tivesse se formado sozinho, nas profundezas do espaço, poderia eventualmente ser classificado como uma estrela falhada (na verdade seria considerada uma ‘sub-anã-marrom*’, conforme os padrões da UAI*, veja as explicações sobre estes critérios no tópico “Uma anã marrom pode ser considerada um planeta?” em “Anãs marrons gêmeas no sistema 2M 0939 são os objetos sub-estelares mais tênues já observados*”). […]

  7. […] Além disso, a anãs marrons têm muito em comum com o planeta Júpiter, que tem uma massa menor, mas possui tamanho e composição semelhantes a esses objetos sub-estelares. Se Júpiter tivesse se formado sozinho, nas profundezas do espaço, poderia eventualmente ser classificado como uma estrela falhada (na verdade seria considerada uma ‘sub-anã-marrom*’, conforme os padrões da UAI*, veja as explicações sobre estes critérios no tópico “Uma anã marrom pode ser considerada um planeta?” em “Anãs marrons gêmeas no sistema 2M 0939 são os objetos sub-estelares mais tênues já observados*”). […]

  8. […] demais alvos da missão WISE são os cometas, asteróides e os objetos sub-estelares chamados de anãs marrons (ou anãs castanhas). Em 12 de janeiro de 2010 o WISE descobriu seu primeiro asteróide (2010 AB78) […]

  9. […] joviano com 12,7 bilhões de anos de idade, mas este exoplaneta ancião pode até ser uma anã marrom que perdeu parte de sua […]

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  11. […] Anãs marrons gêmeas no sistema 2M 0939 são os objetos sub-estelares mais tênues já observados […]

  12. […] Uma visão minoritária (a qual, novamente, tem sido usada pelos profetas do apocalipse para vincular as inversões geomagnéticas com o Planeta X) é que pode haver algumas influências externas que causem as inversões. Você verá com freqüência associações destas afirmações com a suposta existência do Planeta X/Nibiru, de forma que quando este misterioso objeto se encontrar dentro o Sistema Solar interior durante sua órbita altamente elíptica, a perturbação do campo magnético poderia alterar a dinâmica interna da Terra (e do Sol, gerando possivelmente a tempestade solar “assassina”). Esta teoria é uma fraca vontade de vincular os cenários dos falsos profetas do apocalipse com um precursor comum do ‘fim do mundo‘ (quero dizer, o Planeta X). Não há razão para pensar que o potente campo magnético da Terra possa ser influenciado por qualquer força externa, muito menos por um planeta inexistente (mas não era uma anã marrom?). […]

  13. […] tem um companheiro com cerca de 6 vezes a massa de Júpiter, e que este companheiro poderia ser uma anã marrom ou um exoplaneta. Seja qual for a situação, isso é uma façanha notável, encontrar um objeto […]

  14. […] Está começando a parecer que os astrônomos estão se tornando cansados de observar diretamente os exoplanetas, já estivemos aqui, já fizemos isso… Assim eles estão agora se aprofundando mais visando uma nova grande descoberta: a detecção de exoluas (ou lua extrasolar) orbitando exoplanetas. Em novo estudo um astrônomo britânico quer usar a técnica mais comumente utilizada na observação indireta de exoplanetas. Essa tradicional e amplamente usada técnica verifica a estrela candidata para ver se ela tremula. A tremulação ou flutuação orbital estelar é usualmente causada pela presença de um objeto massivo orbitando a estrela, revelando indiretamente a presença de um exoplaneta (ou um objeto sub-estelar como uma anã-marrom). […]

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